O discurso de Lula feito hoje, na COP 27, foi um discurso de verdadeiro estadista. 

Não apenas reverteu a péssima imagem do Brasil na questão ambiental, mas, sobretudo, recolocou o país como ator central e responsável na ordem mundial. 

Um ator que se empenhará na criação de uma nova governança global, assentada na paz, no multilateralismo e na multipolaridade Uma nova governança global dedicada a eliminar a fome e a pobreza, a reduzir as desigualdades e a combater as agressões ao meio ambiente e às mudanças climáticas. 
 
Essa nova governança global, para bem funcionar, exigirá a tão postergada reforma do Conselho de Segurança da ONU, o qual precisa refletir as profundas transformações mundiais ocorridas desde o fim da Segunda Guerra Mundial. 

É imperativo que o novo mundo que foi criado, muito diferente da conformação geopolítica do imediato pós-guerra, encontre canais amplos de negociação e de tomada de decisões. 

 
No campo ambiental, as ações urgentes que precisam ser implantadas e os acordos que têm de sair do papel necessitarão desses canais para que o mundo possa agir e avançar celeremente na luta contra as mudanças climáticas. 

No campo regional, Lula destacou a necessidade de articular os países da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (Brasil, Colômbia, Peru, Bolívia, Equador, Venezuela, Suriname e Guiana) para promover uma gestão responsável da floresta e de sua riquíssima biodiversidade. 

Essa iniciativa, combinada com a chamada “OPEP das Florestas”, que agregará Brasil, Congo e Indonésia, e com a meta de desmatamento zero na Amazônia, poderá ser um passo fundamental e decisivo para salvar o planeta e a Humanidade. 

 
É, sem dúvida, uma mudança de paradigma.

Além disso, Lula lançou a proposta de uma Aliança Mundial pela Segurança Alimentar, destacando que a agricultara regenerativa pode perfeitamente conciliar a eliminação da fome com a preservação ambiental.

A criação do Ministério dos Povos Originários e o oferecimento do Brasil para sediar a COP 30, numa cidade amazônica, completam o quadro de um profundo e positivo reposicionamento do Brasil na questão ambiental e na ordem global. 

Os exemplos heroicos de Dom Phillips e Bruno Pereira, bem como de tantos outros, cruelmente imolados no altar da ganância predatória e criminosa, não serão esquecidos. Seu sacrifício não será em vão.

Entretanto, Lula salientou o imperativo moral de honrar os compromissos financeiros de assumidos em Copenhagen, quando os países mais ricos e desenvolvido prometeram disponibilizar 100 bilhões de dólares por ano, a partir de 2020, para ajudar os países menos desenvolvidos ou em desenvolvimento a enfrentarem as mudanças climáticas. Um compromisso que, como tantos outros, ainda não saiu do papel. 

É preciso considerar que os países que mais estão sofrendo com as mudanças climáticas são aqueles situados na zona tropical, em sua maioria países pobres e de nível insuficiente de desenvolvimento. Contudo, esses países não têm nenhuma responsabilidade histórica pelas grandes emissões de gases do efeito-estufa. 

Segundo a Oxfam, o 1 por cento mais rico do planeta, que corresponde a uma população menor que a da Alemanha, deverá emitir 70 toneladas de gás carbônico per capita por ano. Já os 50 por cento mais pobres do mundo deverão emitir, em média, somente uma tonelada per capita ao ano. É uma desigualdade brutal.

Portanto, como bem destacou Lula em seu pronunciamento, “a luta pela preservação do meio ambiente é indissociável da luta contra a pobreza e por um mundo menos desigual e mais justo”. Esse é o recado fundamental para o planeta.

A correção dessa grande “injustiça ambiental” demanda não apenas essa ajuda financeira específica, mas também o correto equacionamento da questão das perdas e danos que as populações mais pobres estão sofrendo com as mudanças climáticas.

Lula será um cobrador incansável dessa dívida ambiental. 

O presidente eleito do Brasil tem toda autoridade para fazer honrar esses compromissos. 

Nos governos do PT, o Brasil conseguiu reduzir o desmatamento na Amazônia Legal em 83%. Ao mesmo tempo, conseguiu eliminar a fome, retirar 37 milhões de pessoas da miséria, gerar 22 milhões de empregos e crescer a taxas expressivas. Em suma, os pretéritos governos do PT demonstraram que a preservação ambiental é inteiramente compatível com o desenvolvimento e com a redução das desigualdades.

Infelizmente, esses governos foram substituídos pela profunda tragédia do governo Bolsonaro. 

Tudo o que foi realizado de positivo foi destruído por um governo que não tinha compromisso com o bem mais precioso: a Vida. A vida dos seres humanos e todas as outras formas de vida do planeta.

Perdemos prestígio e imagem. Nos tornamos vilão ambiental e pária internacional.  Acima de tudo, perdemos vidas. Vidas e tempo para agir.

Por isso, agora trata-se de fazer mais e melhor. Bem mais e bem melhor. E fazer rápido.

O planeta tem pressa. Corremos o sério risco de não conseguir manter o aquecimento global em, no máximo, 1,5 grau Celsius acima das médias do período pré-industrial até o fim do século, o que  poderá inviabilizar a própria  sobrevivência da raça humana. 

Felizmente, Lula chamou para si a grande responsabilidade de contribuir para articular países em desenvolvimento e desenvolvidos, ricos e pobres, em prol desse grande e fundamental objetivo. 

Lula ressurgiu para o mundo.

O Brasil voltou!

 

*Marcelo Zero

É sociólogo, especialista em Relações Internacionais e assessor da liderança do PT no Senado