Brasília - Em entrevista a Ricardo Kotscho, membro do Jornalistas pela Democracia, publicada na Folha de S. Paulo neste sábado (3),  o advogado criminalista José Carlos Dias, ex-ministro da Justiça de FHC, diz que "a democracia corre risco" e que o atual ministro da Justiça, Sergio Moro, "enganou muita gente".

 
Dias conta que votou em Fernando Haddad no segundo turno das eleições de 2018 para tentar evitar Jair Bolsonaro - "só o Bolsonaro era capaz de me fazer votar no PT" - e que, naquele momento, ficou explícito para ele o clima de intolerância espalhado pelo país.

"Eu fui junto com outros agentes do direito entregar um manifesto de apoio ao Haddad e, ao sair do hotel para pegar um táxi, passou um carro com duas mulheres que começaram a me insultar, me chamaram de 'comunista e filho da puta'. Não posso imaginar agora como podemos continuar divididos quando nós estamos lutando contra um inimigo comum", disse.

Co-fundador da Comissão Arns Contra a Violência, criada em março de 2019, que conta com entidades como CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), ABI (Associação Brasileira de Imprensa) e OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Dias acredita que "a democracia corre risco de termos de novo a ditadura, agora pelo voto. Porque nós temos como presidente uma pessoa absolutamente desequilibrada. Tenho muito receio de um retrocesso nas conquistas democráticas que tivemos nos últimos 30 e tantos anos. A sociedade civil hoje tem pulmões que a fazem respirar, e a Comissão Arns pretende ser um desses pulmões", afirmou.

Sobre as revelações feitas pelo site The Intercept Brasil, o jurista acha "inacreditável imaginar-se que um juiz e um procurador fiquem trocando figurinhas e preparando as jogadas para condenar alguém, para forjar provas. Eu estou absolutamente decepcionado com o Supremo Tribunal Federal. Esse último gesto do Toffoli, envolvendo a pessoa do filho do presidente. É inimaginável que ele monocraticamente impeça o progresso das investigações e ainda por cima marque para novembro o julgamento pelo plenário", disse.

Perguntado sobre a falta de reação da sociedade civil e o apoio à Lava Jato, que continua forte, Dias aponta que "a sociedade foi induzida em erro, imaginando que a Lava Jato fosse imparcial, fazendo investigações em todos os campos. Hoje, aberta a barriga, o que se vê é a manipulação entre Ministério Público e magistratura. O Moro enganou muita gente. Deu a impressão de que era um juiz independente e, agora, feita essa laparotomia exploratória, o que se vê é que os intestinos estão misturados de tal forma que não existe a preservação da independência. É um grande desaponto."

Em relação aos primeiros seis meses do governo Bolsonaro, o ex-ministro de FHC é contundente: "tenho um sentimento de medo, indignação e tristeza".