Microprematuros que consomem leite materno têm níveis significativamente mais altos de metabólitos importantes para o crescimento e a maturação do cérebro, mostrou uma pesquisa do Children’s National Health System, nos Estados Unidos, apresentada no Encontro de 2019 das Sociedades Acadêmicas Pediátricas. Esses bebês, que pesam menos de 1,5kg e nascem antes da 32ª semana gestacional, precisam de cuidados especiais e são internados em unidades de terapia intensiva neonatal até se desenvolverem suficientemente.
No Brasil, um estudo de 2016 da Fundação Oswaldo Cruz revelou que 11,5% das crianças nascem antes da 37ª semana; dessas, 26% são microprematuras. De acordo com os Centros para Controle e Prevenção de Doenças, cerca de 1 em cada 10 partos nos Estados Unidos ocorrem antes do tempo previsto.
O estudo do Children’s National Health System se baseou em imagens radiológicas para investigar o cérebro de pequeninos pacientes que deram entrada na UTI neonatal da instituição de saúde na primeira semana de vida. “Uma pesquisa que realizamos anteriormente mostrou que bebês prematuros vulneráveis, alimentados com leite materno no início da vida, melhoraram o crescimento do cérebro e, consequentemente, o desenvolvimento neurológico. Não estava claro, porém, o que torna a amamentação tão benéfica para o desenvolvimento de cérebros”, conta Catherine Limperopoulos, especialista em ressonância magnética do cérebro infantil.
Ressonância
Ressonância
Para tentar descobrir os mecanismos por trás dessa proteção, os pesquisadores, liderados por Limperopoulos, realizaram um exame não invasivo nos bebês, chamado espectroscopia de ressonância magnética de prótons, que descreve a composição química de estruturas cerebrais específicas. “O exame nos permite medir metabólitos essenciais para o crescimento e responder a essa questão. A espectroscopia de ressonância magnética de prótons pode servir como uma ferramenta adicional importante para avançar nossa compreensão de como a amamentação estimula o desenvolvimento neurológico de bebês prematuros”, acrescenta Limperopoulos.
Segundo a especialista, cada substância química gerada pelo cérebro possui uma “impressão digital” espectral única. A equipe analisou as assinaturas dos principais metabólitos implicados com o desenvolvimento cerebral e calculou a quantidade de cada um deles. Os resultados mostraram, na matéria branca cerebral, níveis significativamente altos de inositol — uma molécula semelhante à glicose — nos bebês alimentados com leite materno, em comparação àqueles que ingeriam fórmulas.
No cerebelo, eles encontraram uma quantidade muito mais elevada de creatinina nos primeiros, em comparação aos segundos. Bebês amamentados pelas mães também exibiram níveis maiores de creatina e colina, um nutriente solúvel em água. Todas essas substâncias estão envolvidas com o desenvolvimento cerebral.
“Os principais níveis de metabólitos aumentam durante os períodos em que o cérebro dos bebês experimenta um crescimento exponencial”, diz Katherine M. Ottolini, primeira autora do estudo. “A creatina facilita a reciclagem de ATP, a moeda energética da célula. Maiores quantidades desse metabólito relaciona-se a mudanças mais rápidas e maior maturação celular. A colina é um marcador da renovação da membrana celular; quando novas células são geradas, vemos os níveis de colina subirem”, esclarece.
Prognósticos
O estudo norte-americano vai ao encontro de um trabalho britânico divulgado no fim do ano passado pela Universidade de Edimburgo. Os pesquisadores também constataram que bebês prematuros demonstraram melhor desenvolvimento cerebral quando receberam leite materno. As 47 crianças incluídas na investigação nasceram antes da 33ª semana de gestação, e os exames de ressonância magnética cerebral foram realizados quando elas atingiram a idade equivalente à de um bebê nascido na época certa — por volta da 40ª semana. Os cientistas coletaram informações de como eles foram amamentados enquanto estavam no tratamento intensivo: leite em pó ou materno (da mãe ou de uma doadora).
As crianças que receberam exclusivamente leite materno, por pelo menos três quartos dos dias que passaram no hospital, apresentaram melhor conectividade cerebral em comparação às outras. Quanto maior o tempo de consumo desse alimento, maiores os efeitos observados. “Esse estudo destacou a necessidade de mais pesquisas para entender o papel da nutrição no início da vida para melhorar os prognósticos, a longo prazo, de bebês prematuros. Mães de prematuros devem receber apoio para fornecer leite materno enquanto seus bebês estiver em cuidados neonatais porque isso pode dar a seus filhos a melhor chance de desenvolvimento cerebral saudável”, comentou James Boardamn, diretor do Laboratório de Pesquisa Jennifer Brown da Universidade de Edimburgo e condutor do estudo.