Encerradas as eleições municipais — exceção feita ao Amapá — com o segundo turno em 18 capitais neste domingo (29/11), uma nova configuração de forças políticas indica as perspectivas para a disputa presidencial e nos estados em 2022. O MDB foi o partido que conquistou mais capitais: 5, seguido de PSDB e DEM (4 cada), PDT, PSB, PP e PSD (2 cada) e Podemos, Psol, Republicanos e Avante (1 cada). O ranking em Minas também é liderado pelo MDB (100 municípios), seguido por PSDB (90), DEM (85), PSD (75) e Avante (52).


Com as vitórias em Contagem e Juiz de Fora, o PT ficou com 28 prefeituras no estado e é o grande derrotado nestas eleições municipais. Pela primeira vez, desde 1988, não vai administrar a cidade mais importante de um estado. Em 2016, havia conseguido Rio Branco (AC). O declínio é comprovado mais ainda quando se compara com o pleito de 2004, quando fez nove prefeitos. O Novo, sigla do governador de Minas Gerais, Romeu Zema, também sai enfraquecido e sem capitais. Venceu apenas em Joinville (SC).

Quem também não viu a vitória dos seus candidatos foi o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), principalmente nos dois maiores colégios eleitorais do país. São Paulo, o maior deles, não conseguiu emplacar Celso Russomanno (Republicanos) no segundo turno — terminou em quarto. 
Bruno Covas (PSDB), correligionário de seu principal adversário político atualmente, o governador paulista João Doria, conquistou novo mandato.

No Rio de Janeiro, o candidato do presidente, Marcelo Crivella (Republicanos) também afundou ao perder para Eduardo Paes (Democratas) com margem expressiva: 64,07% a 35,93%.

O presidente conseguiu vitórias em duas cidades de médio porte. Apoiados diretamente por ele, Capitão Nelson (Avante) e Roberto Naves (PP) venceram, respectivamente, em São Gonçalo (RJ) e Anápolis (GO).

Na avaliação do cientista político Carlos Ranulfo, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Bolsonaro sai da eleição com “menor” cacife político. Mesmo assim, segundo ele, é difícil cravar os impactos das derrotas acumuladas neste ano na próxima corrida presidencial.

“Bolsonaro perdeu, mas não foi o grande derrotado. Afinal de contas, são eleições municipais. A eleição de 2022 é outro jogo. Não tem muito a ver com o que está acontecendo agora”, diz.

Ranulfo vê conexões entre os apoios dados por Bolsonaro e o pleito presidencial. “Bolsonaro cultiva uma base própria, que envolve os evangélicos e os mais conservadores. Por isso, apoiou Russomanno e Crivella. Ele cultiva essa base por achar que ela vai dar suporte na eleição de 2022. Bolsonaro não está pensando em governar, mas apenas na eleição”, sustenta.
 
A cientista política Camila Rocha, pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap) e estudiosa do bolsonarismo, tem opinião parecida. “Existe uma certa pressa de comentaristas e analistas para falar que Bolsonaro saiu derrotado. É muito cedo para falar algo desse tipo. O bolsonarismo está experimentando um momento bastante crítico”, afirma.

Ela acredita que o desempenho ruim de Crivella no segundo turno não provoca efeitos negativos de grandes proporções à imagem do presidente. “Bolsonaro está sem partido. Nos apoios que deu a vários candidatos, como Crivella, pareciam que estava sendo coagido a apoiar. Boa parte deles não eram orgânicos. Ele não fez muito esforço”, explica.  

O futuro de Kalil


Reeleito em BH no primeiro turno, com 63,36% dos votos válidos,o prefeito de BH, Alexandre Kalil, pode chegar a 2022, como nome relevante para a disputa nacional, segundo Camila Rocha. “Vamos ter que ver o desempenho de Kalil no segundo mandato. Em dois anos, tudo pode acontecer”, avalia. “Há flutuações da opinião pública e as demandas do eleitorado. O PSD está em uma posição que pode mudar de orientação sem sofrer desgastes”, defende.

