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string(10977) "Foram 56 dias, oito semanas, de uma quarentena que obrigou 60 milhões de pessoas a ficar em casa. Mas, nesta segunda-feira (4), a Itália começou a reabrir suas cidades, em meio a muitas incertezas.
O país, epicentro inicial de contaminação do coronavírus fora da China, foi o primeiro do mundo a entrar inteiramente em confinamento. E agora experimenta como recomeçar parte das atividades econômicas e sociais e, ao mesmo, conviver com o vírus.
Depois de 29 mil mortes e mais de 211 mil contaminados, a Itália ainda tem 100 mil pessoas atualmente diagnosticadas com a Covid-19, internadas ou isoladas em casa. Mas a economia italiana, uma das mais frágeis da Europa e que já teve queda de 4,7% do PIB no primeiro trimestre, exige a retomada.
É seguro sair às ruas com o vírus ainda em circulação? As autoridades sanitárias terão agilidade para identificar e isolar novos casos? As regras de segurança serão respeitadas pelos cidadãos? Sem escolas, como as famílias vão dar conta de conciliar o trabalho e a rotina dos filhos? Depois de tanto tempo de suspensão e com novas regras de funcionamento, quanto da atividade produtiva consegue reabrir?
Sem nenhuma dessas respostas, 4,4 milhões de pessoas voltam nesta semana ao trabalho em indústrias, fábricas, construção civil, comércio por atacado e escritórios - são quase cem setores liberados.
Todos devem cumprir um protocolo de segurança que inclui distanciamento entre funcionários, máscaras, higienizantes para as mãos, sanitização de ambientes e medida da temperatura no início do expediente, além de outras exigências específicas para cada segmento.
Um dos maiores impactos nas cidades - e grande fonte de preocupação das autoridades sanitárias - é a circulação de pessoas nos meios públicos de transporte.
"Mais de 4 milhões de italianos voltarão ao trabalho, se deslocando com o transporte público. Serão mais numerosas as ocasiões de um possível contágio. Como nunca antes, o futuro do país está nas nossas mãos", afirmou na noite de domingo (3) o primeiro-ministro Giuseppe Conte. "Quanto mais seguirmos as indicações de segurança, mais cedo poderemos reconquistar outros espaços de liberdade."
Nesta segunda, o controle foi rígido nas estações de Milão, na Lombardia, a região mais afetada pela epidemia, com metade das mortes de todo o país. Metrô, ônibus e bondes voltaram a operar com toda a frota, mas só 25% do espaço interno pode ser ocupado, para que seja atendida a distância entre passageiros.
Uma nova sinalização orienta os percursos de entrada e saída; funcionários vetaram a passagem pela catraca de quem estava sem máscara (quase ninguém) e sem luvas (vários); e avisos sonoros repetiam os cuidados a serem tomados.
Os assentos proibidos são marcados com adesivos, os meios de transporte de superfície, se cheios, podem se recusar a pegar novos passageiros ou chamar a polícia para fazê-los descer, e as catracas do metrô podem ser travadas se plataformas estiverem com muita gente. As ruas estão ganhando faixas para pedestres e bicicletas.
Na estação de trem Cadorna, bastante usada por quem mora em cidades do entorno e trabalha no centro de Milão, quem desembarcava passava por um sensor de temperatura, e o protocolo era mandar de volta para casa quem tivesse acima de 37,5 graus.
"Tive muito medo de pegar o trem, mas a distância entre as pessoas estava sendo respeitada, tudo estava organizado", contou a babá Adriana Ocampo, que chegou de Garbagnate a Milão. Segundo ela, era a primeira grande saída desde o início da quarentena. "Me sinto melhor, com o sentimento de que termine logo essa epidemia."
Na estação Central, a principal da cidade para deslocamentos para outras regiões, uma longa fila de cem passageiros se formou diante do controle realizado por policiais, que checavam o motivo das viagens.
