Desemprego e queda da renda do trabalhador afetam toda a cadeia produtiva do país
Orçamento menor, endividamento, cortes nas despesas, planos e investimentos adiados. Assim como as famílias brasileiras, as empresas também convivem com as consequências de quatro anos de economia despencando. No Estado, o faturamento industrial em janeiro de 2017 estava no mesmo patamar de janeiro de 2004, um recuo de 13 anos. No fim do ano passado, o PIB da indústria da transformação de Minas Gerais era o mesmo do observado no mesmo período de 2003, 14 anos antes. Já a produção industrial entre 2014 e 2016 teve uma queda de 16%. “É uma retração alarmante”, afirma o superintendente de ambiente de negócios da Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg), Guilherme Leão. No ano passado, a produção subiu 1,2%, um crescimento tímido diante as quedas anteriores, na avaliação de Leão. Os dados apresentados são da Fiemg.
“Faz quatro anos que estamos estagnados. A pior consequência da crise para nós foi não conseguir crescer”, afirma o presidente da incorporadora Sancruza, Evandro Veiga de Lima Júnior. Ele conta que, até 2014, lançava de quatro a seis empreendimentos por ano. “Em 2015 e 2016 não lançamos nenhum, e no ano passado fizemos o lançamento de apenas um”, relata.
Segundo o Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Sinduscon-MG), em abril deste ano o índice de atividade da Construção Civil em Minas ficou estável em relação ao apurado em março, registrando 43 pontos. O resultado revelou queda da atividade, ao permanecer abaixo da linha de 50 pontos (que separa o recuo da expansão), comportamento observado desde novembro de 2012. O índice foi inferior ao de abril de 2017 (47,7 pontos) e ficou abaixo de sua média histórica (44,5 pontos).
Comércio. Nas ruas, as lojas fechadas são um termômetro. Segundo dados da Junta Comercial do Estado (Jucemg), em maio deste ano o saldo positivo de empresas que abriram (1.227) no Estado foi 48,6% menor do que a mesma diferença em maio de 2014 (2.390 novos estabelecimentos). No caso das empresas limitadas, modelo mais comum de pessoa jurídica do país, a diferença é ainda maior. No mês passado, o saldo foi de apenas 240 novas organizações e no mesmo mês de 2014 foi de 1.333, um número 5,5 vezes maior. “O cenário desses quatro anos, que envolveu desemprego, inflação alta e redução de rendimentos, impactou o comércio e toda a cadeia produtiva, porque cai o consumo, cresce a inadimplência, mas os custos continuam. Quem não tinha uma gestão financeira saudável quebrou”, analisa a economista da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL-BH), Ana Paula Bastos.
A economista salienta que a renda do empresário também é afetada. “Para manter os custos da empresa, ele corta na margem de lucro e no pró-labore (remuneração pelo trabalho dos sócios)”, argumenta. Dados do IBGE confirmam. No Estado, a renda média dos empregadores caiu 9,5% nos três primeiros meses de 2018 frente o primeiro trimestre de 2014. Na mesma comparação, o IBGE identificou uma queda de 2.000 profissionais que deixaram de ser empresários. O dirigente lembra que, sem consumo, a ociosidade da indústria sobe. “O consumo é cerca de 70% do PIB nacional”, salienta. Em Minas, entre 2015 e 2017 a utilização da capacidade instalada da indústria acumulou uma queda de 10,7%. “É um quadro circular, que impacta o emprego. A indústria evita demitir, principalmente a mão de obra especializada, mas, quando as máquinas estão paradas, é uma questão de sobrevivência”, explica.
Independência ou morte: país não pode ser refém de commodity
A política econômica do governo precisa ser macro para diminuir a dependência econômica do país das commodities, um dos geradores da crise iniciada em 2014. Essa é a opinião do superintendente de ambiente de negócios da Fiemg, Guilherme Leão. “Ainda somos um país dependente de produtos agrícolas e, na indústria, do setor extrativo e de produtos semielaborados relacionados ao aço. A crise econômica começou com um ciclo econômico de baixa no mundo, ampliada por uma política interna intervencionista”, avalia.
“Não adianta criar linhas de crédito para empresas de tecnologia. O governo deve adotar políticas macroeconômicas que criem um ambiente positivo para o desenvolvimento de outros setores”, diz. Para ele, isso envolve diminuição do Estado, que permitiria uma nova política tributária, uma legislação ambiental mais célere, mais segurança jurídica e investimentos em infraestrutura de logística.
O economista e professor da FGV Istvan Kasznar cita até mudanças na Constituição Federal para que a economia do país se consolide. “A Constituição permite a falta de responsabilidade dos agente públicos. É preciso uma reforma administrativa para rever os privilégios no setor público, outra no sistema bancário, e a tributária”, avalia.
Para o economista e reitor do Centro Universitário Unifor, Reginaldo Nogueira, a solução da crise passa, necessariamente, pelas eleições presidenciais deste ano. “Precisamos de um governo que tenha força política para fazer as mudanças que precisam ser feitas: diminuir a dívida pública e o déficit dos Estados, além de fazer um ajuste tributário”, indica Nogueira.
Investimentos. O reitor lembra que a crise também emperra investimentos que, por sua vez, seguram a formação de novas vagas de emprego qualificado. “Com o dilema político que não se resolve, os investimentos no país estão paralisados, seja oriundos do Estado, seja da iniciativa privada ou do exterior”, conclui Nogueira.