O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) negou o pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos, réu confesso pelo assassinato do gari Laudemir de Souza Fernandes, de 44 anos, crime que causou comoção pública em agosto deste ano. A decisão é do relator Maurício Pinto Ferreira, da última semana, que analisou o argumento da defesa de que a Polícia Militar (PM) teria agido de forma contrária à Constituição.

Renê está preso desde o dia do crime e deverá ser interrogado pelo Tribunal do Júri de Belo Horizonte nesta quarta-feira (26/11), por videoconferência, durante audiência de instrução. De acordo com a decisão, os advogados do réu questionaram a validade de documentos produzidos pela PM no dia do assassinato, como o boletim de ocorrência.

A defesa alegou que a corporação teria ultrapassado suas funções constitucionais ao colher depoimentos no local do crime, realizar reconhecimentos fotográficos e elaborar um "relatório minucioso" sobre a ocorrência, atribuições que, segundo os advogados, caberiam à Polícia Civil. O habeas corpus buscava, assim, que esses documentos não tivessem validade como prova no processo penal.

O relator, porém, negou o pedido por não identificar ilegalidade evidente na atuação da Polícia Militar, destacando que o registro de ocorrências e a coleta de informações iniciais são imprescindíveis para o atendimento emergencial. “A atividade investigativa realizada pela Polícia Militar, no caso, não configura usurpação de função ou abuso, uma vez que o procedimento inicial de apuração é atribuição legal da corporação”, reforçou.

O desembargador Maurício Pinto Ferreira acrescentou que não havia urgência que justificasse uma decisão imediata. O habeas corpus ainda será analisado no mérito, quando o tribunal examinará de forma mais aprofundada todos os argumentos da defesa e da acusação antes de decidir de forma definitiva.

Procurada, a defesa de Renê da Silva Nogueira Júnior afirmou que o habeas corpus não tem ligação com a liberdade do réu. A reportagem demandou a Polícia Militar sobre as acusações e aguarda retorno. 

Expectativa para o interrogatório do réu
O Tribunal do Júri de Belo Horizonte deve interrogar, nesta quarta-feira (19/11), Renê da Silva Nogueira Júnior, de 47 anos, réu confesso pelo assassinato do gari Laudemir de Souza Fernandes, de 44. A Justiça realiza o segundo dia de audiências de instrução do caso, e o réu deve participar online.

Renê Júnior responde por homicídio triplamente qualificado — por motivo torpe, recurso que dificultou a defesa da vítima e perigo comum —, além de porte ilegal de arma de fogo, ameaça e fraude processual.

As oitivas do caso ocorrem no 1º Tribunal do Júri Sumariante do Fórum Lafayette, no bairro Barro Preto, região Centro-Sul da capital, etapa em que são apresentados depoimentos, provas e argumentos ao juiz. Além do interrogatório do réu, o processo segue nesta quarta (26) com a previsão de depoimento de outras seis testemunhas, todas de defesa.

A esposa de Renê, a delegada Ana Paula Lamego Balbino, acusada de ter emprestado a arma usada no crime, também será julgada, mas em um processo separado. O caso dela foi desmembrado e encaminhado para uma vara criminal da capital responsável por crimes comuns, e as audiências dela ainda não têm data marcada.

Confira a nota da defesa de Renê
"A defesa técnica de Renê da Silva Nogueira Júnior informa que após 2 dias de audiência as todas testemunhas presenciais foram ouvidas na qualidade de informante por terem interesse no resultado do processo, vez que ajuizaram ação indenizatória, restou comprovado que não houve reconhecimento do réu na forma da lei processual, que os projéteis foram recolhidos por transeunte não identificado, em clara quebra da cadeia de custódia da prova, e que a obtenção de acesso ao celular do acusado se deu sem a prévia comunicação dos seus advogados em notória violação ao princípio da não autoincriminação. No mais, confiamos que o trabalho seja reconhecido e alcance resultados pretendidos." Bruno Rodrigues e Thiago Minagé.