Além da economia, um pouco de vida social também renasce. Visitas familiares e "afetivas estáveis" estão liberadas (proibido fazer festa) e os parques estão reabertos (proibidos parquinho e piquenique). As crianças podem, finalmente, voltar a circular. E, já neste primeiro dia, elas encheram calçadas e parques com carrinhos, patinetes e bicicletas.
Alvo de debate nos últimos dias, os encontros entre amigos, mesmo os privados, continuam vetados, ainda que não se saiba muito bem se haverá fiscalização e como ela será feita. A confusão começou com o termo usado pelo governo para descrever as situações sociais liberadas a partir de agora.
"Estão consentidos os deslocamentos para encontrar exclusivamente os próprios parentes", dizia o decreto de 26 de abril, com as regras para a fase dois. A reação foi imediata: e os casais de namorados, e os amigos? O governo precisou incluir uma emenda, divulgada no fim de semana: "O termo parente se refere a cônjuges, parceiros que moram juntos, parceiros de união civil, pessoas que têm ligação afetiva estável, parentes até seis graus". Nada de amigos, portanto.
A lista de insatisfeitos com o modo como a fase dois começa é grande. As missas seguem suspensas até o fim do mês, apesar das fortes queixas dos bispos italianos. O varejo (exceto roupas infantis) só deve reabrir no dia 18 de maio. O campeonato italiano de futebol está sem previsão de ser retomado - nesta semana, os jogadores podem voltar a treinar individualmente. Salões de beleza, restaurantes, bares, cafeterias e sorveterias voltam a receber clientes em junho.
Desde já, porém, podem reabrir as portas, mas apenas para entrega em domicílio ou para retirada. Alguns decidiram já aderir, enquanto outros se mantinham fechados nesta segunda.
Em funcionamento desde 1997 em Milão, a Taverna degli Amici subiu as portas de ferro depois de dois meses e colocou uma mesinha à beira da calçada para anotar os pedidos. O próprio dono se encarregou da missão, atrapalhando-se com as embalagens e as luvas obrigatórias.
"Não sei bem como isso vai funcionar. Sou especializado em grelhados, não quero servir qualquer coisa e arruinar minha história", afirmou Ernesto Notaro.
E tem as famílias com filhos. As escolas só vão reabrir em setembro, e o ano escolar em curso vai terminar em junho à distância. Organizações de pais e grupos de mulheres criticaram a ausência de alternativas para viabilizar a volta ao trabalho. Nesta semana, 75% dos que voltam a trabalhar são homens, segundo um estudo com dados do Istat (Instituto Nacional de Estatística).
"A Itália vai voltar a ser aquela do anos 1950, quando a mulher deveria cuidar de tudo - cozinhar, fazer compras e ajudar as crianças nas tarefas da escola", diz a advogada Sara Wolfler, mãe de uma menina de cinco anos, que se prepara para voltar ao escritório na próxima semana. "A gestão da escola digital é complexa. Quando eu voltar ao trabalho, talvez minha filha precise perder um ou outro encontro."
As dúvidas e as críticas estão por toda parte, inclusive entre médicos especialistas. A entrada na fase dois acontece sem que um aplicativo tenha sido indicado para que as autoridades sanitárias consigam rastrear os contágios e sem a realização dos testes sorológicos.
Só a partir desta semana o governo vai começar a realizar 150 mil exames em uma amostragem demográfica, para tentar entender quanto do país foi contaminado e onde estão essas pessoas. E a conversa sobre passaporte de imunidade está restrita à esfera privada de empresas e famílias, que podem decidir fazer por conta própria.
O "novo normal" italiano acabou de começar e não tem data para durar. Como dizem os virologistas, cada ação tem reação na epidemia depois de duas semanas.
"Quero lembrar que, assim como foram abertas, algumas atividades podem fechar novamente. Teremos indicadores que nos permitirão tomar medidas corretivas no caso do retorno da epidemia. Os fechamentos serão automáticos", disse à imprensa italiana o médico Walter Ricciardi, parte do comitê técnico-científico que auxilia o governo.
