O rosto de Romeu Zema (Novo) com um longo nariz em referência ao personagem Pinóquio estampou centenas de máscaras de manifestantes que fecharam a MG-10 em frente à Cidade Administrativa, em Belo Horizonte. A cena foi vista na última terça-feira, em novo protesto das forças de segurança do estado.

A categoria acumula atos por recomposição salarial e cobra do governador as promessas de reajustes. Mais do que mais uma ala do funcionalismo público em pé de guerra com o Executivo, o embate com policiais reflete em rusgas internas dentro da Assembleia Legislativa e impacta nas pretensões nacionais de Zema, que disputa o espólio eleitoral de Jair Bolsonaro (PL), inelegível em 2026.

O governador tem se esforçado para se colocar na posição de líder da direita nacional. O embate interno com as forças de segurança, no entanto, faz o mineiro perder espaço na briga com outros governadores em uma das pautas mais caras ao bolsonarismo: o discurso ‘linha-dura’ na segurança pública. No quintal de casa, Zema assiste a repetidos atos de policiais, enquanto Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Jorginho Mello (PL-SC) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) emplacam manchetes no noticiário nacional em defesa das corporações e ações voltadas para melhorar a situação financeira das polícias.

 

Em Minas, integrantes das polícias Penal, Civil e Militar reclamam 41% de reajuste salarial, conforme perdas inflacionárias não corrigidas desde 2015. Zema oferece 3,6%, abaixo da inflação acumulada em 2023, que foi de 4,62%. Ainda que remontem a um período anterior a Zema, as manifestações investem nas caracterizações do governador como “mentiroso” e “caloteiro” ao recordar as promessas feitas à categoria ainda em seu primeiro ano à frente do estado.

Em 2019, ficou acordado que os servidores da área receberiam recomposição salarial dividida em duas parcelas de 12% e uma de 13% nos anos subsequentes. Apenas a primeira foi paga. Em 2022, os agentes receberam 10% após sequência de protestos. O percentual, no entanto, serviu apenas para cobrir as perdas inflacionárias do ano anterior e as parcelas prometidas pelo governador não foram cumpridas.

Ministro de Infraestrutura no governo Bolsonaro, Tarcísio de Freitas encarna como poucos bolsonaristas o discurso do aliado quando o assunto é segurança pública. O governardor paulista não perde oportunidade de bancar publicamente as operações da polícia. Ele também concedeu reajuste médio de 20,2% em 2023 para forças de segurança, índice superior à inflação acumulada no ano passado, e elevou o piso das carreiras iniciais,

Já Ronaldo Caiado concedeu, em 2022, reajuste de 20% sobre a hora-extra para as forças de segurança de Goiás como medida compensatória para a falta de reajuste dos servidores da área, o que garantiu, em muitos casos, salário dobrado. Ele também reduziu de cinco para quatro anos o tempo para a promoção de soldado para cabo, beneficiando 1.704 militares. Medida similar, inclusive, foi cobrada de Zema pelo deputado estadual Caporezzo (PL), cabo da PM. O governador Jorginho Mello, por meio de decreto, concedeu, em fevereiro, auxílio-farda anual de R$ 1.700 para policiais e bombeiros militares.

Para o cientista político Adriano Cerqueira, professor da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), as dificuldades com a gestão do estado afetam a relação de Zema com os servidores, em especial os da segurança pública. Essa rusgas, segundo ele, pode ter impactos eleitorais. “Zema usou boa parte de seus recursos financeiros no primeiro mandato para tentar reequilibrar as dívidas de Minas. Isso foi tirando dele a capacidade de dar reajustes ao funcionalismo, e a segurança com certeza tem requerido mais atenção da parte do governo. Ele tem o apoio do eleitorado de direita conservador, além do liberal, só que uma mobilização das forças de segurança junto a esse eleitorado, também com apoio de deputados, tende a gerar desgaste”.

 

Na avaliação de Cerqueira, Zema sai em desvantagem com Tarcísio de Freitas, “que está fazendo boa relação nesta temática, com ações bastante fortes de apoio aos agentes da segurança”. “Pela força eleitoral de Minas, Zema tem mais capital que Caiado por exemplo, mas tem também melhor adesão em Goiás do que aparentemente Zema tem em Minas”, destaca Cerqueira. Citado pelo professor, Caiado teve 86% de aprovação na última pesquisa Genial/Quaest, em abril. O levantamento mostra que 69% dos eleitores goianos avaliam positivamente a segurança pública.

Eleito ininterruptamente deputado estadual desde 1998 como representante das forças de segurança, Sargento Rodrigues (PL), apesar de fazer, teoricamente parte da base de Zema, diz que ele esqueceu as promessas feitas às forças de segurança e deu “calote”na categoria. “Em plena campanha, Zema compareceu à Associação dos Oficiais e falou que não é possível que servidores da Assembleia e do Tribunal de Contas tenham reajustes anuais pela inflação e que isso não se estenda aos outros funcionários. Isso deu uma amenizada. Certamente alguns bobões acabaram votando nele de novo.

Ele foi reeleito e simplesmente esqueceu de tudo que falou. E o governo passou a falar que a Lei de Responsabilidade Fiscal impedia o reajuste, o que é uma mentira deslavada, porque ela não proíbe recomposição pela inflação”, afirmou o parlamentar. “Essa figura de bom moço do Zema é produto de marketing. A visão dele de ser de direita é só conversa fiada”. A reportagem solicitou posicionamento do governo sobre o tema, mas até o fechamento desta edição não houve resposta.