RFI - O jornal francês Le Figaro, de linha editorial conservadora, publica nesta segunda-feira (19) testemunhos de um grupo de médicos franceses que passaram duas semanas em missão humanitária no Hospital Europeu do sul da Faixa de Gaza, onde 300 pessoas são socorridas diariamente. Dois médicos descreveram ao Le Figaro o drama vivido pelos civis palestinos. Um deles comparou a situação com a de judeus perseguidos pelo regime nazista.

“Normalmente os civis conseguem fugir dos combates. Aqui é impossível. A população não tem onde se proteger. Centenas de milhares de pessoas vagueiam pelas ruas em busca de água e comida”, disse o professor francês Raphaël Pitti, experiente anestesista militar que já trabalhou em zonas de conflito, como na ex-Iugoslávia, no Líbano, durante a Guerra do Golfo e, mais recentemente, na Síria e na Ucrânia.

De retorno de uma missão humanitária no Oriente Médio, Pitti afirma "nunca ter visto nada comparável à situação em Gaza". “Acho que pode ser semelhante à do Gueto de Varsóvia”, onde "380 mil judeus foram amontoados pelos nazistas desde 1940, em condições de vida desumanas", complementa o jornal francês. “Não estamos no mesmo nível de desnutrição, mas a situação está próxima”, garante o médico.

Pitti liderou uma missão de cerca de 20 médicos humanitários da ONG PalMed (Palestine Medical) que partiram para prestar assistência aos seus colegas palestinos entre 22 de janeiro e 6 de fevereiro. A equipe de voluntários trabalhou no Hospital Europeu, localizado entre a cidade de Khan Younis e a de Rafah, no sul da Faixa de Gaza.

Segundo o professor Pitti, em Gaza, a lógica habitual dos atendimentos médicos se inverteu. "Os feridos mais graves são considerados automaticamente como mortos, principalmente se foram atingidos na cabeça. A maioria morre em poucas horas no corredor, em macas, sem acompanhamento ou sedação, por falta de medicamentos e analgésicos", relata o anestesista.

Outro integrante da missão, o clínico-geral e intensivista Khaled Benboutrif, ficou impressionado com a densidade de pessoas – cerca de 25 mil civis –, que vivem em condições muito precárias, sob abrigos de madeira, papelão ou plástico ao redor do hospital.

Le Figaro assinala que na quarta-feira (14), o presidente francês, Emmanuel Macron, advertiu o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, sobre “o intolerável custo humano e a situação humanitária” na Faixa de Gaza.

Macron: ponto de ruptura - Em entrevista exclusiva ao jornal comunista L'Humanité, nesta segunda-feira (19), Macron reafirma a posição da França no conflito. “Condenamos (...) o ataque terrorista do Hamas em 7 de outubro. Reconhecemos o direito de Israel de se defender e de combater o terrorismo. E indicamos desde o início que esta luta deve ser conduzida conforme o direito humanitário, o direito internacional e o direito de guerra. Não podemos apoiar operações que violem este direito”, afirmou o chefe de Estado francês. Antes de acrescentar: “Eu disse ao primeiro-ministro Benjamin Netanyahu que, aos meus olhos, Rafah é um ponto de ruptura nessas operações”, declarou Macron, diante da determinação de Israel de promover uma ampla ofensiva nesta cidade, onde 1,4 milhão de palestinos estão amontoados em barracas nas ruas, depois de fugir dos combates no restante do território palestino.

A imprensa francesa deu destaque moderado às declarações do presidente Lula sobre a guerra na Faixa de Gaza. O jornal progressista Libération, que tem denunciado a grave situação humanitária da população palestina no território ocupado pelo exército hebreu, relata que o presidente brasileiro acusou Israel de “genocídio” no final de sua visita a Etiópia, onde participou da 37ª Cúpula da União Africana.

"Lula chegou a traçar um paralelo com o extermínio dos judeus implementado pelo regime de Hitler", escreve o jornal francês, assinalando que "essas observações estão entre os comentários mais virulentos feitos por Lula sobre o conflito". Segundo o Libération, "o veterano líder sul-americano é uma voz proeminente do Sul" e o Brasil está atualmente na presidência rotativa do G20.