A Itália que volta às ruas lentamente agora convive com regras muito mais restritivas do que as que estão em vigor em São Paulo - o estado brasileiro mais atingido pela pandemia.
Algumas proibições implantadas no país europeu não tiveram semelhantes por aqui, como a proibição de as crianças saírem às ruas durante três semanas e o veto à prática de exercícios físicos em abril na região da Lombardia.
Em outras áreas do país era possível caminhar ou correr sozinho, desde que perto de casa. Andar de bicicleta e jogos ao ar livre também foram completamento vetados aos italianos.
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O país, epicentro inicial de contaminação do coronavírus fora da China, foi o primeiro do mundo a entrar inteiramente em confinamento. E agora experimenta como recomeçar parte das atividades econômicas e sociais e, ao mesmo, conviver com o vírus.
Depois de 29 mil mortes e mais de 211 mil contaminados, a Itália ainda tem 100 mil pessoas atualmente diagnosticadas com a Covid-19, internadas ou isoladas em casa. Mas a economia italiana, uma das mais frágeis da Europa e que já teve queda de 4,7% do PIB no primeiro trimestre, exige a retomada.
É seguro sair às ruas com o vírus ainda em circulação? As autoridades sanitárias terão agilidade para identificar e isolar novos casos? As regras de segurança serão respeitadas pelos cidadãos? Sem escolas, como as famílias vão dar conta de conciliar o trabalho e a rotina dos filhos? Depois de tanto tempo de suspensão e com novas regras de funcionamento, quanto da atividade produtiva consegue reabrir?
Sem nenhuma dessas respostas, 4,4 milhões de pessoas voltam nesta semana ao trabalho em indústrias, fábricas, construção civil, comércio por atacado e escritórios - são quase cem setores liberados.
Todos devem cumprir um protocolo de segurança que inclui distanciamento entre funcionários, máscaras, higienizantes para as mãos, sanitização de ambientes e medida da temperatura no início do expediente, além de outras exigências específicas para cada segmento.
Um dos maiores impactos nas cidades - e grande fonte de preocupação das autoridades sanitárias - é a circulação de pessoas nos meios públicos de transporte.
"Mais de 4 milhões de italianos voltarão ao trabalho, se deslocando com o transporte público. Serão mais numerosas as ocasiões de um possível contágio. Como nunca antes, o futuro do país está nas nossas mãos", afirmou na noite de domingo (3) o primeiro-ministro Giuseppe Conte. "Quanto mais seguirmos as indicações de segurança, mais cedo poderemos reconquistar outros espaços de liberdade."
Nesta segunda, o controle foi rígido nas estações de Milão, na Lombardia, a região mais afetada pela epidemia, com metade das mortes de todo o país. Metrô, ônibus e bondes voltaram a operar com toda a frota, mas só 25% do espaço interno pode ser ocupado, para que seja atendida a distância entre passageiros.
Uma nova sinalização orienta os percursos de entrada e saída; funcionários vetaram a passagem pela catraca de quem estava sem máscara (quase ninguém) e sem luvas (vários); e avisos sonoros repetiam os cuidados a serem tomados.
Os assentos proibidos são marcados com adesivos, os meios de transporte de superfície, se cheios, podem se recusar a pegar novos passageiros ou chamar a polícia para fazê-los descer, e as catracas do metrô podem ser travadas se plataformas estiverem com muita gente. As ruas estão ganhando faixas para pedestres e bicicletas.
Na estação de trem Cadorna, bastante usada por quem mora em cidades do entorno e trabalha no centro de Milão, quem desembarcava passava por um sensor de temperatura, e o protocolo era mandar de volta para casa quem tivesse acima de 37,5 graus.
"Tive muito medo de pegar o trem, mas a distância entre as pessoas estava sendo respeitada, tudo estava organizado", contou a babá Adriana Ocampo, que chegou de Garbagnate a Milão. Segundo ela, era a primeira grande saída desde o início da quarentena. "Me sinto melhor, com o sentimento de que termine logo essa epidemia."
