Ouça a matériaA-normalA+O ministro Flávio Dino apresentou “pedido de destaque” e interrompeu o julgamento da petição apresentada pelo governo de Minas Gerais pedindo a prorrogação da suspensão de pagamento das dívidas do Estado com a União, que já chega a R$ 165 bilhões. Desta forma o julgamento vai recomeçar no plenário físico, mas ainda não há prazo para que seja pautado novamente.

Por enquanto, segue valendo a liminar do ministro Nunes Marques que prorrogou, até 20 de julho, o prazo para a retomada do pagamento da dívida pública de Minas Gerais com a União. Após encerrado este prazo, o governo de Minas pode ser obrigado a voltar a fazer o pagamento integral da dívida.

A alternativa seria aceitar as regras atuais do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que permite renegociar as dívidas, mas com contrapartidas consideradas muito altas pelo governo e parlamentares mineiros. Como os deputados estaduais ainda não aprovaram a adesão ao RRF, o governo de Minas não teve acesso a melhores condições de pagamento. 

Prorrogação

Na quarta-feira (08/05), o governo mineiro pediu que o STF retirasse o julgamento de pauta a ação da União cobrando o pagamento da dívida de R$ 165 bilhões. Pelo documento, em troca, Minas Gerais começará em julho a pagar mensalmente parcelas de R$ 320 milhões, "como se homologado o Regime de Recuperação Fiscal (RRF)", afirma o governador, na petição. 

A intenção é ganhar tempo para que as negociações para uma proposta alternativa ao RRF, que tem sido encabeçada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, avance junto ao governo federal.

Contudo, após manifestação contrária da Advocacia-Geral da União (AGU), o ministro Nunes Marques resolveu dar continuidade ao julgamento que vai decidir se prolonga ou não a suspensão das dívidas de Minas. 

Até as 15h da sexta-feira, três magistrados já haviam anunciado seus respectivos votos. Nunes Marques defendeu que seja mantido o prazo de 90 dias para a retomada da quitação das parcelas da dívida, que já supera os R$ 170 bilhões. Em seu argumento, o relator afirmou que “o prazo de 180 (cento e oitenta) dias poderia retirar o senso de urgência que o assunto merece, tendo em conta as inúmeras prioridades com que os governos federal e estadual têm de lidar. A metade desse intervalo – 90 (noventa) dias – parece mais ajustada, considerando, inclusive, a possibilidade de fechamento deste primeiro semestre do ano fiscal com alguns consensos (ainda que parciais) alcançados entre a União e o Estado de Minas Gerais”, declarou ao proferir o voto. 

Os ministros Alexandre de Moraes e Cristiano Zanin concordaram com os argumentos do relator e votaram para que Minas recomece o pagamento das dívidas após 20 de julho. 

Porém, com o pedido apresentado por Flávio Dino, neste domingo, a votação será zerada e aberta para debate no plenário físico da corte.

O governo de Minas Gerais informou que não comenta assuntos que "em respeito aos ritos forenses e à divisão dos Poderes, o Governo de Minas não comenta ações judiciais e informa que, quando intimado, se pronunciará nos autos dos processos".

Dívidas de Minas

A dívida de Minas Gerais com a União foi renegociada em 1998, com um valor de R$ 14 bilhões. Porém, mesmo com o pagamento de parcelas ao longo das décadas seguintes, o valor continuou a subir. 

As dificuldades em honrar os compromissos se agravaram em 2018, no governo de Fernando Pimentel (PT), que resultou em atrasos nos repasses a municípios e no pagamento do salário de servidores. Na época, o governo petista acionou o judiciário para suspender o pagamento das dívidas.

Em 2019, já no governo Romeu Zema (Novo), veio a decisão que dispensou o governo de Minas a fazer pagamentos da dívida enquanto os deputados estaduais analisavam a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), proposta criada pelo governo para possibilitar aos estados mais endividados buscar saídas para recuperar as contas.

Desde então, em 2019, o governo mineiro não pagou nenhuma parcela dos juros da dívida, o que resultou em um crescimento rápido e faz com que os débitos alcancem, hoje, cerca de R$ 165 bilhões. 

Contudo, o RRF não avançou na Assembleia Legislativa. Os deputados estaduais avaliam que a proposta não resolve o problema da dívida mineira e ainda coloca o governo estadual subordinado à gestão federal. 

A questão abriu uma batalha entre Zema e o Legislativo estadual durante o primeiro mandato do governador. Sob liderança do ex-deputado Agostinho Patrus, hoje conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE), o RRF ficou parado na Assembleia enquanto o governo do Estado buscava a justiça para tentar alternativas de adesão ao RRF.

Em uma dessas tentativas de envolver o judiciário na questão, o governo Zema conseguiu a prorrogação da liminar que suspendia o pagamento da dívida até dezembro de 2023. O prazo acabou e sem uma solução para a questão. 

Novamente o judiciário foi acionado e prorrogou novamente o prazo. Porém, desta vez diminuiu o prazo da suspensão da dívida, para meados de abril. 

A partir daí, o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, deputado Tadeu Martins Leite (MDB), acionou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, senador por Minas Gerais, para mediar uma solução junto ao governo federal. Desde então, Pacheco, junto com o ministro Fernando Haddad, tem tentado achar um meio termo que possibilite Minas Gerais pagar suas dívidas sem inviabilizar a gestão estadual. 

O governo federal chegou a apresentar uma alternativa, que vinculava a redução da dívida a investimentos em educação profissional. Porém, a proposta foi considerada insuficiente pelos governos estaduais e por Rodrigo Pacheco e uma nova rodada de conversas foi iniciada.

Para permitir as negociações, o judiciário resolveu prorrogar mais uma vez o prazo, até 20 de julho, para que Minas Gerais faça adesão ao RRF ou volte a pagar suas dívidas com a União.

Nesta semana o governo mineiro solicitou uma prorrogação maior, com mais 90 dias, e argumentou que poderia voltar a pagar os juros da dívida, nas mesmas condições de adesão ao RRF.

Porém, após posicionamento contrário da AGU, que quer pressionar o governo de Minas a arcar com seus compromissos, o STF preferiu manter o prazo final para julho. O pedido de Flávio Dino, no entanto, recoloca toda a questão na indefinição.