Pouco mais de dez anos após o lançamento do Nissan Leaf, o primeiro veículo totalmente elétrico do mundo, esse mercado começa a demonstrar sinais de dificuldades, com desaceleração das vendas, custo alto de peças e mão-de-obra, pouca infraestrutura para carregamento da bateria e forte depreciação dos veículos usados. 

Na semana passada, a locadora norte-americana Hertz anunciou que vai substituir cerca de 20 mil carros elétricos de sua frota por modelos movidos a gasolina ao longo de 2024. Já a locadora alemã Sixt revelou em dezembro que não compra veículos da Tesla desde 2022. 

Enquanto isso, outras grandes fabricantes, como General Motors e Ford, foram obrigadas a ajustar seus planos de produção de veículos elétricos, devido a uma redução da taxa de crescimento de vendas. 

Mas afinal, o que explica a crise de um mercado que era considerado pelos especialistas como inovador e promissor, por poluir menos e exigir menos manutenção? Segundo o professor e coordenador dos cursos automotivos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Antônio Jorge Martins, o setor chegou ao momento de avaliação de seus pontos bons e ruins. E os problemas começaram a surgir. 

Um deles é o sistema de bateria, que custa até 45% do valor do veículo, e tem garantia de 8 a 10 anos. E como a bateria fica em locais de impacto, que frequentemente são atingidos nos acidentes de trânsito, as colisões geram altos prejuízos e normalmente provocam perda total do carro. 

“Hoje na Europa, nos Estados Unidos e até na China existe uma quantidade muito grande de carros elétricos usados que estão à venda e não são vendidos”, explica Martins. Muitos desses veículos já perderam a garantia da bateria e não encontram compradores, pois o custo do seguro também sobe bastante, já que qualquer colisão simples pode provocar um dano irreversível.  

A Hertz, ao anunciar a decisão de trocar os veículos elétricos, citou essa questão dos custos de acidentes no comunicado que divulgou ao mercado. “Despesas relacionadas a colisões e danos, principalmente associadas a veículos elétricos, permaneceram altas no trimestre”, registrou a empresa, referindo-se ao 3º trimestre de 2023. Os resultados do 4º trimestre do ano passado serão divulgados no mês que vem. 

“Veículos elétricos são produtos relativamente novos no mercado, por isso ainda não ganharam escala suficiente para fazer com que a produção de peças e a formação de mão-de-obra especializada seja farta e barata. Isso acaba incorrendo na elevação de custo operacional das locadoras, reduzindo suas margens de lucro”, afirma o consultor automotivo Ricardo Bacellar.

Na opinião do especialista, outro motivo também pode ter influenciado a decisão da Hertz. “O fato de serem produtos relativamente novos no mercado também motiva como consequência erros de pilotagem que, além de novamente piorar a experiência do usuário, também podem gerar necessidades de reparos nos produtos e mais custos”. 

Em recente entrevista à Bloomberg, o analista Adam Jonas, do banco Morgan Stanley, destacou que a decisão da Hertz é um sinal claro de que as expectativas sobre os carros elétricos precisam ser redefinidas para baixo em todo o mercado.

Ele ressalta que, embora os consumidores apreciem a experiência de dirigir veículos elétricos e os benefícios econômicos, existem custos "ocultos" na propriedade desses carros.

Estudo confirma manutenção mais cara dos elétricos

O relatório "Plugged-In: EV Collision Insights Q2 2023", divulgado pela Mitchell, indica que, em média, os reparos de colisões em veículos elétricos são mais caros do que em veículos de motores a combustão. Os motivos são a complexidade dos sistemas elétricos, a necessidade de especialização técnica e as peças com preços mais altos. 

Além disso, o conserto de carros elétricos exige 90,75% de peças originais, contra 66,50%, em média, dos veículos movidos a combustíveis. O relatório também aponta que os veículos elétricos tendem a precisar de mais tempo na oficina para reparos, o que também encarece a manutenção.

Ações da Tesla tem o pior início de ano

Depois de um ano de 2023 em que as ações dobraram de valor, a Tesla, uma das principais fabricantes de veículos elétricos do mundo, teve o pior início de ano de sua história em 2024. Os papéis da empresa do bilionário Elon Musk caíram 12% nas duas primeiras semanas deste ano, com perda de US$ 94 bilhões em valor de mercado. 

 Além da mudança de estratégia de mercado de locadoras de veículos, como Hertz e Sixt, que decidiram interromper as compras de veículos elétricos, a gigante do setor enfrenta ainda uma redução dos preços de seus veículos produzidos na China e aumento dos custos trabalhistas. 

Preço do carro elétrico

O carro elétrico mais barato do Brasil é o Caoa Chery iCar, que custa R$ 119.990. Confira aqui uma lista com outros seis modelos à venda abaixo de R$ 250.000.