Resgate comove o mundo e expõe agora o drama do estresse pós-traumático
Dezoito dias de sofrimento e, enfim, as 12 crianças tailandesas e seu treinador foram resgatados da caverna onde estavam confinados. Sob cuidados médicos em um hospital, eles estão bem fisicamente. Mas o que será que acontece na cabeça dessas pessoas após uma situação tão extenuante? Segundo especialistas, é provável que eles desenvolvam estresse pós-traumático (TEPT), mas os sintomas não costumam aparecer imediatamente.
“É um tipo de transtorno de ansiedade que acomete pessoas que vivenciam ou presenciam uma situação de alto estresse, que colocam em risco a sua vida ou a sua integridade física”, explica a médica e psicanalista Soraya Hissa de Carvalho. Situações que envolvem desastres naturais, sequestros, agressões físicas ou de abuso sexual são as causas mais comuns.
Segundo ela, os sintomas demoram entre duas semanas e seis meses para se apresentar. “É comum que a pessoa acorde assustada no meio da noite, expresse pequenos sinais de pânico, tenha lembranças recorrentes do fato ou medo de passar perto do local onde o trauma foi vivido”, diz a especialista.
Sinais físicos como insônia, crises de choro, dores de cabeça, baixa imunidade, apatia e irritabilidade também não são descartados. “Em situações como essa da Tailândia, pode haver esses sintomas e o desenvolvimento de fobia de lugares fechados ou quadro de pânico”, afirma Soraya.
No caso das crianças tailandesas, outro agravante é a faixa etária. De acordo com a psicanalista, adolescentes são considerados os mais vulneráveis. “O estresse pós-traumático encontra uma porta escancarada nessa fase da vida porque ela é transitória. Um adolescente ainda não tem sua formação humana sedimentada, como é o caso de um adulto. Seus pilares psicológicos e emocionais estão em construção, por isso ele pode sofrer um abalo muito maior quando impactado”, esclarece Soraya.
Por conta da demora no surgimento dos primeiros sintomas, a psicanalista orienta que o acompanhamento profissional deve começar imediatamente. “Nesses casos, é comum a intervenção medicamentosa para acalmar o quadro de ansiedade ou pânico. Junto, fazemos o acompanhamento psicológico. Se ela consegue voltar ao seu ritmo normal de vida, após 60 dias, o remédio é retirado. E, se dentro de um ano não tem alterações, pode ser considerada curada”, diz Soraya.
Marcas definitivas. Consequências psicológicas e emocionais do TEPT podem custar caro e durar a vida inteira. É o caso da professora mineira Gabriela*, 29. “Sofri abuso sexual até os 11 anos. Tive o estresse pós-traumático e até hoje preciso fazer terapia para tratar a ansiedade desenvolvida depois dessa situação”, afirma a jovem. (nome fictício)
Meditação pode ter ajudado os meninos a suportar situação
A meditação praticada com frequência pelo técnico amador de futebol Ekapol Chantawong, 25 – que foi monge budista por uma década –, pode ter contribuído para que a experiência vivida por seus alunos fosse menos traumática. De acordo com a equipe de resgate, durante o tempo que passaram presos na caverna, ele ensinou os meninos a meditar.
“É muito provável que, no período em que os garotos ainda não haviam sido achados pelas equipes de resgate, eles tenham experimentado vários graus de ansiedade, medo, confusão, vulnerabilidade”, explica a médica e psicanalista Soraya Hissa de Carvalho.
Ela confirma os possíveis benefícios da meditação nesse caso. “Pode ter ajudado os meninos a poupar o máximo de energia possível, já que passaram dias sem se alimentar e sem saber quando seriam resgatados. Além disso, a técnica também deve ter auxiliado a controlar o estado mental e a manter a calma”, afirma.