Padre Fábio de Melo, que perdeu a mãe para Covid-19,  ainda guarda na memória do encontro que teve com a travesti Luana Muniz, na quadra da Mangueira, em 2015. A partir do pedido de foto feito por ela, nasceu uma amizade que transformaria para sempre o religioso. "Foi um ser humano que marcou minha vida. Eu tenho no meu celular algumas conversas tão bonitas onde nós falávamos da nossa vida, dos nossos pontos de vista tão diferentes. Mas nós convergíamos para um único ponto: o amor ao ser humano", diz o padre, em depoimento inédito ao documentário "Filha da Lua", que chega aos cinemas no dia 12 de agosto.

A amizade entre eles foi interrompida com a partida de Luana, dois anos depois do primeiro encontro. Mas, antes disso, ele pôde conhecer o trabalho social realizado pela travesti na Lapa, no Centro do Rio, além de rever seus próprios preconceitos. "Se um dia nós aprendêssemos que, apesar de termos vidas diferentes, nós temos sentimentos semelhantes e sofremos as mesmas dores. Eu me tornei parceiro da obra dela. Ficamos amigos, de nos falarmos semanalmente. Não consigo apagar as mensagens de voz dela até hoje", revela Fábio de Melo no documentário, vestindo uma camisa de Super-Homem.

Na época da foto, que acabou virando notícia em todo o país, Fábio de Melo descreveu como "uma experiência surpreendente" o encontro com Luana Muniz. Dias depois, o padre faria uma relato emocionante durante uma pregação na Canção Nova, em São Paulo, assumindo o desconforto com o pedido da travesti, mas que, logo em seguida, se comovera ao saber de sua história e do trabalho social feito por ela.


"Como que eu vou reagir?’(pausa). Independente de qualquer julgamento, estou confessando a hipocrisia do meu coração naquela hora. Muitas pessoas começaram a se encorajar para tirar foto comigo. E ele (o travesti) lá do fundo olhando. Quando, de repente, eu só vi a sombra dele na minha direção, e o meu preconceito, o medo de me expor, tudo vindo à tona. Que coisa horrorosa isso em nós... Como se eu fosse melhor. Isso é mesquinho, é vergonhoso o que eu estou dizendo pra vocês”, disse Fábio de Melo na ocasião.

O documentário "Filha da Lua", dirigido por Rian Córdova e Leonardo Menezes, traz o depoimento de outros nomes conhecidos, como o da cantora e amiga Alcione, que ajudam a contar a história de Luana Muniz, que chegou a ficar conhecida nacionalmente, antes do testemunho do padre, ao aparecer numa reportagem do "Profissão repórter" sobre prostituição. Numa das cenas, ela aparece agredindo um suposto cliente e proferindo a frase que acabaria se transformando num bordão: "Travesti não é bagunça".