Levantamento cita acumulação de cargos, mas fontes no Executivo detectaram vários equívocos; maioria dos nomes é das áreas da educação e da saúde

Divulgada como uma ação de combate ao desperdício de recursos públicos, a lista formulada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), entidade responsável por fiscalizar com exatidão as contas públicas por Minas, tem “chocado” membros da administração estadual por conta dos “inúmeros equívocos” presentes no levantamento.

De acordo com fontes do governo de Minas ouvidas pela reportagem, é possível que, dos 96 mil nomes de servidores do governo apontados pelo TCE como casos de acumulação ilegal de cargos, apenas 1% esteja, de fato, irregular. “Foram apontados 80 mil servidores da educação e mais de 6.000 da saúde, setores em que a legislação permite certo nível de acúmulo de cargos”, comenta um membro do governo.

A lista, inclusive, teria sido divulgada pelo TCE sem a ciência de boa parte dos conselheiros que compõem a Corte. “O levantamento assustou o próprio (Cláudio Couto) Terrão (presidente do TCE mineiro)”, afirmou um interlocutor que conversou com os membros do tribunal.

Em conversa com deputados e secretários, componentes do TCE afirmaram, “de pés juntos”, que a lista está correta. Os presentes na conversa, no entanto, não confiam na versão. O corte dos supostos servidores em situação irregular geraria uma redução de quase 17% da folha de pessoal do Estado – algo impensável para técnicos do governo.

O levantamento faz parte de um estudo realizado pelo TCE que apontou, ao todo, o número de 102 mil servidores públicos – somando funcionários do Estado, prefeituras e outros órgãos públicos – com suspeita de irregularidade no acúmulo de funções.

Entre os erros mais grosseiros da lista está o de uma idosa de 90 anos, nascida em 1928 e ainda viva, que atuou como professora de uma escola estadual. Ela se aposentou pela primeira vez em 1981 e, depois, conseguiu uma nova aposentadoria em 1995 – fato permitido pela legislação. No entanto, o levantamento do TCE aponta que a servidora estaria irregular, tendo, assim, o risco de um corte nos benefícios da Previdência.

Outro personagem que chamou a atenção dos técnicos do Estado foi um médico que atua no hospital Galba Velloso e também na área médica de uma penitenciária estadual. O caso, assim como o da idosa, é permitido pela lei.

No sábado (12), o governo de Minas anunciou a criação de uma comissão especial formada por representantes da Secretaria de Estado de Fazenda (SEF), da Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag), da Advocacia-Geral do Estado (AGE) e da Controladoria Geral do Estado (CGE) com o objetivo de analisar a lista do TCE.

Em um trecho, a administração afirma que a “força-tarefa” atuará justamente para “que não sejam cometidas injustiças com os servidores que, amparados pela lei, têm autorização para acumular até dois cargos – caso dos profissionais da Saúde e da Educação”.

Não bastasse o excesso de possíveis equívocos na lista do TCE, os dados utilizados como base para o levantamento foram feitos a partir de documentos do governo de Minas datados de 2015. Há, segundo o Executivo, 13.656 nomes listados no levantamento da Corte que nem sequer fazem mais parte do corpo de funcionários da administração estadual.

Os dados que teriam sido utilizados para a realização do levantamento, segundo membros do governo, teriam, em sua maioria, funcionários que atuaram no Estado na última gestão, findada em dezembro de 2014.

Calma lá. Em nota divulgada na sexta-feira, o TCE deu indícios de que a presença na lista, chamada de Cadastro de Agentes Públicos do Estado e dos Municípios de Minas Gerais (CAPMG), de fato não significa que o servidor está irregular, ao afirmar que o estudo apenas apontou indícios de ilicitudes, que deveriam ser avaliados “caso a caso”. “A listagem identificou indícios de milhares de irregularidades, mas sua divulgação não representa determinação automática do Tribunal de Contas de dispensa de servidores, servindo, contudo, de indicativo para que os Entes fiscalizados confirmem, caso a caso, a real presença da irregularidade apontada e adotem as providências necessárias para cessá-la, observada as garantias individuais de cada servidor”, diz a nota do TCE-MG.

Quarenta servidores tinham 188 cargos

O Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) também separou os indícios mais graves de acumulação ilícita de cargos, empregos e funções públicas nos municípios mineiros, que são aqueles em que havia a acumulação de quatro cargos ou mais por um único servidor.

Foram avaliados os casos de 40 servidores que, somados, possuíam vínculo com 87 municípios. Eles eram detentores de 188 cargos, empregos e funções públicas, constituindo uma média de 4,7 vínculos por pessoa.

Questionados pelo TCE, 63 dos 87 municípios apontados com irregularidades responderam à Corte. Em dois casos foi negado que houvesse a ocorrência de acumulação de cargos.

Outros 58 municípios confirmaram a situação e consideraram procedentes os apontamentos do tribunal. Estas prefeituras, segundo o TCE-MG, “já estão adotando medidas para apuração dos fatos”, como a exoneração de servidores e rescisão de contratos temporários, instauração de sindicância ou processo administrativo disciplinar.

Do montante total, 26 servidores que estavam com a situação irregular já foram exonerados.

O Tribunal ainda está aguardando a resposta de 24 municípios.