Neste 2020 atípico, a cada 24 horas uma média de nove indenizações por mortes em acidentes de trânsito foram pagas pelo Seguro Dpvat em Minas. No total, foram 2.767 de janeiro a outubro de 2020 – ou 276 a cada mês. A queda de 20% em relação aos ressarcimentos no mesmo período de 2019 é atribuída à quarentena por conta da pandemia de Covid-19, que tirou veículos e pedestres das ruas. Mas, apesar de considerada positiva, especialistas alertam que os desafios na área ainda não foram vencidos, e o maior deles é conscientizar, especialmente, condutores a mudarem o comportamento ao dirigir.

Educação desde a infância, formação adequada do motorista e mais rigor na fiscalização e punição aos infratores. Atuando na medicina de tráfego, o pediatra Milton Teixeira Filho aposta nesses pilares para amenizar o cenário e trazer mais segurança para o trânsito. 

Por outro lado, o especialista teme que a flexibilização das regras de trânsito, que entram em vigor em 2021, piore a situação e leve ao aumento de acidentes e mortes nas vias dos centros urbanos e nas rodovias. Dentre as mudanças polêmicas, segundo ele, estão a ampliação da validade da carteira de habilitação para uma década e a dispensa da avaliação do condutor por um médico de tráfego.

“Imagine um motorista passando dez anos sem ser reavaliado ou um candidato à CNH sendo examinado por profissional de qualquer especialidade. Não é apenas, por exemplo, ver se ele está enxergando bem para dirigir. A análise é mais profunda. Afinal, estamos considerando se determinada pessoa é ou não apta a conduzir o veículo”, diz.

Conscientização

Para a médica de tráfego Raquel Muniz, a conscientização do condutor é essencial. “Se a educação para o trânsito for de excelência, é, sim, possível aumentar o tempo de validade da carteira. Mas como se tem um trânsito violento, fica difícil de se ter controle sobre o motorista”.

Com a redução do isolamento social nas cidades, elevando a circulação de veículos e pedestres, ela se diz preocupada com o crescimento dos acidentes em meio ao aumento de casos de Covid-19. Para Raquel, os condutores precisam ter ainda mais cautela para evitar tragédias. “O paciente acidentado é atendido no mesmo pronto-socorro onde estão pessoas infectadas pelo novo coronavírus, correndo o risco de também ser contaminado”, frisou. 

Gargalo na saúde

Diretor de Comunicação da Associação Mineira de Medicina de Tráfego (Ammetra), Allyson Coimbra se diz preocupado com um possível colapso na saúde provocado pelo aumento dos casos de Covid-19 e, paralelamente, o atendimento a vítimas de trânsito. Segundo ele, historicamente, 60% dos leitos hospitalares são ocupados por pessoas acidentadas.

O médico diz que a previsão é de que o número de hospitalizações atuais em decorrência do novo coronavírus seja maior que no início da pandemia. “E, nesse tempo, o trânsito nunca parou de matar, pois se trata de uma epidemia crônica e negligenciada pelos governos. É preciso a adesão e a colaboração das pessoas para que entendam que essas novas restrições (quarentena) não são, por exemplo, para viajar. Nesse momento, o veículo deve ser usado em situações de extrema necessidade”.

Allyson Coimbra diz que essas ações visam a evitar acidentes para dar um alívio na disponibilidade de leitos para atendimento aos pacientes com Covid-19. Vale lembrar que cidades com Rio de Janeiro e São Paulo estão com o sistema de saúde estrangulado por conta da alta demanda.