Jair Bolsonaro segue hoje para Suíça em sua primeira viagem internacional
para estrear diante da elite financeira global
Brasília – O presidente Jair Bolsonaro embarca hoje, às 22h, para Davos, na Suíça, onde participará do Fórum Econômico Mundial. Rumo à primeira viagem internacional para encontrar a elite financeira global, Bolsonaro deixa o país no meio de uma crise política que pode contaminar a imagem no início de gestão. Parlamentares eleitos do partido dele, o PSL, protagonizam um racha interno na sigla porque alguns colegas viajaram a convite para a China e colocam em xeque a governabilidade de Bolsonaro junto ao Congresso. Além disso, um de seus filhos, o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), tem as contas vasculhadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Diante dessas polêmicas, o governo traça estratégias para conter a ferida — ao menos até a volta do presidente, prevista para quinta-feira, sem horário definido.
A fim de evitar que a turbulência ao redor de Bolsonaro não interfira no curso da administração do governo, o primeiro escalão do Planalto começou a colocar medidas em prática para tentar blindar a nova gestão do país. A equipe ministerial foi orientada a não falar sobre o caso em público, com o objetivo de reforçar o viés que aliados do presidente querem dar à situação: uma questão particular de Flávio, e não de Bolsonaro. Pessoas próximas ao presidente falaram que, neste momento, a tendência é ressaltar, sempre que possível, a independência entre os assuntos e as esferas públicas, deixando Bolsonaro de fora do cenário conturbado. Ontem pela manhã, o senador eleito esteve no Palácio da Alvorada para conversar com o pai. O conteúdo da reunião não foi divulgado pelo governo.
No entanto, a melhor maneira para conduzir o governo em momentos de crise ainda não é um consenso nem mesmo dentro do Planalto. Isso porque há também outra parte da equipe do presidente que, com medo de os escândalos afetarem a aprovação popular ainda no início da gestão, acreditam que Flávio deveria conceder mais entrevistas à imprensa e dar explicações sobre o episódio. Na sexta-feira, o senador eleito, que foi alvo novamente de um relatório do Coaf, falou à TV Record e negou todas as acusações, inclusive, de usufruir do foro privilegiado – benefício criticado por ele, pelos irmãos e pelo pai durante toda campanha eleitoral, como uma ferramenta da “velha política” para conseguir reverter situações na Justiça.
Para a advogada e constitucionalista Vera Chemim, o recurso do filho do presidente no Supremo Tribunal Federal (STF), que alegou foro privilegiado, “pareceu ingênuo”. “Ele foi apenas citado, não investigado. A partir do momento em que ele faz isso, ele passa a chamar para si a responsabilidade”, explicou. Já o cientista político e vice-presidente da Arko Advice, Cristiano Noronha, entende que o Planalto terá de dar explicações, mas não acredita que o fato possa se transformar em uma crise na nova administração. “O presidente não é investigado, é uma pessoa bem próxima da família, mas não é o Jair diretamente. Eu ainda não vejo que há essa capacidade de contágio, mas é preciso responder perante a sociedade”, explicou.
A decisão de integrantes do governo de tentar desvincular Bolsonaro das suspeitas de lavagem de dinheiro que rodeiam o filho foi confirmada também por um militar próximo à cúpula do Planalto. No entanto, ele teme que o caso esteja apenas “começando”, já que, segundo a fonte, “tem tudo para aumentar”. “Evidentemente, o governo tem a obrigação de tentar desvincular, mas será muito difícil. É batom na cueca”, declarou.
De acordo com o militar, o discurso anticorrupção utilizado pela família Bolsonaro durante a campanha eleitoral, tende a dar uma proporção maior ao fato. Assim, o “despreparo” do filho pode chegar às portas do Planalto. “É inconcebível você pedir para os funcionários depositarem na sua conta. Não tem saída, ele vai dizer o quê? Ele deixou o rastro”, criticou. Até então cotado para ser um dos interlocutores do Executivo no Senado, Flávio deve começar o mandato, em fevereiro, com as pretensões comprometidas. “Tudo que a oposição quer é isso. É um presente a eles”, disse.
O futuro líder do PSL na Câmara, o deputado Delegado Waldir (GO), minimizou a polêmica e avaliou que “não há crise alguma”, sobretudo, porque o foco das duas questões não é o presidente diretamente, mas quem está ao seu redor. “Não é um assunto de governo, é um assunto do PSL. Não é um assunto do Bolsonaro, mas do filho dele. Talvez, porque esses assuntos ainda sejam recentes, têm ganho maior repercussão. Por isso, acredito que tentam enfraquecer o governo, mas não é possível. Tudo o que está acontecendo vai nos fortalecer e vamos tomar vacina contra isso”, complementou. O delegado afirmou que o diálogo entre os parlamentares da sigla se intensificam para manter uma ordem e dar apoio às pautas do governo — mesmo que alguns correligionários novatos demonstrem resistência neste início de mandato.
RISCO DE GUERRA
Os ataques do filósofo e guru de Bolsonaro, Olavo de Carvalho, e de seus apoiadores a um grupo de parlamentares do PSL que viajou à China seguem repercutindo dentro do partido. Acusados de querer “vender o Brasil para a China” e de serem “comunistas infiltrados na direita”, os 11 congressistas em primeiro mandato cobram uma reação do presidente Jair Bolsonaro em defesa deles. O que está em jogo é o apoio às pautas governistas no Congresso, sobretudo da reforma da Previdência — um dos projetos prioritários da nova gestão.
Um dos integrantes da comitiva, formada por seis parlamentares, o advogado Cleber Teixeira, futuro chefe de gabinete do deputado eleito Alexandre Frota (PSL-SP), disse que o clima entre os deputados era de revolta e indignação, de acordo com informações da revista Piauí. “Durante anos eles combateram o PT e a esquerda pelos crimes que cometeram”, disse.
“Imagina se estes parlamentares decidirem não votar com o governo?”, questionou ele. “Porque os parlamentares votam nas propostas de um governo em que confiam. Eles foram eleitos com a bandeira da transparência e agora o Flávio não quer que o investiguem? Não é obstruindo uma investigação que ele vai provar sua inocência”, disse, sobre a caso envolvendo um dos filhos do presidente, que tiveram registradas pela Coaf movimentações atípicas na conta dele. “Não estou dizendo que ele seja culpado. Pelo contrário. Mas quem não deve, não teme”, acrescentou.