O setor imobiliário brasileiro foi um dos poucos que deram sinais claros de recuperação em 2019. A expectativa é que a construção civil encerrará este ano com crescimento de 2%, o dobro da previsão para a expansão da economia, que gira em torno de 1%.


Especialistas ouvidos pela reportagem estão otimistas. Desde 2013, a construção civil não crescia acima do PIB (Produto Interno Bruto).

Segundo eles, o setor está sendo considerado o motor de crescimento da economia para o próximo ano. A expectativa é que o avanço da construção chegue a 3%.


Pode parecer pouco, mas o mercado imobiliário está em recessão há seis anos. Atualmente, o setor está 30% abaixo do nível máximo verificado no início de 2014.


Mas o otimismo é justificado com o desempenho crescente neste ano.
Em 2019, o setor imobiliário foi responsável pela geração de 10% dos novos postos de trabalho com carteira assinada do país.


Na quarta-feira (19), o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados) divulgou que foram criados 948 mil postos de trabalho com carteira assinada neste ano.


Segundo dados da Cbic (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), a construção civil foi responsável pela criação de cerca de 117 mil novos postos de trabalho neste ano, o que corresponde a 13% de todas as vagas geradas em 2019.


Ainda de acordo com os dados do Caged e da Cbic, no mês de novembro o país tinha 39,4 milhões de pessoas com carteira assinada. Desse total, a construção civil foi responsável por 2,09 milhões. O que significa que representa 5,32% do número total de empregados.


"O número pode parecer pequeno, mas precisamos lembrar que isso vem no primeiro momento em que o setor começa a repor suas atividades", diz Ieda Vasconcelos, economista da Cbic.


A economista destaca que durante os anos de retração quase 1 milhão de postos de trabalho com carteira assinada foram perdidos no setor.


"Em 2019, o setor começa a retomar sua atividades. Claro que é uma recuperação inicial, não é do patamar que foi perdido. Ainda assim, esse incremento de 2% deste ano já foi capaz de fazer essa movimentação no mercado de trabalho. Esse dado sinaliza a importância do setor", afirma Vasconcelos.


Para ela, os dados evidenciam a força da construção na geração de emprego. "É por meio do emprego que é possível ter renda. O crescimento da economia provoca maior crescimento da construção, que provoca maior geração de emprego e renda, que provoca o crescimento da economia. Isso gera um círculo virtuoso", afirma.


Outro fator importante para o crescimento do setor é a Selic (taxa básica de juros) no menor patamar histórico. Os juros a 4,5% ao ano reduziram o custo do crédito imobiliário.
A queda desses juros pode permitir a inclusão de milhares de pessoas no sistema de crédito.


Segundo estudo feito pela Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias), a cada ponto percentual de redução nos juros imobiliários, pelo menos 2,8 milhões de famílias passariam a ter condições de contratar esse tipo de crédito.


Mas não são só os canteiros de obras que justificam a alcunha de locomotiva da economia dada ao setor imobiliário.


Com a taxa Selic e a inflação nos patamares que se encontram atualmente, um investimento de renda fixa ou poupança pode ter taxa de rendimento próxima de zero ou até mesmo negativa. Por isso, os fundos imobiliários passaram a ser produtos mais atrativos.


"Os fundos imobiliários são uma alternativa excelente de investimento, não só para quem investe mas para a economia como um todo e para desenvolver o mercado imobiliário com a injeção de capital", diz Vasconcelos.


Segundo dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais), os fundos imobiliários tinham R$ 105 bilhões em patrimônio líquido em outubro de 2019. É o maior valor no levantamento histórico feito pela entidade. Em dezembro de 2018, por exemplo, o patrimônio líquido dos fundos imobiliários era de R$ 85 bilhões.


"A indústria de fundos imobiliários cresceu muito em 2019. Claramente isso tem a ver com a questão da baixa taxa de juros e com a retomada econômica, que ainda está tímida", afirma Alessandro Vedrossi, sócio-diretor e responsável pela área Imobiliária da Valora Investimentos.


Segundo ele, a retomada da economia faz com que aumente o investimento no setor imobiliário, o que acaba refletindo nos fundos.


"A economia é impactada positivamente a partir do momento em que se tem mais dinheiro nos fundos usados para comprar imóveis, mais dinheiro nos fundos que financiam a construção de novos prédios e mais dinheiro nos fundos que compram créditos imobiliários", diz Vedrossi.


Os imóveis também podem ser usados como garantia para aquisição de empréstimos com juros mais baixos e prazos mais longos, os chamados home equity.


No Brasil, esse tipo de crédito ainda é pouco conhecido e mais oferecido por fintechs. A média desse tipo de empréstimo é que o prazo seja de 15 anos, com taxas de 12% a 13% ao ano ou de 0,99% ao mês.


"Os grandes bancos estão começando a trabalhar com home equity agora, mas ainda de uma forma mais tímida", diz Maria Teresa Fornea, presidente-executiva da Bcredi, fintech focada em crédito com garantia de imóveis.


Ela afirma que a participação desse tipo de crédito ainda é muito pequena no Brasil, de cerca de 10% do PIB. Para ter uma ideia, na Austrália representa 92,15%, nos EUA, 74,84%, e, no Chile, 25,09%.


Fornea afirma ainda que o Brasil tem 71 milhões de imóveis, dos quais cerca de 70% são desalienados, ou seja, potenciais garantias para alavancar créditos.


"O brasileiro está endividado com cheque especial, que é um crédito com qualidade mais baixa, já que é muito caro e tem um prazo muito curto. Por isso, parte da renda fica comprometida para pagar esses juros. Quando é possível conseguir crédito mais vantajoso, essa renda é liberada para movimentar a economia", afirma Fornea.