Carlos Ranulfo, entretanto, não vislumbra o prefeito belo-horizontino com pretensões de ter papel ativo na corrida rumo ao Palácio do Planalto. Ele ressalta, inclusive, que há chances de Bolsonaro e PSD costurarem acordo — visto que a sigla compõe o Centrão, bloco de congressistas que dá sustentação ao governo no Legislativo nacional.

“Não é do estilo do Kalil, que não é um político tradicional. Dificilmente, ele vai ter um papel na eleição de 2022. Acho que, se o partido dele apoiar Bolsonaro, ficará quieto. Kalil fez o contrário do que Bolsonaro falou para ser feito na pandemia — e isso ficou muito claro”. Em entrevista após sua reeleição, Kalil deixou em aberto seu futuro político, inclusive sobre possível candidatura ao governo de Minas.

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Na busca de presidenciáveis por apoio, Alexandre Kalil pode ter papel importante em 2022.

(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

 

'Racha' nas esquerdas 

Outro embate que deve deixar marcas profundas, na avaliação de Carlos Ranulfo, é o protagonizado por João Campos (PSB) e Marília Arraes (PT), no Recife. Na disputa, vencida pelo pessebista, eles lutaram pelo espólio político de Eduardo Campos e Miguel Arraes, respectivamente. O cientista político lembra que o PT é parte da base aliada ao governo pernambucano, administrado pelo PSB. 


“A relação entre PT e PSB já não está boa e vai piorar depois da campanha no Recife. João Campos atacou fortemente o PT, como se fosse um cara de direita. O PT participa do governo de Pernambuco. É uma contradição atacar quem está no seu governo. Não sei se esses dois partidos conseguem se articular para 2022”, opina.

Em 2018, a candidatura de Marília ao Executivo estadual foi vetada pelo diretório nacional petista. O objetivo era costurar acordo com o PSB: o apoio a Paulo Câmara foi “trocado” pela neutralidade da sigla na eleição nacional.

Camila Rocha, no entanto, projeta a superação do entrevero. Ela aposta que alianças como as formadas em torno de Guilherme Boulos (Psol) e Manuela D’Ávila (PCdoB) no segundo turno devem prevalecer. “Sempre há um desgaste, mas pensando nos combinados de sucesso que ocorreram, acho que, provavelmente, as lideranças partidárias vão tender a apostar em uma união. O eleitorado é muito mais receptivo a isso”.

Mesmo com a derrota em São Paulo, os dois cientistas políticos concordam que Guilherme Boulos sai fortalecido. Apesar disso, Carlos Ranulfo acredita que o Psol não será o partido protagonista das esquerdas em 2022. “Boulos é a principal liderança ascendente da esquerda, mas o Psol é um partido pequeno, não tem tempo de televisão e não tem expressão nacional. O Psol tem força em alguns estados, mas só. PT e PDT são partidos organizados nacionalmente. Tem muita conversa pela frente”, projeta.

A união em torno de Boulos no segundo turno contou com PT, PDT, PCB, Unidade Popular e PCdoB. Na avaliação de Camila Rocha, essas composições enriquecem o campo progressista na disputa pela Presidência. “Compor esse tipo de frente, se isso permanecer em 2022, com certeza fortalece a esquerda — e não apenas ela, pensando em uma frente antibolsonarista”.

Prefeituras por partido — a partir de 2021
 MDB (5) – Porto Alegre, Goiânia, Teresina, Cuiabá e Boa Vista
Democratas (4) – Rio de Janeiro, Salvador, Curitiba e Florianópolis
PSDB (4) – São Paulo, Natal, Porto Velho e Palmas
PDT (2) – Fortaleza e Aracaj
PSB (2) – Recife e Maceió
PSD (2) – Belo Horizonte e Campo Grande
Avante (1) – Manaus
Podemos (1) – São Luís
PP (1) – Rio Branco e João Pessoa
Psol (1) – Belém
Republicanos (1) - Vitória