No Brasil, só nos supermercados, o desperdício gera um prejuízo de R$ 7,1 bilhões por ano

Na América Latina, tem mais comida no lixo do que alimentando pessoas. Segundo dados da FAO Brasil, órgão da ONU para alimentação e agricultura, 28% dos alimentos se perdem no processo de produção agrícola e mais 28% são jogados no lixo após chegarem às casas dos consumidores. Segundo a entidade, no mundo, 1,3 bilhão de toneladas de comida são descartadas por ano, enquanto 795 milhões de pessoas passam fome. Os dados do Brasil sobre as perdas em toda a cadeia de alimentos não estão consolidados, mas, para a FAO, refletem a mesma realidade, já que pelo menos 30% dos alimentos do país são perdidos antes de chegar ao consumidor. Só nos supermercados, o desperdício gera um prejuízo de R$ 7,1 bilhões, cerca de 2% do faturamento líquido do setor, segundo a Associação Brasileira de Supermercados (Abras).

“Os problemas na cadeia de produção envolvem logística, manuseio, armazenagem, mas também a questão cultural, o hábito do consumidor”, diz o vice-presidente do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e professor de Agronegócio da ESPM, Coriolano Xavier. No transporte, a perda no continente é de 17%, e de 22% no manejo e estoque, diz a FAO.

No Brasil, iniciativas para melhorar esse quadro já existem. A ONG Banco de Alimentos atua na grande São Paulo e recolhe, em média, 30 toneladas de alimentos por mês em 50 empresas, como supermercados e atacadistas. A entidade distribui os produtos em 42 instituições e ajuda na alimentação de 22 mil pessoas. “Aproveitamos alimentos que não são comercializados só porque são considerados ‘feios’, mas estão em perfeito estado de consumo”, explica Jessica Lima, nutricionista da ONG. Para ela, o brasileiro não tem o hábito de pensar no desperdício de comida. “Temos no Brasil essa ideia de só comprar frutas e legumes bonitos”, diz. Segundo a FAO, a perda de frutas e hortaliças chega a 55% e de raízes e tubérculos, a 40%.

O combate ao desperdício também tem mudado o hábito de cidadãos comuns. A professora do ensino fundamental Patrícia Resende conta que vai ao sacolão várias vezes por semana para comprar só o necessário. Ela reaproveita todos os alimentos e faz compostagem com as cascas e sementes. “Aproveitamos tudo”, afirma. “Acho que as pessoas ligam o consumo, o ato de encher o porta-malas de sacolas, a uma boa condição social. Isso não tem nada a ver”, afirma. A professora de matemática Tânia Menezes, 50, diz que aproveita tudo o que compra. “Folhas, talos, raízes. Uso cascas de banana e da maioria das frutas e legumes. Congelo, pico, separo. Perco nada”, conta.

Fracionado

Em BH. A rede Super Nosso automatizou a manipulação de carnes e frios para oferecer produtos fracionados. O foco é em “consumidores solteiros e pequenas famílias”, diz o diretor Rodolfo Nejm.

Relação com o consumo pode mudar para além dos alimentos

Para a psicóloga Ludmila Cioffi de Matos, 29, a preocupação com o desperdício vai além dos alimentos. “Fazemos nossos produtos de limpeza, cosméticos, tentamos poluir e consumir o mínimo”, conta. Até os três animais da casa da psicóloga “comem frutas e legumes que estão prestes a estragar”, diz Ludmila, que aproveita todos os alimentos e faz compostagem com cascas e sementes.

A professora de matemática Tânia Menezes, 50, reclama que sacolões e supermercados já colocam os produtos sem folhas e talos, que também são nutritivos. “Você só encontra produtos padrão para comprar”, conta

Prejuízo em Minas é de R$ 694 mi

Em 2017, o prejuízo com perdas de alimentos nos supermercados do Estado foi de 2% do faturamento do setor: R$ 694 milhões. A rede GF Supermercados, que tem 12 unidades em sete cidades do Sul de Minas, também distribui alimentos “feios”, que não vão para as gôndolas, para instituições. “Nós nos certificamos de que o alimento tem a mesma qualidade e acompanhamos a destinação”, diz o gerente de prevenção de perdas da GF, Nilson Júnior.

A rede estuda adotar em 2018 preços diferenciados para produtos “feios”, para incentivar o combate ao desperdício. “São alimentos que certificamos que têm a mesma qualidade, mas que o consumidor, por desconhecimento, não compra”, explica.