O crime
Na manhã da segunda-feira  de 11 de agosto, por volta das 9h, houve uma confusão no trânsito no bairro Vista Alegre, região Oeste de Belo Horizonte. Um caminhão de coleta de lixo estava parado quando um carro BYD cinza, vindo na direção contrária, se aproximou. O motorista do carro, Renê da Silva Nogueira Júnior, teria sacado uma arma e ameaçado a condutora do caminhão, dizendo que “iria atirar na cara” dela. Logo depois, ele teria atirado contra o gari Laudemir de Souza Fernandes, que estava trabalhando na coleta.

O gari foi atingido na região torácica, próximo às costelas, e socorrido ao Hospital Santa Rita, em Contagem, mas não resistiu aos ferimentos. Após o disparo, o suspeito fugiu no carro BYD cinza e foi localizado pela polícia na tarde do mesmo dia, enquanto malhava em uma academia de alto padrão no bairro Estoril. Ele foi preso sem oferecer resistência. Conforme relatos das testemunhas, pouco antes de ser atingido, Laudemir teria dito: “Acertou em mim”. Testemunhas que estavam no local do crime afirmaram que o suspeito “saiu tranquilo e com semblante de bravo” após atirar na vítima.

Vídeos mostram passos do empresário após o homicídio
Imagens de câmeras de segurança registraram os passos do empresário momentos após a morte do gari Laudemir. Segundo o delegado Evandro Radaelli, responsável pela investigação do caso, Renê manteve uma rotina "normal" mesmo após o crime. 

As imagens mostram o suspeito na sede da empresa em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Ele chegou ao local por volta das 10h30 e cumprimentou colegas de trabalho. Cerca de duas horas depois, Renê dirigiu-se à sua residência e, logo após estacionar o carro na garagem do prédio, guardou a arma usada no crime na mochila.

Pouco tempo depois, vestido com camisa branca e shorts azuis — a mesma roupa que usava quando foi preso na academia —, passeou com seus cachorros. O vídeo mostra o empresário conversando ao celular enquanto estava com os pets.

A vítima
A vítima foi identificada como Laudemir de Souza Fernandes, 44 anos, gari da Localix Serviços Ambientais. Colegas e parentes o descrevem como trabalhador, pacífico e dedicado à família. Laudemir deixou esposa, uma filha de 15 anos e enteadas; segundo testemunhas e familiares, era muito querido no trabalho e em casa.

Segundo Ivanildo Gualberto Lopes, sócio-proprietário da Localix, Laudemir tentou apaziguar a situação durante a confusão no trânsito e acabou sendo atingido enquanto trabalhava. “Agora vai estar nas mãos da Justiça e nós iremos acompanhar”, afirmou Ivanildo.

Renê confessa ter matado gari
Renê da Silva Nogueira Júnior, 47 anos, confessou ter matado o gari Laudemir durante interrogatório no Departamento Estadual de Investigação de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), uma semana após o crime, na segunda-feira de 18/8. Segundo a Polícia Civil, o empresário alegou que efetuou o disparo durante uma discussão de trânsito. 

Esposa de empresário: investigação da Corregedoria, arma e ação do MP
Uma pistola calibre .380, pertencente à delegada Ana Paula Lamego Balbino — apontada como esposa do suspeito —, foi entregue à Corregedoria para perícia e apuração sobre cautela e guarda do armamento. Na sexta-feira (15/8), a polícia confirmou que a arma utilizada na morte do gari Laudemir está, de fato, registrada no nome da delegada Ana Paula e é de uso particular, sem vínculo com o armamento fornecido pela corporação. 

Ana Paula é alvo de investigação da Corregedoria-Geral da PCMG, que apura “elementos relacionados à eventual conduta da delegada que possui vínculo pessoal com o suspeito detido”.

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) solicitou a “responsabilização solidária” da delegada Ana Paula Lamego Balbino no caso que apura a morte do gari Laudemir de Souza Fagundes, de 44 anos. Na visão do MPMG, a medida deve atingir também a esposa do suspeito, por entender que, como dona da arma de fogo usada no crime, ela responde solidariamente pelo caso. 

Em depoimento, a delegada Ana Paula Balbino afirmou não ter conhecimento sobre qualquer participação do marido em infração penal. A reportagem de O TEMPO tentou contato com a delegada, tanto por telefone como pessoalmente na delegacia onde ela atua, mas até o momento ela não se posicionou.