"Acho que o presidente foi bem intencionado. Eu até mandei uma mensagem para ele: 'ó, presidente, muito obrigado pela lembrança e tal'. Acho que o presidente quis colocar isso para me fortalecer por conta até dos episódios havidos lá em relação ao Coaf", disse Moro em entrevista à GloboNews.
Na semana passada, numa derrota para Moro e o governo, a comissão mista que analisa a reforma administrativa de Bolsonaro decidiu deslocar o Coaf do Ministério da Justiça para a de Economia. Essa proposta ainda terá de passar pelos plenários da Câmara e do Senado.
Para Moro, a fala de Bolsonaro não atrapalha o trabalho desenvolvido por ele no ministério porque não assumiu o ministério tendo colocado como condição uma ida futura para o STF. A próxima vaga a ser aberta no Supremo só deve ocorrer no próximo ano, com a aposentadoria compulsória do decano Celso de Mello.
"Não existe vaga no momento, surgindo a vaga se o meu nome for lembrado 'puxa, ótimo!', se o presidente manter o convite e ele fizer o convite eu vou avaliar se aceito ou não, claro que isso é uma grande honra, mas isso vai acontecer no momento oportuno. Não existe vaga no momento", disse.
Moro —que ficou conhecido por ser o principal juiz da operação Lava Jato— disse que seu foco é fazer um bom trabalho à frente do ministério, com a busca de redução de assassinatos e melhoria no combate à corrupção e ao crime organizado. Ele destacou que mantém seu compromisso de não disputar futuramente cargos eletivos.
O ministro afirmou que não interpreta como uma "retaliação" de parlamentares a decisão de retirar o Coaf do seu ministério, mas admitiu haver um "estereótipo" em relação ao seu papel como titular do primeiro escalão do governo em decorrência de sua atuação como magistrado.
"Existe algo negativo em Brasília, um pouco de estereótipo quanto à minha posição dentro do ministério", disse, acrescentando que às vezes há teorias da conspiração como se o ministro estivesse manipulando investigações sobre determinadas pessoas. "Isso não existe", afirmou, ao destacar que não há "marionetes".
"O papel do ministro da Justiça não é de um supertira, é um papel estrutural", completou.
O ministro disse que o Coaf na Justiça seria melhor porque na Economia ele "tende a ser negligenciado" uma vez que a pasta econômica tem outros focos de preocupações. Moro disse ter iniciado um trabalho de tornar o Coaf —um órgão que faz análise de movimentações financeiras atípicas e que poderiam conter indícios de lavagem de dinheiro— mais forte e funcional, com o aumento de servidores.
Ele reconheceu que "aparentemente" não foi bem sucedido em convencer todos os parlamentares a manter o Coaf na Justiça.
Moro disse também que trabalha para convencer os parlamentares da necessidade de se aprovar o pacote anticrime encaminhado pelo governo ao Congresso em fevereiro, que patina na tramitação. Ele disse que não controla a pauta do Legislativo e que vai lamentar se não conseguir aprovar o pacote, mas disse ainda ter "cartas na manga" para desenvolver o trabalho.
"A agenda do Ministério da Justiça e Segurança Pública não depende exclusivamente do pacote. Claro que, se nós o aprovarmos, poderemos fazer melhor porque daremos instrumentos para a polícia, a Justiça contra corrupção, organização criminosa e crimes violentos", disse. "Eu consigo fazer a minha agenda independentemente dele."
PROTESTOS
Sobre as manifestações que tomaram ruas no país na quarta-feira, o ministro avaliou que, em algumas circunstâncias, houve "manipulação político-partidária". Segundo ele, em vez de questionarem apenas o bloqueio de verbas do Ministério da Educação para as universidades públicas, houve atuação de dirigentes partidários de oposição e gritos de "Lula Livre".
O ministro evitou comentar as declarações de Bolsonaro que chamou os protestantes de "idiotas úteis". Ele também se esquivou de falar sobre a situação do filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que teve seus sigilos bancário e fiscal quebrado pela Justiça do Rio de Janeiro.
"Não cuido de casos concretos específicos. Não sou advogado de ninguém. Não me cabe ficar respondendo questões desse tipo", disse.
O ministro também comentou sobre o decreto que ampliou as possibilidades para o porte de armas editado na semana passada por Bolsonaro. Segundo ele, se houver alguma ilegalidade o STF ou o Congresso vão tomar uma decisão. Moro disse que o texto foi elaborado pelo Palácio do Planalto e contou com contribuições da pasta da Justiça.
Na entrevista, Moro afirmou que o próprio presidente disse que o decreto não é uma política de segurança pública, mas atende a uma promessa de campanha dele. Ele disse que Bolsonaro tem se mostrado "muito zeloso" e não apresentaria uma norma como essa sem considerar que ela fosse legal.
Por Ricardo Brito