O cenário eleitoral peruano é tão incerto que, às vésperas do pleito presidencial, marcado para o domingo (11), não é possível afirmar quem são os favoritos a um eventual segundo turno. Dos 18 candidatos na disputa, nenhum tem mais de 10% das intenções de voto nas pesquisas, e os sete primeiros estão embolados com diferenças que variam de centésimos a cinco pontos percentuais.
 
Na verdade, há, sim, alternativas favoritas. Juntas, as opções de anular o voto e a de não comparecer às urnas somam 30%, segundo levantamento do instituto Ipsos.
"Não há uma palavra para descrever a situação, talvez uma lágrima o faria melhor", afirma o sociólogo Fernando Tuesta Soldevilla, para quem as sondagens devem ser lidas semana a semana. "O desgaste dos candidatos é tão forte que os que lideram caem rapidamente e, na semana seguinte, já há novos líderes. É uma situação inédita não saber ao certo nem ao menos quem será um dos dois candidatos no segundo turno."

Para os especialistas ouvidos pela reportagem, esta eleição reflete a situação de desmonte dos partidos, algo que vem desde o período fujimorista (1990-2000), o aumento da desconfiança em relação à política provocada por seguidos escândalos de corrupção –um deles envolvendo a empreiteira brasileira Odebrecht– e os efeitos da pandemia do coronavírus. O Peru é um dos países da América do Sul mais afetados pela Covid, com 53.978 mortes desde o início da crise –e agora vê uma nova alta de casos.

"Houve eleições em outros países durante a pandemia, mas não uma eleição num novo momento de pico da pandemia, é uma irresponsabilidade", completa Tuesta. A pressa para realizar o pleito na data prevista, porém, responde também à instabilidade do atual governo peruano.

O presidente interino Francisco Sagasti é o quarto do atual mandato e defende que a data seja respeitada para que o Peru tenha sua festa de 200 anos de independência com a posse do eleito, em 28 de julho.

Embolados nos primeiros lugares, segundo pesquisa do instituto Datum, estão cinco "outsiders" e apenas dois nomes mais experientes: a direitista Keiko Fujimori, ex-congressista e filha do autocrata Alberto Fujimori, com 9,3% das intenções de voto, e a líder de esquerda Veronika Mendoza, com 5,9%.

O levantamento também mostra o populista de esquerda Yohny Lescano com 9,1%, e o candidato de ultradireita Rafael López Aliaga com 8,9%. Lescano, que vinha liderando nas últimas semanas, já caiu. Entre suas propostas está maior presença do Estado na exploração de minérios –maior riqueza do país–, a criação de empregos e maior restrição à entrada de imigrantes venezuelanos.


Já López Aliaga vem sendo chamado de "Bolsonaro peruano" por seu vínculo com a Igreja Católica –ele é membro da Opus Dei– e pela pauta conservadora nos costumes. É contrário ao aborto e, assim como Lescano, à entrada de venezuelanos. Aspectos pitorescos de sua personalidade –ele afirma usar um cinto com agulhas para suprimir seu desejo sexual e se aproximar a Deus– chamaram a atenção e, por isso, o candidato vem conquistando espaço nos meios de comunicação.

No sobe e desce das pesquisas, os nomes que ganharam força recentemente são Pedro Castillo, um ex-ativista que comandou uma greve nacional de professores em 2017 e hoje é um candidato de esquerda, com 8,2%, e o economista e acadêmico liberal Hernando de Soto, com 7,2%. Líder das sondagens até alguns meses atrás, George Forsyth, ex-goleiro do Alianza Lima, está em queda, marcando 7,4%.

A eleição também definirá a nova composição do Congresso unicameral de 130 membros, numa votação disputada por 11 partidos. "Tudo aponta para que a instabilidade continue, porque nenhum partido deve ter maioria. Assim, a governabilidade fica comprometida", diz o sociólogo Tuesta.

Para Vergara, o problema não é tanto das instituições –o modelo político peruano, um presidencialismo com elementos de parlamentarismo, –, mas sim político. Ainda assim, defende a revisão da figura da moção de vacância por incapacidade moral, que é "muito subjetiva e dá espaço para decisões arbitrárias".

O mecanismo para afastar presidentes, como utilizado contra Pedro Pablo Kuczynski e Martín Vizcarra, é mais rápido e menos burocrático que o impeachment –também existente no país– e, por isso, traz mais instabilidade à continuidade dos líderes.

O vencedor do pleito não herdará apenas um país golpeado pela pandemia, mas também um com muitos problemas econômicos. Houve uma redução do PIB em 2020 de 11% e um aumento do desemprego em 13,8%. Um provável segundo turno está marcado para o dia 6 de junho.