BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) - Protestos voltaram às ruas das maiores cidades polonesas na noite desta quarta (27), depois que governo anunciou mais um passo para tornar o aborto quase impossível no país. O gatilho foi a publicação das justificativas do Tribunal Constitucional para a decisão que proibiu a interrupção da gravidez em caso de malformação grave do feto, em outubro.
 
O governo anunciou que isso permitiria a publicação do veredito no diário oficial, consolidando em lei a proibição.

Com a nova restrição, o aborto ficará permitido em casos de estupro, incesto e quando a vida da mãe estiver em perigo, o que representa apenas 2,4% dos 1.100 abortos legais realizados na Polônia em 2019. Mesmo antes da decisão da principal corte polonesa, o país já tinha uma das mais restritivas regras de aborto da União Europeia.

A atual legislação sobre o aborto era aprovada pela maioria da população, e tentativas anteriores de endurecê-la provocaram protestos em várias cidades polonesas. Após a decisão de outubro, houve semanas de manifestações promovidas por grupos de opositores ao governo, formados principalmente por mulheres e jovens.

Os protestos fizeram com que o partido governista, Lei e Justiça (PiS), adiasse a publicação do veredito no diário oficial (o que o transforma em lei), provocando um vácuo jurídico. O jornal britânico Guardian relatou que muitas mulheres polonesas passaram a viajar para o exterior para abortar, já que médicos não tinham certeza sobre a legalidade da prática.

Na noite desta quarta, a emissora de TV independente Polsat mostrava imagens de protestos em Varsóvia, Cracóvia, Lodz e Poznan, entre outras grandes cidades. Os participantes carregam faixas pedindo "Liberdade de escolha em vez de terror" ou declarando "Isto é guerra", além de bandeiras de movimentos LGBT e do feminista Greve das Mulheres.

Alguns manifestantes usavam bandanas e lenços verdes, em referência às manifestações pró-aborto na Argentina. Não havia estimativa de número de presentes.

A sociedade polonesa é crescentemente polarizada entre os centros metropolitanos, progressistas, e pequenas cidades rurais, conservadoras. Apesar da divisão, a direita conservadora venceu por pequena margem o pleito para presidente, no ano passado, confirmando o poder obtido nas eleições gerais de 2015, quando o PiS chegou ao poder.

Desde então, a sigla implementou reformas para aumentar o controle sobre o Judiciário, que lhe valeram uma investigação por parte da União Europeia, ainda em curso, e o rebaixamento do país em rankings de liberdades democráticas.

No Tribunal Constitucional (o equivalente ao Supremo Tribunal Federal no Brasil), que decidiu pela restrição maior ao aborto, 11 dos 12 juízes foram nomeados pelo partido governante, e a presidente da corte, Julia Przylebska, faz parte do círculo íntimo do homem forte do país, o vice-primeiro-ministro Jaroslaw Kaczynski.