Nesta quinta-feira (13), o Fundo Internacional de Emergência das Nações Unidas para a Infância (Unicef) declarou estar profundamente alarmado com a intensificação da violência no leste do Congo e com o seu impacto nas crianças e nas famílias.

Segundo a diretora executiva da Unicef, Catherine Russell, nas cidades de Kivu do Norte e Kivu do Sul, a instituição está recebendo relatos horríveis de graves violações contra crianças pelas partes envolvidas no conflito que assola essa região do país, incluindo violações e outras formas de violência sexual, a níveis que ultrapassam tudo o que foi visto nos últimos anos.

"Durante a semana de 27 de janeiro a 02 de fevereiro, os parceiros da Unicef relataram que o número de casos de violação tratados em 42 instalações de saúde quintuplicou, sendo que, das pessoas tratadas, 30% eram crianças. Os nossos parceiros também estão ficando sem os medicamentos usados para reduzir o risco de infecção pelo HIV após uma agressão sexual”, lamentou Russell, considerando que os números reais dos casos podem ser bem mais elevados, porque muitos sobreviventes têm medo de pedir ajuda.

Uma das histórias compartilhadas pela Unicef no comunicado divulgado hoje é sobre uma mãe que contou que as suas seis filhas, sendo a mais nova de apenas 12 anos, foram sistematicamente violadas por homens armados, enquanto procuravam por comida.

"As crianças e as famílias em grande parte do leste do Congo continuam a enfrentar bombardeios e tiroteios incessantes. Nos últimos meses, milhares de crianças vulneráveis em campos de deslocação foram obrigadas a fugir várias vezes para escapar aos combates. E o que já acontecia antes da intensificação dos confrontos, é o aumento do recrutamento de crianças pelos grupos armados. Os relatórios indicam que crianças de somente 12 anos estão sendo recrutadas ou coagidas a se juntar as milícias", disse a diretora da Unicef.

Russel apelou às partes em conflito que cessem imediatamente e previnam as graves violações dos direitos das crianças, assim como devem também tomar medidas concretas para proteger os civis e as infraestruturas essenciais.

O grupo rebelde Movimento 23 de Março (M23), apoiado pelo país vizinho Ruanda, ocupou Goma, capital da província do Kivu do Norte, no final de janeiro, e avançou para a província vizinha do Kivu do Sul. O conflito no Congo pelo M23 consolidou o controle desta vasta região, rica em minérios e metais preciosos, essencial para a indústria e tecnologia mundiais.

De acordo com o último balanço provisório das Nações Unidas, só nos combates pelo controle de Goma causaram mais de três mil mortos e também o mesmo número de feridos. A Organização Mundial da Saúde (OMS) também denunciou que hospitais e necrotérios estão sobrecarregados em Goma e arredores e que mais de 70 unidades de saúde na província de Kivu Norte foram danificadas ou destruídas. Segundo a OMS, os riscos de disseminação de doenças infecciosas estão se multiplicando e cortes na ajuda externa dos Estados Unidos devem agravar seriamente ainda mais a situação, uma vez que o país contribuiu em 2024 com até 70% da resposta humanitária no país.

Já a comunidade internacional se limita a pedir por um cessar-fogo, com alguns países e a ONU a solicitarem também a retirada das tropas ruandesas do leste do Congo.

O Conselho dos Direitos Humanos das Nações Unidas aprovou na semana passada por unanimidade uma resolução que condena veementemente o apoio militar e logístico de Ruanda ao grupo rebelde M23, que segue causando vítimas civis, deslocamentos, abusos sexuais, execuções sumárias, raptos, desaparecimentos forçados e ataques contra defensores de direitos humanos, jornalistas e outros membros da sociedade civil além de outros tipos de violações a população do país. A ONU assinala que mais de 500 mil pessoas fugiram das suas casas desde o início de janeiro e este número se soma aos mais de 6,4 milhões que já estavam deslocados no país.

O Conselho estabeleceu a criação urgente de uma Missão de Apuração de Fatos para investigar violações graves do direito internacional no Congo e ainda uma comissão de inquérito independente para continuar o trabalho realizado pela missão de apuração. O Alto Comissário de Direitos Humanos da ONU, Volker Türk, indicou recentemente que o risco de escalada da violência em toda a sub-região africana nunca foi tão elevado e considerou que, se nada for feito, o pior virá, não só para os habitantes do leste do Congo, mas para além das fronteiras.

No passado, já foram impostas várias sanções contra os líderes do M23 e dois oficiais ruandeses envolvidos na guerrilha no Congo, como o congelamento de bens e a proibição de viajar, no entanto altos funcionários ruandeses nunca foram sancionados.

Desde 1998, o leste do Congo está mergulhado num conflito alimentado por milícias rebeldes e pelo exército, apesar da presença da Missão de Estabilização da ONU do Congo (Monusco).