Os representantes da Rússia e dos Estados Unidos trocaram acusações nesta segunda-feira (9) durante reunião do Conselho de Segurança da ONU para discutir a situação na Síria, onde um suposto ataque químico deixou dezenas de mortos no último final de semana na cidade de Duma.
Vassily Nebenzia, embaixador da Rússia na ONU, disse que seu país tem sido “imperdoavelmente ameaçado” por países que alegam o uso de armas químicas, como os EUA, a França e o Reino Unido. Nebenzia disse que esses países agiram muito rápido para culpar a Síria e a Rússia e que essas alegações são usadas como um pretexto para um ataque.
Também afirmou que uma resposta militar dos EUA poderia ter "graves repercussões": "Transmitimos aos EUA através dos canais relevantes que força armada sob um pretexto mentiroso contra a Síria, onde as tropas russas foram deslocadas, poderia levar a graves repercussões", disse.
O embaixador russo negou que um ataque químico tenha sido realizado, como vem se pronunciando os governos de Vladimir Putin e de Bashar al-Assad. Nebenzia disse também que a Rússia está disposta a considerar a investigação da Opaq sobre o tema.
Já a embaixadora dos EUA, Nikki Haley, acusou a Rússia de ser conivente com o regime de Bashar Al-Assad. “Quando os militares sírios atacam os civis eles contam com o material militar dado pela Rússia. A Rússia poderia acabar com esse massacre sem sentido se quisesse, mas acordo com o regime de Assad e apoia sem qualquer hesitação”.
Haley disse “só um monstro” realiza ataques químicos e que os EUA estão determinados a ver que ele seja responsabilizado. "O monstro que foi responsável por esse ataque não tem consciência. O regime russo, cujas mãos estão cobertas de sangue de crianças sírias, não se envergonha com fotos de vítimas. Já tentamos isso antes”, disse.
Ainda disse que os EUA vão responder ao ataque independentemente da decisão que o Conselho de Segurança tomar.
A troca de acusações ocorre em um momento e que as relações entre a Rússia e países ocidentais estão em seu pior nível desde a Guerra Fria, após o caso do envenenamento de um ex-espião russo no Reino Unido.
‘Invenção hollywoodiana’
O representante sírio na ONU, Bashar Ja'afari, disse diversas vezes em seu discurso que as alegações de um ataque químico são uma mentira, que atribuiu aos rebeldes sírios e o grupo Capacetes Brancos, de civis que atuam voluntariamente como socorristas.
“Os Capacetes Brancos inventaram provas e fizeram fotos para apontar o governo sírio à comunidade internacional e para justificar uma intervenção militar na Síria”, disse. “São mentiras extremamente elaboradas. São uma invenção hollywoodiana”.
Ja'afari disse que o governo sírio não possui armas químicas e condena seu uso “em qualquer lugar e sob quaisquer circunstâncias”. Também afirmou que médicos russos analisaram as supostas vítimas e comprovaram que elas não foram atingidas por um ataque químico.
O representante sírio também acusou rebeldes de deteriorarem a situação humanitária na região: “Os armazéns dos terroristas estavam cheios de alimentos e medicamentos que foram monopolizados e vendidos a preços exorbitantes [aos civis]”, disse.
Ja'afari e o representante russo, Vassily Nebenzia, disseram que estão dispostos a receber e facilitar uma visita segura de investigadores da Opaq na Síria para estudar as denúncias.
A reunião começou com a participação do enviado da ONU à Síria, Staffan de Mistura, que relatou os últimos acontecimentos no país e pediu que os países reunidos tenham a proteção dos civis como prioridade. De Mistura também defendeu uma investigação independente sobre as alegações do uso de armas químicas, que são "extremamente preocupantes", e lembrou que o uso viola leis internacionais e resoluções da ONU.
O ataque em Duma
O ataque em que um gás tóxico teria sido utilizado aconteceu no sábadoe deixou dezenas de mortos e feridos. A Sociedade Médica Sírio-Americana (SAMS, na sigla em inglês) e a Defesa Civil síria (ONG mais conhecida como Capacetes Brancos) estimam que 49 pessoas morreram.
Já o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH), ONG que monitora a guerra civil do país, disse que ao menos 80 pessoas morreram – 40 de sufocamento.
A acusação
A acusação do suposto ataque químico contra o governo partiu do grupo rebelde sírio Jaish al-Islam. Eles acusam o regime de Assad de lançar um barril-bomba com substâncias químicas venenosas contra civis em meio a uma ofensiva das forças do governo sírio a Duma.
Os Capacetes Brancos, socorristas ligados à oposição, relataram que famílias inteiras foram encontradas sufocadas em suas casas e abrigos.
A negação
O governo sírio nega a utilização de armas químicas. A mídia estatal síria negou o lançamento de ataques químicos assim que as notícias começaram a circular. "Os terroristas do Jaish al-Islam estão em colapso e seus meios de comunicação estão fabricando ataques químicos em uma tentativa fracassada de obstruir os avanços do Exército Árabe Sírio", afirmou a agência de notícias estatal Sana.
A Rússia, aliada do governo sírio, diz que as acusações são falsas e constituem uma provocação. Segundo o ministro de Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, especialistas militares estiveram em Duma e não localizaram traços de "cloro ou de qualquer outra substância química utilizada contra os civis".
A reação dos EUA
Os Estados Unidos pediram à Rússia que retirem o apoio a Assad após o suposto ataque químico. No Twitter, o presidente dos EUA, Donald Trump, condenou o suposto ataque e afirmou que a Síria pagará um "preço alto".
Nesta segunda, Trump prometeu tomar em 24 a 48 horas uma "decisão importante" sobre a Síria. "Estamos estudando a situação e falando com líderes militares, e tomaremos alguma decisão importante nas próximas 24 a 48 horas", afirmou. "Isso é sobre a humanidade. Não se pode permitir que aconteça", disse.