PODER


Ao término das eleições de 2018, alardeou-se a “renovação” do Congresso Nacional. Na Câmara, 243 deputados foram eleitos pela primeira vez, o correspondente a 47,3% do quórum total da Casa. No Senado, a mudança foi mais incisiva. No total, das 54 vagas em disputa, 46 foram ocupadas por novos nomes — 85% das cadeiras disponíveis.

A “renovação”, no entanto, limitou-se a rostos diferentes. Na prática, caras novas acabaram se rendendo ao modelo da chamada “velha política”. Segundo a análise de especialistas, enquanto os recém-eleitos perderam força, os caciques e o Centrão continuam dominando o Parlamento. A metamorfose realizada dentro do Congresso sequer diminuiu a influência de políticos que nem lá estão, como Valdemar Costa Neto, presidente do PL, ou ACM Neto, líder do DEM.

A chegada de novos rostos ao Parlamento foi motivada, em parte, pelo discurso anticorrupção, fortalecido pela Operação Lava-Jato, que teve o então candidato à presidência Jair Bolsonaro como um dos principais entusiastas. Em 2018, mesmo tendo sido deputado federal por quase três décadas, ele levantou a bandeira da “nova política” para pôr fim às “velhas práticas” da política nacional, do “toma lá, dá cá”. Diversos candidatos surfaram na onda bolsonarista para serem eleitos à Câmara ou ao Senado. Até mesmo candidatos a governador pegaram carona no discurso para conseguirem vitória nas urnas, como Carlos Moisés (SC), Wilson Witzel (RJ) e Romeu Zema (MG). O próprio PSL, partido pelo qual Bolsonaro concorreu ao pleito, passou de uma sigla pequena à maior bancada da Câmara, com 54 deputados.

Com as derrapadas do governo, porém, boa parte dos apoiadores virou oposição. A condução da pandemia, a crise econômica e o descumprimento da promessa de melhorar mecanismos de combate à corrupção fizeram Bolsonaro perder aliados.

Entre os que viraram a casaca estão, por exemplo, os deputados federais Alexandre Frota e Joice Hasselmann. Eleitos em São Paulo pelo PSL, migraram para o PSDB e marcam discurso contra o governo. A parlamentar, que chegou a se dizer “Bolsonaro de saias”, já se envolveu em uma série de polêmicas com a família do presidente.

O partido com um sinônimo de renovação em seu nome também elegeu políticos na onda bolsonarista, como o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, mas agora mudaram de lado. Alguns líderes da legenda, como João Amoedo, é um dos apoiadores do impeachment de Bolsonaro. A oposição ao presidente da República, entretanto, está longe de unanimidade na legenda, que foi perdendo filiados à medida que as rusgas com o chefe do Executivo se acentuaram. Diante da evasão, Amoedo chegou a declarar que integrantes da sigla, alinhados a Bolsonaro, deveriam “procurar outra legenda”.

Por outro lado, debutantes com maior destaque no Congresso Nacional atuam na oposição ao governo, como explica Valdir Pucci, professor e mestre em ciência política. “Os políticos que se destacaram foi muito mais por ‘caráter pessoal’, por sua forma de atuar, seja se envolvendo em grandes polêmicas, seja se colocando de forma contundente contra o bolsonarismo. Nós temos um destaque muito mais pessoal do que um bloco que tenha atuado em conjunto nesses três anos para dar força à renovação política”, afirma.

Os deputados Kim Kataguiri (DEM-SP) e Tábata Amaral (PSB-SP) são alguns desses destaques. O integrante do MBL chegou a apoiar Bolsonaro no segundo turno em 2018, mas o afrouxamento de medidas anticorrupção e a má gestão no combate à pandemia fizeram o parlamentar, por exemplo, tornar-se uma voz de oposição na Câmara ao presidente da República.

Quem manteve o discurso alinhado ao do chefe do Executivo ganhou destaque no bolsonarismo, casos das deputadas Carla Zambelli (PSL-SP) e Bia Kicis (PSL-DF). A defesa incansável de pautas, como voto impresso, liberação de armas e ataques a adversários políticos nas redes sociais deixam as duas com boas possibilidades de angariar novamente votos de eleitores do presidente.

“A renovação não trouxe o resultado esperado pela população para que melhorassem as condições, mas foi justamente um país que estagnou. Você não viu os novos trazendo novidades e, também, não viu melhorias no país. Acho que, em 2022, vamos ter uma renovação muito menor do que tivemos em 2018”, ressalta Pucci.
Apelo para frear PEC

O procurador da República Deltan Dallagnol, que foi coordenador da extinta Operação Lava-Jato, se uniu aos colegas de classe contra a PEC que tenta mudar a composição e as atribuições do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). Ele disse que a proposta em tramitação na Câmara “amarra o combate à corrupção”.

“Promotores e procuradores estarão debaixo de um risco constante de retaliação e demissão quando incomodarem as pessoas poderosas”, afirma, em vídeo publicado nas redes sociais.

Dallagnol pediu aos seguidores que votem contra a proposta, na enquete aberta no site da Câmara e se posicionem nas redes sociais. “Se você é indignado com a corrupção, não deixe para amanhã, pode ser tarde”, prega.

Ele lembra que o texto passou na frente de dois projetos que, na avaliação da categoria, poderiam reforçar os mecanismos de combate ao crime de colarinho-branco: a PEC que acaba com o foro privilegiado e a que autoriza a prisão em segunda instância.

Outro ponto questionado por Dallagnol é o que dá ao colegiado o poder de rever atos de promotores e procuradores, inclusive para anular denúncias, pedidos de prisão e condenações. “Tornando-se uma quinta instância de revisão em um sistema de Justiça que é o único do mundo a já ter quatro instâncias e infinitos recursos”, critica.