BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A votação da medida provisória da reestruturação do governo expôs de forma explícita o racha na articulação política da gestão de Jair Bolsonaro (PSL), e colocou novamente em risco a validade da proposta que, entre outros pontos, reduz de 29 para 22 o número de ministérios.

A bancada do PSL na Câmara usou a tensa sessão desta quarta-feira (22) para desautorizar a atuação do ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM).

Com ajuda de siglas como Novo e Podemos, os deputados do partido de Bolsonaro atuaram para derrubar no plenário um acordo construído pelo ministro com os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Horas antes de a medida que define o desenho da Esplanada dos Ministérios começar a ser votada, Lorenzoni se reuniu com Maia e Alcolumbre na presidência do Senado. Na saída do encontro, disse que o Planalto estava atuando para "ajustar" a relação com o Congresso, após uma série de embates.

"Estamos em uma fase de ajuste desta relação. Estamos numa fase de consolidação desta nova forma de se conduzir as relações entre o Executivo e o Legislativo, valorizando o Legislativo."

Onyx fez ali também um gesto de arrefecimento considerado crucial para que a Câmara aprovasse a proposta de reorganização da Esplanada.


"O governo se sente plenamente contemplado porque 95% do texto original está acatado no relatório. O governo compreende que o Parlamento, exercendo seu legítimo direito, irá fazer ajustes de acordo com a divisão ou a capacidade das bancadas", afirmou o chefe da Casa Civil.

Aos chefes do Legislativos e líderes partidários, o ministro disse que Bolsonaro chancelava o entendimento e que o Planalto estava atuando para que não houvesse questionamentos ao texto aprovado em comissão do Congresso -o que, segundo ele, garantia uma votação no plenário da Câmara sem intercorrências.

Ou seja, segundo Onyx, o presidente teria dado "ok" para tirar o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) do guarda-chuva do ministro da Justiça, Sergio Moro, e para o trecho que proíbe que auditores da Receita Federal façam comunicação ao Ministério Público de situações que considerem suspeita.


No plenário, no entanto, em movimento oposto ao do ministro, o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), afirmou que o governo havia saído derrotado na votação sobre a transferência do Coaf para o Ministério da Economia e defendeu derrubar o artigo sobre os auditores para que, segundo disse, "não haja o esvaziamento das competências da Receita Federal".

"Fizemos aqui todo o esforço. Mais de 200 parlamentares de vários partidos votaram a favor, por exemplo, de que o Coaf ficasse junto do Ministério da Justiça. Fomos derrotados, mas essa é a democracia. Marcamos a nossa posição", disse o líder.

Pouco antes, o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros, sinalizou que Vitor Hugo não agia por iniciativa própria. Afirmou a jornalistas no Planalto que o presidente "fortaleceu" o deputado como seu representante na Câmara.

"Há pouco, ele o fortaleceu (Vitor Hugo) na condução da liderança junto à Câmara", disse. A avaliação de caciques do Congresso é a de que a atuação de Vitor Hugo e da bancada do PSL tende a acirrar o clima de tensão entre o Legislativo e o Planalto.

Um dos principais líderes do centrão diz que, ao apelar à pressão das redes sociais e ao discurso de que os deputados trabalham para destruir o "patrimônio" da operação Lava Jato, os correligionários de Bolsonaro e seus aliados podem ter colocado em risco não só a votação da medida provisória, mas também outras pautas consideradas fundamentais pelo governo.


Em tom de ironia, integrantes do grupo defendem que, a partir de agora, o Congresso deve dar ao PSL "o protagonismo que o partido tanto pleiteia" para conduzir as propostas de Bolsonaro.

Até o início da manhã desta quinta (23), parlamentares diziam não ter certeza se seria possível retomar a votação da proposta de reestruturação do governo. "Tudo vai depender do quorum", afirmou um líder partidário.