Desistência é condição para que municípios sejam ressarcidos por danos

Por Léo Rodrigues

Agência Brasil

Rio de Janeiro

A prefeitura de Mariana (MG) não vai desistir da ação que move na Justiça do Reino Unido em busca de uma indenização integral pelos danos sofridos em decorrência do rompimento da barragem da mineradora Samarco. A desistência do processo é uma exigência da Fundação Renova para que os municípios atingidos recebam R$ 53 milhões em ressarcimento aos gastos extraordinários efetuados após tragédia na Bacia do Rio Doce, que completou três anos na semana passada.

Mariana (MG) - O prefeito de Mariana, Duarte Júnior, durante coletiva sobre o rompimento de barragens da mineradora Samarco no distrito de Bento Rodrigues, zona rural de Mariana, em Minas (Antonio Cruz/Agência Brasil)
"Dinheiro que mineradoras devem ao município não é meu, é da população", diz Duarte Júnior – Arquivo/Agência Brasil

O prefeito Duarte Júnior disse à Agência Brasil que tentará dialogar com a Fundação Renova para resolver o impasse. Se não houver solução, o município irá à Justiça para buscar a liberação dos recursos. "Estão querendo que desistamos dos nossos direitos para receber algo que já está acordado. As mineradoras estão achando que vão colocar cabresto nos prefeitos", afirmou Duarte Júnior.

A Fundação Renova é responsável pela gestão de todos os esforços para reparação dos danos e foi criada conforme Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) assinado em março de 2016 entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, a União e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. Esse acordo também definiu as ações a serem implementadas com recursos das mineradoras.

Uma delas diz repeito ao ressarcimento dos gastos extraordinários de 39 municípios dos dois estados com a mobilização de funcionários da prefeitura e da Defesa Civil além da jornada regular de trabalho, com aluguel de tratores para reabrir estradas, com alojamentos improvisados para os desalojados, com o abastecimento alternativo de água e com serviços emergenciais, entre outos serviços.

De acordo com Duarte Júnior, no cálculo dos municípios, o montante era de R$ 83 milhões. Para agilizar a liberação dos recursos, os prefeitos concordaram com a estimativa de R$ 53 milhões apresentada pela Fundação Renova. Cerca de R$ 41 milhões são apenas para cidades mineiras e R$ 12 milhões para cidades mineiras e capixabas. "Abrimos mão do valor que calculamos porque não queremos que se torne uma grande batalha judicial, o que só prejudicaria a população", disse o prefeito.

As exigências da Fundação Renova para o pagamento dos recursos constam de termo de quitação enviado aos municípios, que foram pegos de surpresa. O assunto entrará na pauta do Fórum Permanente dos Prefeitos do Rio Doce, que se reúne na próxima semana. "Algumas prefeituras até pensam em assinar porque a cobrança da população é grande, e elas precisam de recursos para pagar dívidas, 13º salário e honrar outros compromissos. No meu caso, não vou abrir mão dos direitos que a cidade tem. O dinheiro que as mineradoras devem ao município não é meu, é da população", afirmou Duarte Júnior.

A Fundação Renova informou que aguarda a entrega dos documentos e que, uma vez recebidos, o prazo para transferência dos recursos será de 30 dias. "Os pagamentos às prefeituras serão feitos mediante o envio do termo de quitação assinado e a emissão do Documento de Arrecadação Municipal (DAM)", diz o texto.

Pela Cláusula 6 do termo de quitação, o município deverá conceder à Fundação Renova e às três mineradoras irrestrita e irrevogável quitação de valores relativos ao ressarcimento dos gastos públicos extraordinários. Ações que já estejam em curso precisariam ser encerradas. Além disso, conforme a Cláusula 8, o pagamento a cada prefeitura ficaria condicionado à comprovação de que ela desistiu do processo no Reino Unido e ao compromisso de que novos procedimentos relacionados à tragédia de Mariana não seriam abertos em jurisdições estrangeiras.

Interferência

Para Duarte Júnior, as exigências apresentadas revelam interferência da mineradora inglesa BHP Billiton na gestão da Fundação Renova, o que seria vedado pelo TTAC. A empresa estrangeira é o alvo do processo movido no Reino Unido.

A ação foi proposta pelo escritório anglo-americano SPG Law. No início do mês, os advogados anunciaram que houve mais de 250 mil adesões, entre as quais as de empresas e prefeituras, além da Igreja Católica. A Agência Brasil entrou em contato com a BHP Billiton, que informou que "não irá se manifestar sobre os comentários do prefeito Duarte Júnior".

Ao tomar conhecimento da proposta da Fundação Renova, a SPG Law enviou mensagem às prefeituras alegando que o valor oferecido pela Fundação Renova, de R$ 53,3 milhões é inferior a 0,5% da previsão inicial de indenização que poderia ser obtida no âmbito da ação movida no Reino Unido. "A proposta de acordo encaminhada trata tão somente de indenização dos gastos extraordinários, não da indenização integral dos danos, como pleiteado perante o tribunal inglês", destaca o texto.