Há um edifício esquisito em meio aos museus e palacetes do Circuito Liberdade, na região Centro-Sul de Belo Horizonte. Não é só o visual que causa estranheza – pela arquitetura colorida e um mix de materiais de 'sucata' –. Ele é o único prédio da praça que está abandonado. No meio de um dos maiores centros turísticos da capital, o Edifício Tancredo Neves padece sem visitantes. Ao redor do prédio, acúmulo de lixo. No teatro de arena, toca-se a vida real, protagonizada por pessoas em situação de rua. O edifício parece ter se concretizado no apelido que recebeu nos anos 1990: ‘Rainha da Sucata’. É, para quem passa, o “patinho feio” da Liberdade. 

O Rainha da Sucata está vazio há quatro meses, desde a rescisão do contrato com a Fundação Nacional de Artes (Funarte-MG) – que ficou responsável pelo prédio por cerca de três anos. Antes disso, já foi Centro de Informação ao Visitante do Circuito Liberdade, Hub Minas Digital, Museu de Mineralogia Professor Djalma Andrade e até a sede do Circuito Liberdade. Hoje, mais parece um fantasma do complexo turístico. Sua descrição no portal do Circuito envelheceu mal: “a proposta é que o prédio se torne um polo artístico”, continua publicado. 

De acordo com a Secretaria de Estado de Cultura e Turismo (Secult), o Governo adotou medidas para garantir a “ordem e segurança do local”. Mesmo sem programação, o edifício gera um custo mensal de R$ 26 mil para o Estado. “As ações incluem contratação de portaria 24hrs, instalação de sistema de alarme e serviço de limpeza e manutenção”, descreve a Secult. Iniciativas mínimas para o interior do Rainha da Sucata. Do lado de fora, um grupo de pessoas em situação de rua fez o anfiteatro de moradia. O entorno de lixo e fezes afasta quem passa próximo.

“É lastimável termos um edifício tão emblemático, de tamanho valor histórico para Belo Horizonte, abandonado”, avalia a arquiteta e urbanista Celina Borges. “É uma contradição de berço. O Rainha da Sucata foi pensado para atender ao turismo. Foi um dos primeiros prédios da Liberdade e provocou que a praça se tornasse um centro cultural. Ele nasce com a ideia, e é sua primeira vítima. É um sintoma grave: o que seria, então, a valorização do turismo no Estado?”, questiona ela, que também é professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Borges reforça que o prédio foi um dos primeiros a serem construídos na praça e já chegou inovador, com um anfiteatro aberto à rua. “Indiretamente, ele serviu de inspiração para que a praça se tornasse mais aberta para o público. Surgiu ali a ideia: por que não abrir esses palacetes para o mundo?”, acrescenta.