Depois da violência e dos acidentes de carro, o suicídio é a maior causa de mortes entre jovens brasileiros de 15 a 29 anos, de acordo com o Ministério da Saúde. No mundo, é a segunda maior causa de óbitos nessa faixa etária, segundo a Organização Mundial da Saúde. Mas por que pessoas estão dando fim à vida justamente na fase associada a experimentações, descobertas e prazeres? A resposta pode estar associada ao novo estilo de vida da adolescência e da juventude, a "geração do quarto", que vivencia relações pessoais de forma diferenciada das gerações anteriores.
Embora os jovens possam se comunicar com o mundo inteiro através do celular, o isolamento e a solidão têm sido sentimentos comuns dos que buscam ajuda nos consultórios médicos. “Esses jovens vieram para o século 21 tomados pelo sentimento on-line, um sentimento de quem não se desconecta. É um sentimento horizontalizado, que não se aprofunda. Eles têm relações afetivas de forma efêmera, que se modificam conforme o grupo”, explica o neuropsicólogo Hugo Monteiro Ferreira, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco, criador do termo “geração do quarto”. A denominação foi dada a jovens e adolescentes nascidos a partir da década de 1990, que possuem uma relação intensa com a internet e, ao mesmo tempo, têm dificuldade em ter diálogo com a família.
O especialista explica que jovens isolados nos quartos e no mundo virtual tendem a ter uma autoestima fragilizada. Consequentemente, se tornam vítimas ou praticantes de bullying. “É no quarto que esses jovens comem, recebem os amigos, se divertem, se cortam e muitas vezes se matam. A ausência de diálogo em casa os leva à solidão. Eles vivenciam uma busca desenfreada pelo que está fora, tendo o computador como o amigo”, diz o professor.
Conforto questionável
Para a psicóloga clínica Lívia Pires Guimarães, o número de suicídios cresce porque aumenta a incidência da depressão entre os mais jovens. “As pesquisas colocam como fatores de risco para o suicídio nessa fase a depressão, a solidão, desesperança, agressão por parte dos pais e o consumo de substâncias psicoativas”, explica Lívia.
Para ela, os pais da classe média tendem a acreditar que os filhos estão seguros por estarem matriculados em escolas particulares e confortáveis em seus quartos, mas não compreendem que os jovens precisam de mais estímulos. “Os adolescentes estão sós, desesperançosos. Tudo chega pronto às mãos deles e eles não têm condições de experimentar coisas para se conhecerem melhor, testar competências e habilidades. Assim, ficam apáticos”, detalha.
A psicóloga explica ainda que é preciso oferecer momentos de lazer aos jovens, em vez de dar-lhes apenas entretenimento. “Ir ao shopping é apenas entretenimento. O lazer acontece quando há atividades lúdicas, em que os mais jovens podem interagir, se conhecer e desenvolver habilidades sociais”.
A família em ação
E o que pode ser feito para que o isolamento e a depressão possam ser prevenidos? Para Ferreira, os pais devem se esforçar para ampliar as conexões com os filhos. “Precisamos ouvir e tentar compreendê-los. Podemos fazer algo simples que é viver a amorosidade. Ouvir uma música com o filho, fazer um passeio, partilhar a refeição à mesa, ir aos eventos da escola”, aconselha Ferreira.
Caso sinais de depressão sejam detectados em um jovem, a família deve agir rapidamente e levá-lo a um psiquiatra. Neste momento, é importante deixar de lado os tabus que envolvem o tratamento psiquiátrico. O que é visto muitas vezes pelos pais como “vagabundagem” é, na verdade, um pedido silencioso de ajuda.
“Os familiares sempre percebem que a pessoa não está bem exatamente por conhecê-la melhor. Ao reconhecer tal mudança devem levá-la o mais rapidamente possível ao psiquiatra para uma intervenção precoce. Quanto mais demorar, mais grave o quadro pode se tornar”, orienta Wander Luiz de Lemos, psiquiatra do Hospital Espírita André Luiz.
A soma entre apoio familiar e orientação profissional é decisiva para uma melhora no quadro da depressão. “Ao identificar algum dos principais sintomas, os familiares e amigos podem ajudar a pessoa a buscar uma avaliação psiquiátrica e psicológica com profissionais, que indicarão o melhor tratamento psicoterápico e farmacológico, se este for necessário. Também devem estar presentes para fornecer apoio e acolhimento”, afirma a pesquisadora e professora de Psicologia Herika Sadi.
Segundo ela, os principais sintomas da depressão (chamada pela psiquiatria de depressão maior) são: humor deprimido na maior parte do dia, com diminuição acentuada do interesse ou prazer por coisas e atividades, insônia ou hipersonia, fadiga ou perda de energia. A especialista explica que estes sintomas devem ocorrer em grande parte do dia e todos os dias para caracterizar a doença.
Quem se sente depressivo pode buscar ajuda entre amigos e familiares, além de psiquiatras. O Centro de Valorização da Vida (CVV) é um ótimo canal para quem precisa conversar. Basta ligar 188 (sem custo de ligação) ou acessar o chat pelo www.cvv.org.br.