Pelo menos duas gerações não tem a mínima ideia de quem seja ele.  Mas não há um só fato econômico ou político, entre 40 e 80 no Brasil que não contenha a digital do Embaixador Walther Moreira Salles. Não seria exagero dizer que ele é o mais expressivo empresário do século XX, no Brasil. Mas agora não haverá mais desculpas para este “esquecimento” da história. O jornalista Luis Nassif amealhou anos da sua vida colhendo depoimentos, documentos e mais: uma convivência privilegiada de três anos com o fundador do Unibanco, entre muitos outros empreendimentos.

“Walther Moreira Salles – O Banqueiro-Embaixador e a Construção do Brasil”  é o título do calhamaço de 445 páginas que, não fosse o poder de síntese de seu redator, seria necessário um segundo volume. “Através dos olhos de Moreira Salles e seus sócios, o livro descreve a passagem do Brasil do café para as primeiras sociedades informais de capitalistas, a criação do sistema bancário nos anos 30, a saga do petróleo nos anos 40, o rodoviarismo nos anos 50, o mercado de capitais nos anos 60, o nióbio, o papel e celulose”, diz. Depois, o mundo.

 

Abaixo, a primeira entrevista concedida por Luis Nassif.

Quanto tempo, reunindo pesquisa, redação e planejamento para terminar o livro?

Desde 1991. Interrompi duas vezes. Em 1995 e 2002. Mas juntei material nesse tempo todo. Em 2002 retomei, aliás. E interrompi de novo em 2006.

 

Foi uma biografia “encomendada”? Você teve liberdade para escrever o que quisesse?

Não é uma biografia autorizada. Em consideração ao Embaixador passei o copião para os filhos opinarem. Algumas considerações foram aceitas, outras, não.

 

Quais foram os critérios que adotou para a inclusão ou exclusão de fatos?

Exclui muitas narrativas paralelas. E também detalhes dos negócios pós anos 70, que deixaram a leitura muito pesada. E também muito material do arquivo do IMS, importantes para teses acadêmicas mas que tornariam o livro muito grande. Esse material será, aos poucos, divulgado em um site que montei.

 

Como você tratou o assunto do suicídio da esposa do Embaixador? Existe um tabu histórico com relação a isso…

Tratei o suicídio com respeito, inclusive entrevistando amigas que estiveram com ela, na véspera.

 

Fale sobre o período de convivência com o Embaixador. Como se deu o encontro, como ele era? 

A convivência com o dr. Walther foi inesquecível por vários aspectos. Primeiro, pelo seu notável discernimento e capacidade de analisar pessoas, Vargas, Jânio, JK, Lacerda, Brizola, Rockefeller. Depois, por seu olhar contemporâneo. Narrava capítulos relevantes da história do país, analisava personagens centrais desde os anos 30, mas com olhos dos anos 90.  E era um emérito contador de casos, dono de uma ironia fina, do mesmo estilo dos contadores de causos do sul de Minas. Aliás, era um apreciador notável da sabedoria do caipira. Me dizia que caipira era o sujeito que, a partir do seu canto, entendi o mundo. Interessante era sua vocação pública. Em relação aos negócios, apenas mencionava os negócios, mas os detalhes eu precisei pegar com os sócios. Mas os episódios da vida pública dele, me contava em detalhes, reconstituindo cada conversa, cada diálogo.

 

Me cite um exemplo.

Veja a sua ironia fina: quando Marcílio Marques Moreira se tornou Ministro da Fazenda do Collor, o dr. Walther convidou-o para um almoço e parece que ele deu um cano. Na nossa conversa seguinte, ele me narrou um diálogo que teve com Marcilio. Este ligou para ele e lhe disse: Walther, temos uma carreira muito semelhante. Primeiro, embaixador nos EUA, depois Ministro da Fazenda. E ele: tem razão, Marcilio. Falta apenas você fundar um banco.

 

Em qual momento vocês conversaram sobre sua esposa?

Ele teve enorme dificuldade em falar sobre a Elisinha e sobre a mãe. Dois anos depois que começamos, ele ainda não tinha falado sobre ela. Disse-lhe que não seria possível escrever sua biografia sem falar dela. E ele se dizia ainda não preparado para falar.  Até que em uma das conversas, ele desabou. Falou mais de uma hora sobre ela, de sua inteligência, de como foi fundamental para que não se acomodasse a partir dos anos 60, de como educara os filhos. Pelas entrevistas com ele e com amigas de Elisinha, dava para perceber que eram dois apaixonados. Mas a convivência, com o tempo, se tornou impossível.

 

Apaixonados e impossíveis?

Sim. Ele se dizia sem condições de aturar o temperamento dela.

 

Ele respondeu a pergunta que não quer calar: por que ela se jogou do edifício?

Segundo ele, ela tinha desequilíbrios emocionais que não foram diagnosticados na época. E, segundo entrevistas com as amigas, os problemas dela se aprofundaram quando ele consolidou a relação com a Lucia.

 

Como você “temperou” no livro os acontecimentos empresarias com os pessoais?

A primeira parte, que vai até os anos 60, foi mais fácil. Usava como contraponto a vida pública dele, com muitos detalhes, e da vida social de Poços e Rio.  A segunda parte foi mais complicado, porque a maior parte dos negócios foram relatados por terceiros.

 

Pode me contar do Jânio?

Ele e a Elisinha tiveram um almoço com Jânio, no Horto Florestal, mal ele tinha assumido. E foram convidados para um cruzeiro. O mesmo que Jânio tomou, foi logo depois da renúncia.  Tem também episódios que ocorreram na casa do Embaixador, entre Pedroso D’Horta e Lacerda, que serviram de álibi para os ataques de Lacerda contra Jânio. Montei o capitulo de Lacerda ouvindo WMS, Rafael de Almeida Magalhães, José Luiz de Magalhães Lins. Traz revelações interessantes sobre a tática furada da renúncia.

 

Então foi chantagem, mesmo, né?

Foi. Confiava que voltaria nos braços do povo. Recusou até a oferta dos três ministros militares para endurecer com o Congresso.  E, na véspera da renúncia passou um fim de semana no Rio com uma das mais belas atrizes brasileiras. O episódio foi narrado para mim pelo dono do apartamento que se hospedaram.

 

Quem?

Não revelo o nome no livro, por respeito a ela.

 

Qual o título você daria para esta entrevista?

“Histórias de um Construtor de País”

 

Abaixo, o release oficial, distribuído pela Companhia Editora Nacional.

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