JERUSALÉM (FOLHAPRESS) - Vacinação, vacinação, vacinação. Esse é o mantra do professor Ronni Gamzu, CEO do Centro Médico Sourasky (conhecido como Hospital Ichilov, em Tel Aviv).


Ele se reuniu nesta terça (9) com a delegação brasileira que foi a Israel tratar de uma colaboração nas pesquisas do spray nasal EXO-CD24, desenvolvimento no hospital. Em entrevista, Gamzu afirmou que drogas antivirais como o spray são importantes, mas nada supera a vacinação em massa como arma contra a epidemia da Covid-19.

Segundo Gamzu, "há um entusiasmo" do Brasil quanto ao remédio israelense que ele não vê em outros países. O médico vê isso com bons olhos, mas alerta: "Com todo o respeito aos medicamentos antivirais, as doenças virais acabam só com vacinas". Além disso, diz, o desenvolvimento e teste do novo remédio pode levar "meses, senão anos".

O medicamento EXO-CD24 foi anunciado no começo de fevereiro e testado em 30 voluntários em estado grave que estavam internados no Ichilov. Segundo o hospital, 29 pacientes se recuperaram em 3 a 5 dias. A fase 1 do desenvolvimento terminou em janeiro, mas o artigo científico sobre a pesquisa ainda não foi publicado, o que deve ocorrer até o fim deste mês.

Nesta terça, a delegação brasileira e representantes do hospital, incluindo o criador do spray, Nadir Arber, assinaram um acordo para realizar as fases 2 e 3 dos testes no Brasil.

O custo da cooperação brasileira não foi divulgado. Gamzu, ex-czar do coronavírus à frente da força-tarefa do governo israelense no combate à pandemia, alerta que desenvolver novas drogas "tem custo e é arriscado".

No terceiro e último dia da visita a Israel, a delegação, liderada pelo ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, assinou um protocolo de intenções com o Hospital Hadassah, de Jerusalém, para colaboração no desenvolvimento de uma vacina.

O imunizante do hospital israelense ainda está em fase inicial de testes, bem como alguns dos 15 em desenvolvimento no Brasil. O secretário de Pesquisa e Formação Científica do Ministério da Ciência e Tecnologia, Marcelo Morales, disse que produzir uma vacina brasileira é questão de "soberania nacional" porque "esse vírus veio para ficar".


O chanceler e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) também se reuniram com o presidente do Knesset (o Parlamento israelense), Yariv Levin, e com o chefe de gabinete do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, Tzachi Braverman.

O teor das conversas não foi divulgado, mas Levin disse haver expectativa quanto à promessa do presidente Bolsonaro de transferir a embaixada do Brasil para Jerusalém. Nem o chanceler nem o filho 03 do presidente quiseram falar com a Folha. Araújo chegou a cancelar uma entrevista previamente marcada.

PERGUNTA -

Como o sr. vê o interesse do Brasil no spray desenvolvido no Ichilov?

RONNI GAMZU - Estamos todos fazendo o possível -governos, cientistas e médicos- para encontrar soluções para a crise do coronavírus. Não só com vacinas, mas também desenvolvendo a tecnologia para medicamentos antivirais. Queremos usar nossa capacidade para termos melhores remédios contra o vírus. É uma operação difícil, então temos que colaborar [entre os países].

Qual foi o resultado da reunião com a delegação brasileira em visita a Israel?

RG - Ficou decidido que Israel vai colaborar com o Brasil para avançar na fase 2 do remédio, garantindo poderemos entender mais rapidamente como usar essa droga no combate contra o coronavírus.

No Brasil, o spray nasal EXO-CD24 está sendo visto como uma droga milagrosa...


RG - Veja bem: a melhor maneira de sair da crise do coronavírus é com a vacinação. Temos algumas drogas antivirais e estamos desenvolvendo outras. Mas é um processo longo, uma jornada.

Temos alguns candidatos. Esta molécula inteligente é um deles, mas não é um milagre. Sugiro não pegar um remédio, agora, e fazer dele a verdadeira solução, porque a verdadeira solução é a prevenção. Temos que continuar nossa luta científica para encontrar curas, mas não esqueça: prevenção, prevenção, prevenção. Vacinação, vacinação, vacinação.

O Ichilov está fechando acordos com outros países, também?

RG - Recebemos consultas de todo o mundo, na maioria iniciais. O processo de desenvolvimento do medicamento é preliminar, então estamos indo com cuidado.

No Brasil, há um entusiasmo grande, e o país tem muita força. Realmente, precisamos de países onde há morbidade (muitas mortes) para recrutar pacientes. Portanto, neste momento há um começo, um fio de meada para colaboração científica. Espero muito que tenhamos sucesso.

A colaboração com o Brasil será diferente do que com outros países?


RG - Sim, há um entusiasmo para entrar em detalhes e implementar ações muito, muito rapidamente. Vejo menos isso em outros países. Nutrimos uma grande amizade com o Brasil. Estamos sempre dispostos a colaborar, porque desenvolver novos medicamentos é difícil. Não é simples e também não é barato. Há riscos.

Foram discutidos valores?

RG - Ainda não. Não chegamos a isso, mas é claro que quando se fala de desenvolvimento de medicamentos, há um custo.

Qual é o próximo passo?

RG - Aprovar pesquisas multicêntricas internacionais. Conversamos sobre isso. Dentro de um mês, estaremos acelerando isso dentro de Israel e no exterior.

Quantos doentes farão parte da fase 2, no Brasil?

RG - Algumas dezenas. Na terceira fase é que é mais. Precisa haver um estudo controlado, que compare quem toma o medicamento com quem toma placebo.

Se tudo der certo, quando essa droga poderá estar realmente à disposição do público?


RG - É um desenvolvimento de uma nova droga, então é questão de meses ou até anos. Neste momento de epidemia, estamos indo um pouco mais rápido, mas não se pode pular nenhuma fase.

O sr. ouviu dos brasileiros objeções às vacinas?

RG - Não, mas é preciso colocar as coisas em proporção. É preciso fazer as duas coisas ao mesmo tempo (desenvolver vacinas e remédios), mas precisa-se saber o que é mais importante.

Com todo o respeito aos medicamentos antivirais, as doenças virais acabam só com vacinas.