AGRICULTURA
 

A pandemia do novo coronavírus impactou a agricultura familiar e pode afetar a distribuição de alimentos na América Latina, segundo pesquisa realizada pelo IICA (Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura).

O estudo mostrou que 93% dos agricultores familiares já percebem os efeitos da crise gerada pelo vírus à região.


Entre os aspectos que afetam a atividade produtiva, 53% dos entrevistados apontaram a falta de equipamentos e protocolos de proteção. Segundo 50%, a pandemia também afetou o transporte e a distribuição de alimentos.


Dificuldades como acesso a crédito (49%) e capacidade de armazenamento (43%) também foram citadas.


Para 70% dos entrevistados, a renda dos agricultores familiares diminuiu durante a pandemia. A redução da demanda derrubou os preços dos produtos e o volume de vendas.


A pandemia ainda reduziu a mobilidade e o acesso aos mercados devido às medidas de distanciamento social adotadas.


A maioria dos entrevistados (47%) afirma que, em geral, os preços durante a pandemia permaneceram estáveis. Para 37%, há uma tendência de queda nos valores de produtos vendidos pelos agricultores familiares.


A pesquisa foi feita entre 11 e 22 de maio com 118 pessoas de 29 países da América Latina e Caribe. Entre os entrevistados, estão profissionais ligados a instituições públicas, organizações agrícolas, da academia e do setor privado.


O agricultor José Raimundo de Souza, 63, viu sua renda encolher 70% durante a pandemia. Ele produz hortaliças e mandioca no Distrito Federal e contou que, com o fechamento dos restaurantes, as vendas despencaram.


"Com o delivery, os restaurantes seguram somente cerca de 40% do faturamento. No inverno, sempre temos baixa, mas com a pandemia foi pior", disse Souza.


O agricultor afirmou que a pandemia não afetou a produção, mas inviabilizou a comercialização. "De 300 caixas produzidas [por colheita], se conseguimos vender 100 é muito".


Souza tem quatro hectares de terra plantados e conta com a ajuda dos quatro filhos e noras para a colheita. "As contas continuam chegando, e temos que nos virar."


O fechamento de pontos de venda tradicionais foi indicado por 66% dos entrevistados como o aspecto que mais afeta o suprimento de alimentos em meio à pandemia, seguido pela falta de transporte para os pontos de venda (52%) e pelas condições de manuseio pós-colheita (51%).


De acordo com os consultados, os produtos mais impactados pela Covid-19 (88%) se dividem em cinco grupos: grãos e cereais, vegetais, frutas, tubérculos e carnes.


A pesquisa constatou que os mais afetados são tomate, cebola, repolho e produtos da aquicultura (tratamento de água para criação de peixe e crustáceos para consumo), o que pode reduzir o volume de produção desses alimentos.


Já milho, feijão, cereais, batata e mandioca, na percepção dos agricultores, devem ter o volume de produção mantido ou aumentado.


O estudo tem o objetivo de monitorar a produção agrícola familiar na região e busca identificar se, na opinião dos entrevistados, a pandemia já gera repercussões negativas e quais itens teriam seus volumes de produção reduzidos nos próximos seis meses.


Para cerca de dois terços dos consultados, ainda não há problemas de fornecimento de alimentos importados.


No entanto, alguns itens já começam a faltar dentro de certos países, como máquinas agrícolas e peças de reposição, sementes, grãos e cereais –especialmente milho e arroz–, além de algumas frutas e vegetais.


"Diante de um cenário pós-pandêmico, surge a necessidade de considerar a agricultura como um setor estratégico para a reativação da economia, sendo essencial fortalecer o desempenho dos agricultores familiares e os circuitos curtos de comercialização de alimentos", afirmou o diretor-geral do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura, Manuel Otero.