Em diversos condomínios, as lives e os shows foram realizados de maneira impositiva, tendo o síndico e a administração decidido expor centenas de moradores ao risco de contágio pela Covid-19, afrontando, inclusive, normas sanitárias federais e estaduais que proíbem a aglomeração.
O governo federal, em 8.2, publicou a Lei 13.979/2020, que dispõe sobre o estado de emergência, tendo estabelecido no art. 3º as medidas que abrangem o isolamento e a quarentena, tendo como foco evitar agrupamentos partir de 30 pessoas. Isso está repetido nas normas do governo de Minas Gerais, de 22.3 (Deliberação do Comitê Extraordinário Covid-19 nº 17), no art. 6º, que estipulam que os municípios “devem suspender serviços, atividades ou empreendimentos, públicos e privados, com circulação ou potencial aglomeração de pessoas”.
A Constituição Federal, nos artigos 6º e 196, é clara ao proteger o direito à saúde, ao trabalho e à educação, sendo que na mesma linha os artigos 1.277 e 1.336 do Código Civil proíbem o uso nocivo da propriedade. Esse dever de utilizar a moradia de maneira a não perturbar os vizinhos é ressaltado com rigor nos artigos 1.336 e 1.337 CC, que tratam dos condomínios edilícios, sendo aplicável a multa de até dez vezes o valor da quota de condomínio ao possuidor que perturbar o sossego e praticar atos que tornem incompatível a convivência em comum.
A ideia de que o brasileiro é festivo e caloroso não autoriza o síndico a agir como se fosse dono do condomínio, sendo inaceitável ele dar prioridade aos interesses financeiros e de marketing de algumas empresas, como a construtora do empreendimento ou a algum político que deseje se promover perante o grande volume de moradores.
No país ficou consagrada a inviabilidade de se realizarem assembleia nos prédios para evitar riscos à saúde, mas, diante de tal cuidado, não pode o síndico se aproveitar para liberar área de lazer para evento que ninguém poderia aprovar por ser ilegal. Com a montagem de telões, os moradores festeiros convidaram amigos e familiares que lotaram quadra, piscina, além dos elevadores e corredores.
Os inúmeros moradores que estão obrigados a trabalhar em home office ou a estudar online, tendo inclusive que monitorar os filhos para que se adaptem às aulas virtuais, foram afrontados ao protestarem contra a utilização ilegal do condomínio para atividades comerciais. Houve casos de pessoas idosas, enfermas que precisam de sossego para se recuperar, bem como as mulheres grávidas ou com filhos pequenos que não suportam o som altíssimo por diversas horas, serem xingadas por e-mail ou pelo WhatsApp pelo grupo do síndico que viu a pandemia como uma boa oportunidade para festejar. E quem se posicionou para tentar impedir o show para preservar a saúde de sua família foi multado pelo síndico.
Poderá a vítima desse abuso requerer indenização por danos morais e materiais da sentença que declarará a nulidade da multa decorrente da falta de bom senso do síndico.