TRAGÉDIA DE BRUMADINHO

Governo de Minas Gerais e Assembleia Legislativa encerraram, nesta terça-feira (6/7), impasse de duas semanas que travava a votação de projeto de lei sobre a destinação de R$ 11 bilhões dos R$ 37,68 bilhões pagos pela Vale por causa da tragédia de Brumadinho. Deputados estaduais desejavam repassar, via transferência direta, R$ 1,5 bilhão da indenização aos 853 municípios mineiros, dividindo a quantia conforme critérios populacionais. O Executivo, por seu turno, queria a assinatura de convênios para regular os envios. 


Prevaleceu a ideia dos parlamentares, em acordo firmado pelos poderes. O presidente da Assembleia Legislativa, Agostinho Patrus (PV), celebra o consenso.


A transferência direta foi defendida por deputados como método que acelera a chegada dos recursos aos cidadãos. Ao Estado de Minas, Patrus ressalta a importância da ajuda às cidades em tempos de COVID-19.

“Será transferência especial, diretamente aos municípios, da forma como foi estabelecido pela Assembleia: por habitante. É a forma mais democrática. Ele (o repasse) será feito sem burocracia e a necessidade de papelada ou de o prefeito se deslocar do interior (para BH)”, diz.

Os R$ 11 bilhões analisados pelo Legislativo vão entrar no orçamento estadual como crédito extraordinário. Por isso, o aval dos deputados é necessário.

A gestão de Romeu Zema (Novo) prevê utilizar o dinheiro em obras como o Rodoanel da Região Metropolitana de Belo Horizonte. A conclusão de hospitais regionais e intervenções em estradas interior afora também estão previstas.

O socorro aos municípios foi sugerido pelos deputados. Órgãos de controle, como o Tribunal de Contas de Minas Gerais (TCE-MG), vão fiscalizar os gastos.
O acordo da gestão estadual com a Vale, firmado em fevereiro, teve chancela judicial. Nessa segunda-feira (5/7), Zema se reuniu com representantes de entidades como o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a Defensoria Pública Estadual, que participaram das negociações com a mineradora.

Depois da rodada de conversas, Patrus foi procurado para auxiliar nas tratativas. Nesta terça, então, reunião na sede do Legislativo deu “sinal verde” às transferências diretas.

A Secretária de Estado de Planejamento e Gestão, Luisa Barreto, foi uma das presentes ao encontro.

“Estamos pegando R$ 1,5 bilhão e dividindo por quase 22 milhões de habitantes. Cada cidadão mineiro vai receber um pouquinho desse dinheiro que nos causa até tristeza. É o recurso da morte de 272 pessoas. Temos sempre que nos lembrar disso”, ressalta o presidente do Legislativo.

Apresentação de PEC

Em meio ao embaraço, deputados chegaram a apresentar Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para permitir que recursos extraordinários que entrassem nos cofres públicos pudessem ser distribuídos por transferências especiais. A ideia era, justamente, destravar a ratificação do acordo e permitir o apoio aos municípios.


A alteração à lei máxima do Estado, aprovada em primeiro turno nesta terça, deixou descontentes deputados estaduais do Novo. Guilherme da Cunha, por exemplo, chegou a citar postagens de cidadãos que associaram a rapidez na tramitação da PEC – apresentada na semana passada – a supostos interesses eleitorais de Patrus.

“Aqueles antigos defensores do enfrentamento – que criaram, em sua trajetória, a linha do enfrentamento – são uma minoria tão irrisória que não merecem nosso comentário”, rebate o filiado ao PV.

O texto sobre o acordo com a Vale depende de aval da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária (FFO) para estar pronto para a votação em plenário, em turno único.

Amanhã, o colégio de líderes da Assembleia vai se reunir para acertar as bases do retorno da tramitação. O EM apurou que a expectativa é que o destino dos R$ 11 bilhões seja analisado pelos 77 deputados na quarta-feira da semana que vem (14/7), antes do recesso de meio de ano.

A PEC das transferências diretas, por seu turno, deve ser analisada em segundo turno na segunda (13/7). A promulgação ocorrerá um dia depois.

Os repasses aos municípios passarão a constar no acordo judicial com a Vale por meio de ata da reunião desta terça-feira. O documento vai detalhar a decisão tomada no encontro.


Minientrevista: Agostinho Patrus (PV), presidente da Assembleia de MG

 

Como foi a construção para acordar a transferência direta de R$ 1,5 bilhão aos municípios?

Vimos, ontem, que o governo tentou entendimento junto aos compromitentes. No final do dia, como não havia acordo, fui procurado para que pudesse fazer uma reunião, não só com o governo do estado, mas com os compromitentes, para buscar um entendimento. O que a Assembleia está dizendo é que seja uma transferência especial, mas que tenha os devidos controles, como é a preocupação do Ministério Público Federal (MPF) e do Ministério Público Estadual (MPMG). Vamos colocar na lei, por sugestão do MPF e do MPMG, aqueles itens em que os recursos não podem ser utilizados, para que nenhum prefeito tenha dúvida sobre a alocação desses recursos. Vamos, também, trazer algumas sugestões dentro do que já foi dito, de que só pode ser gasto o que está sendo citado no acordo com a Vale. Os prefeitos vão informar a conta (para depósito), que vai ser específica. O Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) vai atuar como órgão acessório da Assembleia na fiscalização. O MPMG e o MPF também terão a sua atuação, como em qualquer recurso público. Será transferência especial, que acontecerá diretamente aos municípios, da forma como foi estabelecido pela Assembleia: por habitante. Ou seja: cada habitante mineiro vai receber determinado valor, que é a forma mais democrática. Ele será feito sem burocracia e a necessidade de papelada ou de o prefeito se deslocar do interior.


Originalmente, a transferência de recursos aos municípios não constava no acordo com a Vale. Por que repassar parte da verba às 853 cidades?

Estamos pegando R$ 1,5 bilhão e dividindo por quase 22 milhões de habitantes. Cada cidadão mineiro vai receber um pouquinho desse dinheiro que nos causa até tristeza. É o recurso da morte de 272 pessoas. Temos sempre que nos lembrar disso. A Assembleia aprovou projeto em que em cada uma das obras e intervenções tem que constar que o recurso foi conseguido por meio do acordo com a Vale e o nome de todas as vítimas. Não podemos esquecer que esse recurso veio de um crime; de algo que matou pessoas, trouxe destruição e tantos problemas a Minas Gerais.

Nesta terça-feira, durante o primeiro turno da PEC sobre transferências especiais, deputados do Novo questionaram o tempo para a votação do acordo com a Vale. Como fica a relação com a base do governador?

Não é relação com a base. É relação com o partido Novo. Dois deputados (Guilherme da Cunha e Laura Serrano) se pronunciaram (contra a PEC). A votação foi 70 a 3 (com um voto em branco), o que demonstra que, majoritariamente, a Assembleia caminha em um sentido. Aqueles antigos defensores do enfrentamento – que criaram, em sua trajetória, a linha do enfrentamento – são uma minoria tão irrisória que não merecem nosso comentário.