Em sete anos, 26 repórteres foram mortos no país por motivos relacionados ao exercício da profissão
O Brasil é o segundo país da América Latina com o maior número de jornalistas assassinados entre 2010 e 2017, apontam dados da ONG internacional Repórteres Sem Fronteiras (RSF), divulgados em entrevista coletiva na manhã desta quarta-feira (25), no Rio de Janeiro.
Durante este período, 26 repórteres foram mortos no país por motivos relacionados ao exercício da profissão. O número põe o Brasil atrás apenas do México, com 52 assassinatos de profissionais de imprensa no período. O RSF leva em conta apenas casos em que é possível ligar diretamente o crime com a prática do jornalismo.
Somente entre 2016 e 2017, quatro jornalistas foram mortos no país: Luiz Gustavo Silva, blogueiro morto em Aquiraz (CE) após publicar notícias sobre um assassinato, Maurício Santos Rosa, dono do jornal mineiro O Grito, João Miranda do Carmo, que fazia críticas em seu site ao prefeito de Santo Antônio do Descoberto, nos arredores de Brasília, e João Valdecir Borba, radialista do Paraná.
Além dos crimes de assassinato, a RSF também mostrou preocupação com o número de casos de ameaça e intimidação contra os profissionais. De acordo com a ONG, foram cerca de 99 casos no Brasil no ano passado. No início de Abril, a sede de um jornal no litoral do Paraná foi alvejada por tiros.
A violência contra repórteres colocou o Brasil na 102° posição entre 180 países no ranking mundial que avalia a liberdade de imprensa. Em 2016, ele era o 103º colocado. Além do assassinato e ameaça contra repórteres, o ranking publicado pela ONG anualmente desde 2002 também avalia parâmetros como a concentração da propriedade dos meios de comunicação e as leis que regem o setor.
"A ascensão de uma posição não diz muito, significa que o Brasil está estagnado, não há nada positivo para comentar. A 102º posição não é digna de uma grande democracia como o Brasil", disse Emmanuel Colomblé, diretor da RSF para a América Latina. Para ele, dois motivos ameaçam a liberdade de imprensa no país: a concentração da propriedade dos meios de comunicação e falta de amparo do poder público aos profissionais, que acarreta no aumento dos casos de violência.
"Não existe um mecanismo de proteção ou de investigação exclusivo para casos de ameaça a jornalistas, tampouco há preocupação do poder público para a segurança dele. O discurso sobre a liberdade de imprensa não existe por parte do presidente, do Ministério Público", disse.
De acordo com o RSF, algumas coberturas particularmente complicadas prejudicam a posição do Brasil, como as pautas ligadas a segurança pública e aos direitos humanos nas regiões de periferias ou favelas de grandes cidades.
Outro ponto de preocupação é a reportagem de manifestações, que se tornaram cada vez mais comuns na região desde 2013.
"Além de correrem o risco de agressões por parte da repressão policial, os repórteres passaram a ser fortemente hostilizados pelos próprios manifestantes", afirmou Colomblé. De acordo com ele, há um "crescente ódio contra o jornalista" que é tendência não apenas no Brasil e na América Latina, mas ao redor do mundo.
Polarização eleitoral A ONG caracterizou como "preocupante" a tendência do Brasil de utilizar processos judiciais como forma de censura.
De acordo com dados levantados pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo), das cerca de 3.000 ações judiciais solicitando a retirada de conteúdo entre 2012 e 2017, 60% foram movidas por polícias, tendência que, de acordo com a RSF, tende a piorar em períodos pré-eleitorais, sobretudo no ambiente de polarização e instabilidade vivido no Brasil.
Em 15% dos casos, além de pedir a retirada de postagens, os processos pedem que o jornalista ou escritor se abstenha de publicar informações -o que pode ser caracterizado como censura prévia. "Processos movidos em delitos ditos contra a honra -difamação, calunia e injuria- se tornaram também uma forma recorrente de intimidação à jornalistas", disse Comlomblé. Com informações da Folhapress.