CABO DE GUERRA

Famílias que têm alto consumo de leite em casa vêm passando por muito sufoco nos últimos meses. O preço do produto disparou no campo e nas prateleiras dos supermercados, batendo a média histórica dos últimos 18 anos. A saída para muitos consumidores foi deixar de comprar o alimento – quando possível –, o que está forçando a indústria a reduzir os preços.


Nas duas últimas semanas, a queda no valor do litro do leite UHT (de caixinha) foi considerável. Mas ainda não chegou a patamares do início do ano. Movimento foi feito pela indústria para “desovar” o estoque, que estava só aumentando e corria risco de se perder, já que se trata de um produto altamente perecível.

Dono de um supermercado em Santa Luzia, na Grande BH, Igor Silva diz que a queda no preço foi brusca nas duas últimas semanas. Ele conta que chegou a vender a caixinha por até R$ 10. Agora, está por cerca de R$ 5 – ou seja, quase a metade.
Segundo o comerciante, com o produto muito caro, o consumo foi claramente afetado. “Quem, por exemplo, levava uma caixa com 12 unidades, passou a levar três unidades, quatro”, conta. “Dificilmente os clientes levavam muita coisa, fora a reclamação generalizada na hora da compra. O caixa virava o muro das lamentações”, comenta.

Altas consecutivas


Segundo pesquisa realizada pelo Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da USP, em julho deste ano o preço pago ao produtor foi 20% maior do que o praticado no mês anterior, chegando ao valor médio de R$ 3,19 por litro – recorde da série histórica iniciada em 2004. Foi o sexto mês consecutivo de avanço.


Em todo o ano, o produto teve uma valorização real no campo de 43,7%. E a expectativa é a de que esse movimento continue, mas de forma menos intensa. A pesquisa do Cepea indica que a média do litro em agosto deve ter uma alta de 10%, passando de R$ 3,50 – valor pago ao produtor. Até chegar às prateleiras do supermercado, os números mudam bastante. 


E Minas Gerais está em terceiro no ranking dos estados com valor mais alto ao produtor. Em julho, o preço médio ficou em R$ 3,22, valor 19% superior a junho e que fica atrás de Goiás – líder da variação –, com 22,94%, e São Paulo, 21,18%.

Peso no bolso


Se a valorização é positiva para o produtor, que enfrenta agora o momento da entressafra, com menos volume a ser ofertado à indústria, para o consumidor tem sido um verdadeiro pesadelo. 


O empresário Edmar Martins viu o gasto com leite em casa e na cafeteria da qual é dono explodir nos últimos meses. A saída, ele conta, foi reduzir o consumo em casa e comprar a marca mais barata para fazer as receitas dos produtos da lanchonete.


Além disso, o estoque que estava sempre abastecido no empreendimento deixou de existir. “Comprava só aquilo que era necessário para a semana”, conta Edmar. Em casa, o leite deu uma sumidinha da geladeira. “Se tem a caixinha na geladeira, é mais usado pelas crianças. Sem ele lá, elas achavam que não tinha e escolhiam outra bebida”.


A queda nos preços percebida nas duas últimas semanas, diz Edmar, deu um fôlego para o negócio. Ele cita que chegou a comprar o litro por R$ 7,55, agora está R$ 4,98. 

Além disso:


Com um custo tão alto nos últimos meses, as vendas caíram, o que deve ajudar a puxar o preço para baixo em setembro, avalia a pesquisa do Cepea. “A indústria está com dificuldade em sustentar os preços”, diz análise dos pesquisadores. Em julho, o litro do leite longa vida em Minas estava custando, em média, R$ 5,40, alta de 20,49% em relação a junho. Para comprar o leite pasteurizado, o consumidor tinha que desembolsar, em média, R$ 4,65 – alta de 18,5% na comparação com o mês anterior. Mas, lá no supermercado, os números são bem piores: já teve caixinha do UHT sendo vendido a quase R$ 8. 


O aumento do preço do leite, segundo o Cepea, é uma consequência da menor disponibilidade do produto, por causa da entressafra, seca mais intensa e mudanças estruturais no campo (menores níveis de investimento e aumento nos custos de produção). A pesquisa junto ao produtor mostra que o volume de leite produzido em junho e julho ficou abaixo da expectativa do setor, gerando importante redução no estoque de lácteos até a metade de julho.