EM SÃO PAULO
 
Após a intensa repercussão da operação da Polícia Federal ocorrida na semana passada, que teve Jair Bolsonaro (PL) como um dos alvos, o ex-presidente convocou seus apoiadores a participarem de uma manifestação marcada para o dia 25 de fevereiro, na Avenida Paulista, em São Paulo.

"Estarei realizando um ato pacífico em defesa do nosso Estado Democrático de Direito. Peço a todos vocês que compareçam trajando verde e amarelo. E mais do que isso, não compareçam com qualquer cartaz ou faixa contra quem quer que seja. Nesse evento, quero me defender de todas as acusações que tem sido imputadas a minha pessoa nos últimos meses. Mais do que discurso, uma fotografia", afirmou. 

A operação investiga uma organização criminosa envolvida em uma tentativa de golpe de Estado e na subversão do Estado Democrático de Direito. Bolsonaro sofreu uma medida cautelar e teve que entregar seu passaporte às autoridades, para que não possa sair do país.

Entenda a operação que investiga tentativa de golpe de Estado

A operação Tempus Veritatis (ou "hora da verdade", em latim), deflagrada na quinta-feira pela PF, investiga "a tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito, para obter vantagem de natureza política com a manutenção do então presidente da República no poder".

Citações apontam que Bolsonaro ordenou pessoalmente ajustes em uma minuta de golpe. O documento tinha, ao final, ordens de prisão para diversas autoridades, como Moraes, o também ministro do STF Gilmar Mendes e o presidente do Congresso Nacional e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Sobre Moraes, agentes da PF identificaram que o ministro tinha sua agenda, o deslocamento aéreo e a localização monitorados por um "núcleo de inteligência paralela" integrado pelo entorno de Bolsonaro.

A troca de conversas da reunião, divulgada na sexta-feira (9) após o vídeo encontrado no computador de Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro), "nitidamente revela o arranjo de dinâmica golpista" na "alta cúpula do governo" do ex-presidente, segundo a PF.

O material também mostra Bolsonaro dizendo a todos os seus ministros que era necessário agir antes das eleições para que o Brasil não virasse “uma grande guerrilha”. O então presidente também manifestou preocupação com a possibilidade de ser preso por "atos antidemocráticos" ao descer a rampa do Palácio do Planalto, a sede administrativa do governo federal em Brasília (DF), onde aconteceu a reunião.

Ainda na reunião, o então ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno afirmou: "tiver que virar a mesa é antes das eleições", acrescentando que não teria "VAR". Ele disse ter sua visão "clara" de que seria necessário "agir contra determinadas instituições e contra determinadas pessoas".

Heleno afirmou, inicialmente, que teria conversado com o então diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Vitor Carneiro para "infiltrar agentes nas campanhas eleitorais", alertando sobre o risco de descoberta. Bolsonaro o interrompeu e pediu que conversassem de forma reservada depois.

Foram cumpridos 33 mandados de busca e apreensão, quatro mandados de prisão preventiva e 48 medidas cautelares diversas da prisão nos Estados do Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Ceará, Espírito Santo, Paraná, Goiás e no Distrito Federal. Bolsonaro foi alvo de cautelar para entregar o passaporte em 24 horas. Há indícios dos crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado.

As apurações apontam que o grupo investigado se dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas eleições presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, para tentar viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital.

De acordo com a investigação, o primeiro eixo consistiu na construção e propagação da versão de fraude nas eleições de 2022. Isso ocorreu por meio da disseminação falsa de vulnerabilidades das urnas eletrônicas de votação, discurso reiterado pelos investigados desde 2019 e que persistiu mesmo após os resultados do segundo turno do pleito em 2022.

A PF apontou que o segundo eixo de atuação consistiu na prática de atos para "subsidiar a abolição do Estado Democrático de Direito, por meio de um golpe de Estado, com apoio de militares com conhecimentos e táticas de forças especiais no ambiente politicamente sensível". 

Quatro ex-assessores de Jair Bolsonaro foram alvos de mandados de prisão na operação desencadeada pela PF. Um deles foi Filipe Martins, ex-assessor para Assuntos Internacionais da Presidência, e o coronel Marcelo Câmara, que trabalhou no governo passado e foi ajudante de ordens de Bolsonaro, na cota prevista para ex-presidentes.


Veja abaixo a lista de alvos da PF:

Mandados de busca e apreensão

Ailton Gonçalves Moraes Barros, capitão da reserva e ex-candidato a deputado estadual (PL-RJ);
Almir Garnier Santos; ex-comandante-geral da Marinha;
Amauri Feres Saad, advogado apontado pela CPMI do 8 de janeiro como autor da minuta golpista;
Anderson Torres, ex-ministro da Justiça;
Angelo Martins Denicoli, militar da reserva e ex-diretor do Departamento de Monitoramento e Avaliação do SUS;
Augusto Heleno, ex-ministro-chefe do GSI;
Bernardo Romão, coronel do Exército;
Cleverson Ney Magalhães, coronel do Exército e ex-oficial do Comando de Operações Terrestre;
Eder Lindsay Magalhães Balbino, empresário que teria ajudado a montar estudo apontando fraude nas urnas eletrônicas; 
Estevam Theophilo Gaspar de Oliveira, general e ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército;
Filipe Martins, ex-assessor especial da Presidência da República;
Guilherme Marques Almeida, tenente-coronel e comandante do 1º Batalhão de Operações Psicológicas do Exército;
Hélio Ferreira Lima,  tenente-coronel do Exército;
José Eduardo de Oliveira e Silva, padre;
Laércio Virgílio, general de brigada reformado;
Marcelo Câmara, ex-ajudante de ordens;
Mario Fernandes, homem de confiança de Bolsonaro e comandante que ocupou cargos na Secretaria-Geral;
Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-comandante do Exército;
Rafael Martins, major das Forças Especiais do Exército;
Ronald Ferreira de Araújo Júnior, oficial do Exército;
Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros, major do Exército;
Tércio Arnaud Tomaz, ex-assessor da Presidência da República;
Walter Braga Netto, general e candidato a vice de Bolsonaro.

Mandados de prisão

Bernardo Romão Corrêa Netto, coronel do Exército;
Filipe Martins, ex-assessor especial da Presidência da República;
Marcelo Câmara, ex-ajudante de ordens;
Rafael Martins, major das Forças Especiais do Exército.

Medidas cautelares que podem incluir apreensão de passaporte e/ou proibição de manter contato com os demais investigados