Entre Itabira e Tiradentes há cerca de 300 km de estrada. Mas a distância torna-se menor nesta semana em que as duas cidades se voltam para a literatura mineira, celebrando, respectivamente, a trajetória de Carlos Drummond de Andrade, que completaria 120 anos nesta segunda-feira, e de Ziraldo, cartunista de Caratinga que chegou aos 90 anos dia 24.

Drummond é o maior poeta brasileiro do século 20 e Ziraldo um dos mais importantes desenhistas do país, com destaque para os livros infantis. Curiosamente, tanto o poeta de “No Meio do Caminho” quanto o criador de Menino Maluquinho escolheram o Rio de Janeiro como moradia, mas sem nunca perderem de vista os laços afetivos e artísticos com a terra mineira. 

Festivais serão ótima oportunidade para mergulhar na vida e obra desses autores, a partir de seminários, leituras, exposições e lançamentos de livros. Confira programação.
Ziraldo tem seus 90 anos comemorados em Tiradentes

Vítima de um Acidente Vascular Cerebral em 2018 que o deixou mais recluso, Ziraldo chegou aos 90 anos, na última segunda-feira (24), de forma surpreendente, acordado por horas, para receber netos, sobrinhos, filhos e alguns pouquíssimos amigos. “Foram 36 horas contínuas de festança e celebração. Foi lindo!”, registra Adriana Lins, sobrinha do cartunista.

Ela também é diretora do Istituto Ziraldo, que ajudou na construção da programação comemorativa que norteia a 3ª edição da Feira Literária de Tiradentes (FLITI), que terá início nesta quinta-feira, na cidade histórica mineira. Ziraldo será o centro de debates, exposições, filmes e lançamentos de livros sobre o trabalho do artista caratinguense.

Adriana conta que a programação foi costurada a muitas mãos, “com muito carinho, profissionalismo e vontade de levar ao público todas as nuances do Ziraldo e todas as interpretações sobre o pensamento dele”. A ideia é fazer uma grande festa em homenagem ao desenhista. “Essa alegria para celebrar torna a feira mais pulsante”.
Um dos destaques é a exposição “Era uma Vez um Menino de 90 Anos”, que ficará em cartaz no Centro Cultural Yves Alves, baseada num pequeno poético que Adriana fez para o tio, quando ele completou 89 anos.

“Fui trazendo a literatura infantil e os personagens de cartuns dele e logo me dei conta que aquilo era para todos nós, ao conceber um resumo leve e poético da trajetória desse cara presente na nossa cultura de uma forma tão divertida e pulsante”, afirma Adriana, que lamenta não poder contar com a presença do tio na FLITI.

“Após o AVC, o Ziraldo parou de desenhar. Infelizmente, a mão não consegue segurar a caneta da mesma forma. Logo no começo ele ainda conseguia fazer algumas dedicatórias, mas hoje não mais, apesar de fazer fisioterapia constantemente. Ele não consegue fazer todas as ações sozinho, mas está sempre prestando atenção em tudo”, relata. 

A diretora conta que, durante as conversas corriqueiras, “quando a gente imagina que está distraído, ele vem com uma pergunta ou faz uma observação engraçada”. E quando ouve alguma música por perto, o cartunista se lembra de quem costumava cantá-la em casa. “Ele está velhinho, mais cansado, mas está super presente”, avisa a sobrinha.

Itabira recebe celebração dos 120 anos de Drummond
Criador e um dos curadores do Festival Literário Internacional de Itabira, Afonso Borges quer marcar a homenagem aos 120 anos de Carlos Drummond de Andrade com uma comemoração inédita e de repercussão internacional. A programação, com início nesta segunda, data de nascimento do poeta nascido na cidade mineira, pretende “mundializar” o 31 de outubro.

Ele observa que esse momento coincide com um desejo “muito forte de Itabira se reaproximar de Drummond”, após alguns anos em que a cidade não o valorizou como deveria. “Estão aprendendo a amar Drummond de novo”, assinala o curador, que destaca, entre os pontos altos da edição, uma maratona online de 24 horas dedicada à leitura das obras do mestre.

“Perguntaram-me se ele tinha obra suficiente para falarmos por tanto tempo. Não sabem que ele foi cronista durante 30 anos, entre 1954 e 1984, escrevendo três vezes por semana. Só o Instituto Moreira Salles detém 2.400 crônicas que Drummond produziu durante o período de um ano. Imagine o que é esse material todo?”, constata Borges.

A maratona representa um desafio tecnológico, com início à meia-noite de segunda, tendo como base de transmissão o teatro da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade, em Itabira. Depois ela será dividida com o palco do CPF Sesc, em São Paulo – o Sesc da capital paulistana é um dos parceiros institucionais do Flitabira.

Borges usa o neologismo “fidigital” para comentar uma das características dessa edição, que mescla presença de público e transmissão online, simultânea, das duas cidades. A abertura oficial, na quinta-feira, a partir das 19 horas, terá um palco montado na Praça do Centenário, na frente da Casa de Drummond, com interações de São Paulo.

Um dos pontos altos do festival é o Ciclo de Debates “12 x 120”, que irá promover três lives por dia, de quinta a sábado, comandados pelos também curadores Tom Farias e Antonio Carlos Secchin. A dupla criou 12 painéis com dois convidados cada um, abordando tanto os aspectos genéricos quanto acadêmicos da obra do Poeta.

O Flitabira terá ainda, como não poderia deixar de ser, lançamento de livros, como os novos trabalhos de Ricardo Aleixo, que é o autor homenageado desta edição. Também haverá exposições e shows. “A estrutura é imensa. Desde o início a nossa proposta é fazer um festival, juntando todas as artes ao redor de Drummond”.