Regras para entrada na escola dão nó nas cabeças dos pais no ano de transição para adoção da data única para disciplinar ingressos no ensino de crianças que completam 4 ou 6 anos
O que antes servia apenas para nortear estados e municípios, agora tem força de lei. O Ministério da Educação (MEC) sacramentou, em forma de portaria, a resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) determinando a data de 31 de março como limite para crianças que completam 4 e 6 anos entrarem nos ensinos infantil e fundamental, respectivamente. O país tem a questão uniformizada, mas o corte etário continua causando confusão entre as famílias e escolas. A regulamentação, cujo martelo foi batido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em agosto, muda as regras em Minas Gerais, apesar de a lei em vigor, que determina 30 de junho como referência, ainda não ter sido revogada. Na prática, as mudanças valem apenas para 2020, uma vez que o cadastramento escolar da rede pública foi feito antes da normatização. Em período de matrícula, os estabelecimentos privados ainda aceitarão novos alunos nas normas antigas. E, para evitar prejuízos, quem já está na sala de aula, independentemente da série, segue seu percurso, sem alteração.
No início de agosto, o STF julgou se era da competência ou não do CNE fixar a data de corte para ingresso em todo o Brasil. E concluiu que o conselho tem competência para tal e pode fixar a resolução, que surgiu para nortear a questão no país e, até então, não tinha caráter de lei. A decisão foi tomada em resposta a duas ações conjuntas que tratavam do tema. Uma delas foi ajuizada em 2013 pela Procuradoria-Geral da República e contestava as resoluções 6/2010 e 1/2010, que definiram a data de corte de 31 de março para 4 anos e 6 anos.
A outra, de 2007, foi ajuizada pelo governo do Mato Grosso do Sul, que pedia a declaração de constitucionalidade dos artigos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação com a interpretação de que o ingresso no ensino fundamental está limitado a crianças com 6 anos de idade completos no início do ano letivo. Pela legislação mineira, crianças que completam 4 anos ou 6 anos até 30 de junho entram no ensino infantil (1º período) ou no fundamental, no ano corrente.
Para uniformizar a questão, desta vez, o MEC publicou, em 5 de outubro, a Portaria 1.035, em que o homologa o parecer do CNE e põe fim às diferenças de entendimento país afora. Em caráter de exceção, a lei assegura às crianças que estão matriculadas e frequentando instituições de ensino até a data de publicação da portaria, mesmo que o aniversário seja entre 1º de abril e 30 de junho (data usada em pelo menos outros quatro estados, além de Minas), o prosseguimento sem retenção. Em oito anos, é a terceira vez que a data de corte é alterada em Minas. Em 2010, quando do parecer do CNE, ela mudou de abril para maio. Dois anos depois, a lei mineira estabeleceu novos critérios e, agora, vem a uniformização. Nos casos anteriores, as crianças que já estavam na escola tiveram sua etapa sacrificada, sendo necessário avançá-las ou retê-las.
Também em outubro, a Secretaria de Estado de Educação publicou orientação seguindo a portaria do MEC. No fim do mês passado, foi a vez da Secretaria Municipal de Educação (Smed) entrar na questão. A Resolução 001/2018, do Conselho Municipal de Educação, estabeleceu diretrizes operacionais complementares para a matrícula de crianças na rede pública, considerando 2019 como um período de transição. Assim, as novas matrículas serão consideradas a partir de 2019, para ingresso em 2020.
PREJUÍZO? A analista de sistemas Luciana Leal Ambrósio, de 40 anos, vê ainda com desconfiança as mudanças e teme prejuízos à filha Sarah Ambrósio Lana, de 4. A menina faz aniversário dia 4 de abril e, ao saber por uma amiga das novas regras, no início do segundo semestre, teve medo de ela ficar retida no 1º período, série da educação infantil que cursou neste ano. “Quando soube, foi uma sensação de desalento. Por causa de quatro dias, minha filha seria obrigada a repetir de ano mesmo sendo capaz de acompanhar todas as outras crianças de sua turma perfeitamente”, contou. Luciana pensou em tirar Sarah da atual escola, caso o cenário inicialmente imaginado se confirmasse. “Acredito que para uma criança de 5 anos seja doloroso ver todos seus coleguinhas serem ‘aprovados’ e ela não. Além disso, há a questão financeira envolvida e o fato de a criança estar apta a seguir em frente”, diz.
Mesmo já tendo conversado na escola e tido assegurado que a lei prevê a continuidade do percurso escolar, Luciana ainda tem medo de Sarah ter a matrícula para o 1º ano negada ano que vem para ingresso em 2020. “Nesses casos, acho que é um prejuízo emocional para a criança e financeiro para os pais, sem justificativa plausível, uma vez que ela se encontra perfeitamente adaptada a sua atual condição.”
Rede privada adota a cautela
A rede particular segue a orientação e não vai adotar o 31 de março para alunos que já estão matriculados. O Sindicato das Escolas Particulares de Minas Gerais (Sinep/MG) enviou recomendação a todas as escolas. “A criança que estiver na escola não terá prejuízo algum, independente da faixa etária. As escolas particulares seguem o parecer e estão sendo orientadas a fazer matrícula seguindo o dia 30 de junho. Somente usarão a lei para quem for cursar em 2020. Os que já estão permanecem como tal. Reter essas crianças é péssimo para elas, os pais e a escola. Não funciona.”
O diretor-executivo do Colégio Arnaldo, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, Geraldo Júnio, também aprova a cautela. “Muitas escolas já estavam com processo de admissão em curso quando a portaria foi publicada. A rede privada só vai sentir essa nova realidade daqui uns três anos, quando toda a leva de crianças estiver na faixa do 31 de março. Não é perfil das famílias da escola particular não passar pela educação infantil, logo, ainda teremos muitas crianças estudando que fazem aniversário depois de 31 de março”, diz. Para ele, a decisão de não alterar o percurso escolar de quem já está matriculado é acertada: “Essas crianças já têm experiência escolar, logo, migrar a sala e reter algumas é complicado, porque essa criança vai encontrar um público que chega com o desenvolvimento psicomotor totalmente diferente da turma dela.”