Mineradora reduziu os investimentos na área de saúde e segurança em 44% entre 2015 e 2016, enquanto quebrava recordes de receita

A Vale, como muitas outras grandes companhias, é um exemplo de competência seletiva. Em algumas áreas, brilha; noutras fracassa completamente. Nos últimos três anos, ela mostrou muita competência para atender ao mercado financeiro mas, nas tragédias de Mariana e Brumadinho, falhou de maneira trágica com seus funcionários e a sociedade.

Em Brumadinho, que chora neste domingo (03) a morte de mais de 120 pessoas, além de procurar mais de 200 desaparecidos, a Vale falhou completamente. Nada funcionou naquele fatídico 25 de janeiro: o alarme, o treinamento dos funcionários e dos moradores (que não existiu, segundo os próprios), as análises de riscos feitas inclusive por empresas estrangeiras, a fiscalização, enfim, todo o planejamento ligado a segurança do trabalho na mina do Córrego do Feijão mostrou-se um engodo.

O alheamento é tanto que o presidente da Vale, Fabio Schvartsman, se disse surpreso com a rapidez do rompimento, o que fez com a sirene de alerta, que deveria soar em caso de algum incidente, fosse “engolfada” pela lama. Assim como o refeitório e várias estruturas da empresa, que estavam debaixo da barragem que explodiu, espalhando 13 milhões de toneladas de rejeitos em seu caminho de destruição.

E se não teve competência para garantir a segurança da barragem para suas instalações e para uma área de quilômetros ao redor, a Vale, ao contrário, foi muito boa para ganhar dinheiro nos últimos anos. Neste período, suas receitas aumentaram substancialmente, enquanto a empresa cortou despesas em ações de segurança e saúde. Segundo matéria no portal UOL, a Vale reduziu os investimentos nessa área em 44%, entre 2015 e 2016,

O levantamento feito pelo UOL tomou como base os relatórios de desempenho disponibilizados pela companhia aos seus investidores. Eles mostram que, em 2015, a Vale investiu US$ 353 milhões nesse tipo de ação. Em novembro daquele ano, a barragem da Samarco em Mariana se rompeu matando 19 pessoas e causando um dos maiores desastres ambientais da história do país. Apesar da comoção causada pela tragédia, no ano seguinte, a Vale reduziu os seus investimentos em segurança e saúde para US$ 198 milhões, em suas várias unidades.

Os cortes aconteceram em um momento positivo para a empresa. A mineradora fechara o ano anterior, 2015, com um prejuízo líquido de R$ 44,213 bilhões (US$ 12,129 bilhões), considerado o maior já registrado por uma empresa brasileira com ações na Bolsa desde a década de 80. Foi a primeira perda anual da Vale depois da privatização, causada principalmente pela queda do preço do minério de ferro e de outras commodities e a depreciação do real – a maior parte da dívida da empresa é em dólar.

Mas daí para a frente, foi só alegria: já em 2016, a Vale conseguiu reverter o prejuízo do ano anterior e obteve um lucro de US$ 13,3 bilhões. Em 2017, novo resultado positivo: lucro líquido de R$ 17,6 bilhões, uma alta de 32,4% em relação ao ano anterior. Não se sabe ainda como a tragédia de Brumadinho irá impactar os resultados da Vale, mesmo que a empresa tenha reagido rapidamente às perdas iniciais (veja matéria neste site). Os resultados de 2018 só virão a público fevereiro ou março, mas a mineradora encerrou o terceiro trimestre de 2018 com lucro líquido atribuído aos acionistas de R$ 5,753 bilhões. O valor representa uma alta de 1.780% em relação ao resultado dos três meses anteriores.