Com repertório recheado de sucessos e canções carnavalescas, o músico promete apresentação em alto astral nesta sexta
Reza a lenda que entre o primeiro e o último verso de “Maracangalha”, o compositor Dorival Caymmi espreguiçou-se na rede durante mais ou menos nove meses até que a inspiração viesse lhe visitar novamente. Conhecido pelo vagar e pela leveza de sambas que escreveu ou ajudou a consagrar, como “Mulheres” (Toninho Geraes), “Canta, Canta Minha Gente” e “Devagar, Devagarinho” (Eraldo Divagar), esse último uma espécie de emblema de sua personalidade, Martinho da Vila também demorou mais do que o esperado para colocar na praça o álbum “Alô Vila Isabeeeel!!!”, que ele apresenta nesta sexta-feira (9) em Belo Horizonte, no Km de Vantagens Hall, com um show permeado por vários sucessos.
“Eu planejei esse disco há uns dois anos, quando a (escola de samba) Vila (Isabel) fez 70 anos. Era para homenageá-la, mas não consegui terminá-lo. Parece que não, mas é um trabalho complicado. Enfim, passou a data, mas como já tinha meio caminho andado, resolvi que ia lançar depois. ‘Não precisa ser só no aniversário, pode ser em qualquer época’, pensei comigo. Sempre é hora de saudar nossa Vila Isabel”, assegura, às risadas, Martinho.
Pelo tempo único do destino, o disco ficou pronto justamente no aniversário do compositor, que comemorou oito décadas de vida em plena avenida, no último dia 12 de fevereiro. Antes, nos preparativos para o Carnaval, ainda foi homenageado pela histórica Banda de Ipanema. Como em sua casa todo mundo é bamba, motivo para festa é o que não faltou.
“O Carnaval, em geral, foi muito bom, com o aumento dos blocos de rua no Rio, que tinha caído há um tempo e voltou com força. E o desfile esse ano teve uma surpresa porque a primeira e a segunda colocada (Beija-Flor e Tuiuti, respectivamente) tiveram coragem de fazer protestos. No passado, os sambas-enredo só exaltavam o país. Depois passou a ter um momento mais crítico e agora esse espírito retornou”, declara. Apesar do discurso, o intérprete prefere não opinar sobre o momento do país. “Estou fugindo de conversas sobre o Brasil, ando escorregando. Está uma confusão tão grande, sem muita esperança. Sou do time dos desacreditados, e essa não é uma mensagem boa para se passar”, justifica.
Repertório. Foi no terreiro da escola de samba Aprendizes da Boca do Mato que Martinho viu seu primeiro samba ser cantado. Depois de “Piquenique”, feito aos 15 anos de idade, ele estrearia com um compacto que trazia “A Voz do Samba”. Nesse ínterim, destacou-se como compositor da agremiação do bairro onde nasceu Noel Rosa, e que renderia a ele o sobrenome artístico. Com letras concisas, uma melodia de compasso mais acelerado e a influência do partido-alto, Martinho reformatou o tradicionalíssimo samba-enredo. Contar um pouco dessa história foi seu farol na construção do mais recente álbum.
“Eu pensei nesse CD exatamente como ele está. Através dos sambas falo sobre a fundação da Vila, passo o sentimento dos componentes, faço um registro dos campeonatos que ganhamos e presto um tributo ao passado, aos compositores que já nos deixaram. Por isso pedi aos colegas que fizessem sambas para contar essa história, e depois tivemos um concurso para escolher os que entraram”, explica.
Com 13 faixas, o lançamento enfileira canções de Arlindo Cruz, Luiz Carlos da Vila, Ruy Quaresma, do próprio anfitrião e da filha Mart’nália, além de nomes menos conhecidos do grande público. Sem planos imediatos ligados à música, o entrevistado balanceia com ritmo a trajetória até aqui. “Não mudou muita coisa não, Martinho José Ferreira e da Vila são a mesma pessoa. Continuo ligado à minha escola, cantando meus sambas. A única diferença é que mudei de classe social, e isso no Brasil é raro quando se vem de baixo”, conclui.
Serviço. Martinho da Vila traz o show “Alô Vila Isabeeeel!!!” ao Km de Vantagens Hall (av. Nossa Senhora do Carmo, 230, São Pedro), nesta sexta-feira (9), às 22h. De R$ 40 (meia) a R$ 560 (mesa)