Era da internet impulsionou indústria pornô: são 76 milhões de páginas
O fim da publicação da revista “Playboy” no início deste ano encerrou também uma era no consumo de pornografia, que passava essencialmente pelos ensaios impressos. Com a explosão da internet nos anos 90, assim como outros setores, o pornô ganhou uma plataforma como nenhuma outra. O conteúdo erótico deixou de ser o tabu da “revista sob a cama” para se tornar uma mercadoria imediatamente acessível na palma da mão, em qualquer lugar.
No Brasil, 22 milhões de pessoas assumem consumir pornografia – sendo 76% homens e 24% mulheres –, de acordo com um estudo de mercado encomendado pelo canal a cabo Sexy Hot para traçar um perfil desse público. Os números foram vistos com surpresa pelo sexólogo da Clínica Ginecológica do Hospital das Clínicas de São Paulo Théo Lerner.
“Qualquer um com internet hoje tem acesso à pornografia. Também existe uma diferença entre as pessoas que acessam e as que admitem acessar”, afirma Lerner. “Afinal, quem nunca recebeu spams eróticos pelo e-mail ou conteúdo pornográfico em grupos de WhatsApp? Certamente, mesmo aqueles que não desejam acessar”, diz o especialista.
Chineses, japoneses, americanos e sul-coreanos são os que mais consomem conteúdo pornô. No mundo todo cerca de 8% dos e-mails enviados diariamente têm conteúdo sexual, 35% de todos os downloads são pornográficos, e 12% dos sites também – são mais de 76 milhões de páginas. É uma indústria que movimenta quase US$ 100 bilhões por ano no mundo.
Um dos mais populares atualmente é o site Suicide Girls – que também possui uma versão masculina, o Suicide Boys. O site de assinatura que contém fotos eróticas conta com aproximadamente 5.000 modelos no mundo em seu “mix”. O que o diferencia da maioria é o estilo, tido como incomum, das mulheres que o integram: garotas de diferentes etnias e biotipos, tatuadas, com piercing e cabelos coloridos. Para se tornar membro do Suicide Girls, é necessário pagar uma assinatura, mas muitas das modelos acabam divulgando o trabalho também pelo Instagram.
“O Suicide Girls representa o suicídio social, e não literal, como algumas pessoas acham”, explica Tabata, 30, que no site é conhecida como Doce Suicide. “Tomei a decisão de entrar por ter me identificado com o lifestyle. Nesses três anos dentro do site, conquistei meu espaço. Comecei como modelo aspirante, depois me tornei modelo oficial, e agora atuo também como recrutadora e fotógrafa”, explica.
O site paga uma porcentagem para a modelo quando o usuário compra um ensaio. Há uma grande quantidade de meninas tentando entrar, e os ensaios são publicados a cada duas horas. Tabata diz que “não é uma grana que dá pra contar”, mas “de acordo com a dedicação, pode chegar a R$ 5.000” por mês.
Com uma rotina agitada, o dia da Doce Suicide costuma começar às 7h e só termina às 21h. Apesar da aceitação da família, de amigos e do companheiro com quem ela está há oito anos, a suicide girl diz que as modelos do site ainda costumam ser confundidas com prostitutas.
‘YouTube do sexo’: 81 milhões de acessos/dia
O PornHub, uma espécie de “YouTube da pornografia” que permite aos usuários enviar e consumir vídeos eróticos de todo tipo, recebeu 28,5 bilhões de acessos em 2017 – uma média de 81 milhões de acessos diários. Ainda segundo o relatório, 76% do tráfego do site no ano passado se deu por meio de dispositivos móveis, incluindo smartphones e tablets.
Outra opção é o “My New Life”, um jogo pornográfico que vem ocupando lugar de destaque na principal comunidade de compartilhamento de games e quadrinhos eróticos, o F95 Zone. Em um dos principais jogos vistos ali, o “Man of the House”, o jogador assume o papel de um jovem que se muda com a mãe e as irmãs para uma nova cidade, onde deve seduzir as moradoras.
Além deles, recentemente, o Sexy Hot, um dos maiores canais de televisão de conteúdo adulto do Brasil, lançou o “Grupo da Pelada”, no WhatsApp e no Telegram, criado com o objetivo de compartilhar fotos e trechos dos filmes exibidos no canal. Para entrar no grupo, os interessados precisam acessar o site, onde se inscrevem, e afirmar que são maiores de 18 anos. O usuário pode escolher a plataforma que mais lhe agrada para depois ser direcionado para o aplicativo.
Minientrevista
Janine Costa
Assistente financeira
Ex-suicide girl
Como e quando você decidiu ser uma suicide girl?
Quando eu conheci o site, por volta dos 14 anos, me parecia uma proposta tentadora de que ali seria o lugar para jovens que aparentemente não se encaixassem no padrão de beleza estipulado.
Por que você resolveu parar?
A ideia de que era um site que reunia “garotas fora do padrão” já havia caído por terra. “Mas suicide girls é arte, não é como uma ‘Playboy’”, eu pensava. Mas qual seria a diferença, já que, em ambos os casos, havia a figura da mulher sendo trocada por likes e dinheiro? A ideia de usar meu corpo para satisfazer um (no caso, vários) desconhecido e contribuir para a indústria pornográfica, vendendo um sexo imaginário, ia contra o que eu acredito. A pornografia mata mulheres, por que eu deveria contribuir?
Por que você acha que as mulheres entram nesse mundo?
É um caminho com luxos. Há aquele agrado no ego, por ver nossas fotos bombando nas redes sociais, mas isso deixa de ser algo bom quando passa a refletir em outras mulheres. Contribuir com sites como esse é o mesmo que contribuir para a indústria pornográfica. É limitar nossas meninas e mulheres a corpos despidos na frente de uma câmera, sem falar nos constantes casos de assédios de fotógrafos que se aproveitam dessas situações.