Na estação Central, a principal da cidade para deslocamentos para outras regiões, uma longa fila de cem passageiros se formou diante do controle realizado por policiais, que checavam o motivo das viagens.
Além da economia, um pouco de vida social também renasce. Visitas familiares e "afetivas estáveis" estão liberadas (proibido fazer festa) e os parques estão reabertos (proibidos parquinho e piquenique). As crianças podem, finalmente, voltar a circular. E, já neste primeiro dia, elas encheram calçadas e parques com carrinhos, patinetes e bicicletas.
Alvo de debate nos últimos dias, os encontros entre amigos, mesmo os privados, continuam vetados, ainda que não se saiba muito bem se haverá fiscalização e como ela será feita. A confusão começou com o termo usado pelo governo para descrever as situações sociais liberadas a partir de agora.
"Estão consentidos os deslocamentos para encontrar exclusivamente os próprios parentes", dizia o decreto de 26 de abril, com as regras para a fase dois. A reação foi imediata: e os casais de namorados, e os amigos? O governo precisou incluir uma emenda, divulgada no fim de semana: "O termo parente se refere a cônjuges, parceiros que moram juntos, parceiros de união civil, pessoas que têm ligação afetiva estável, parentes até seis graus". Nada de amigos, portanto.
A lista de insatisfeitos com o modo como a fase dois começa é grande. As missas seguem suspensas até o fim do mês, apesar das fortes queixas dos bispos italianos. O varejo (exceto roupas infantis) só deve reabrir no dia 18 de maio. O campeonato italiano de futebol está sem previsão de ser retomado - nesta semana, os jogadores podem voltar a treinar individualmente. Salões de beleza, restaurantes, bares, cafeterias e sorveterias voltam a receber clientes em junho.
Desde já, porém, podem reabrir as portas, mas apenas para entrega em domicílio ou para retirada. Alguns decidiram já aderir, enquanto outros se mantinham fechados nesta segunda.
Em funcionamento desde 1997 em Milão, a Taverna degli Amici subiu as portas de ferro depois de dois meses e colocou uma mesinha à beira da calçada para anotar os pedidos. O próprio dono se encarregou da missão, atrapalhando-se com as embalagens e as luvas obrigatórias.
"Não sei bem como isso vai funcionar. Sou especializado em grelhados, não quero servir qualquer coisa e arruinar minha história", afirmou Ernesto Notaro.
E tem as famílias com filhos. As escolas só vão reabrir em setembro, e o ano escolar em curso vai terminar em junho à distância. Organizações de pais e grupos de mulheres criticaram a ausência de alternativas para viabilizar a volta ao trabalho. Nesta semana, 75% dos que voltam a trabalhar são homens, segundo um estudo com dados do Istat (Instituto Nacional de Estatística).
"A Itália vai voltar a ser aquela do anos 1950, quando a mulher deveria cuidar de tudo - cozinhar, fazer compras e ajudar as crianças nas tarefas da escola", diz a advogada Sara Wolfler, mãe de uma menina de cinco anos, que se prepara para voltar ao escritório na próxima semana. "A gestão da escola digital é complexa. Quando eu voltar ao trabalho, talvez minha filha precise perder um ou outro encontro."
As dúvidas e as críticas estão por toda parte, inclusive entre médicos especialistas. A entrada na fase dois acontece sem que um aplicativo tenha sido indicado para que as autoridades sanitárias consigam rastrear os contágios e sem a realização dos testes sorológicos.
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A Itália que volta às ruas lentamente agora convive com regras muito mais restritivas do que as que estão em vigor em São Paulo - o estado brasileiro mais atingido pela pandemia.
Algumas proibições implantadas no país europeu não tiveram semelhantes por aqui, como a proibição de as crianças saírem às ruas durante três semanas e o veto à prática de exercícios físicos em abril na região da Lombardia.
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