REDES SOCIAIS

O Facebook descumpriu a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou o bloqueio internacional de contas ligadas a investigados no inquérito aberto para apurar fake news e ataques contra a Corte. Em nota, a rede social afirmou que vai recorrer. Horas após o comunicado da empresa, o magistrado ampliou o valor da multa fixada em caso de descumprimento: passou de R$ 240 mil por dia para R$ 1,2 milhão. Ele também mandou intimar o presidente do Facebook no Brasil, identificado no documento como Conrado Leister.

Tanto Twitter quanto Facebook já tinham bloqueado, no Brasil, as contas dos investigados. No entanto, os suspeitos mudaram a descrição do país em que estavam para burlar a suspensão e voltar com a atividade dos perfis. Moraes, então, expediu nova determinação para que a ordem anterior dele fosse cumprida integralmente, ou seja, que o acesso fosse impedido globalmente. De acordo com o magistrado, o bloqueio apenas parcial caracteriza descumprimento. O Twitter acatou, mas vai recorrer da decisão. Já o Facebook resolveu ignorar. Os gestores da empresa, com sede nos Estados Unidos, avaliam que a determinação do ministro ultrapassa os poderes do Supremo, por atingir outros países, e invade a legislação internacional. No posicionamento divulgado ontem, eles afirmaram respeitar a legislação das nações onde atuam, mas alegou que “a lei brasileira reconhece limites à sua jurisdição e a legitimidade de outras jurisdições”.

 
De acordo com informações obtidas pela reportagem, no caso do Facebook, mesmo que os investigados alterem a localização, ou seja, mudem em seus perfis e páginas a descrição do país em que estão, o acesso continua suspenso em todo o território nacional. Isso ocorre devido ao fato de a identificação do Facebook ser feita por endereço de IP, não por geolocalização, como o Twitter. Caso, porém, o usuário faça uso de uma VPN (Rede Virtual Privada), acessará as contas e páginas suspensas. Esse tipo de recurso pode ser usado por meio de aplicativos e navegadores de internet especiais.

 
Entre os alvos da investigação no inquérito das fake news, que tiveram os perfis suspensos, estão o blogueiro Allan dos Santos, o ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), o empresário Luciano Hang e a extremista Sara Giromini.


Controvérsia


A determinação para que seja realizado o bloqueio em nível internacional levanta polêmica. Especialistas avaliam que Alexandre de Moraes ultrapassou seu campo de atuação. A advogada Nayara Oliveira Cléver, especialista em direito digital e proteção de dados, afirmou que o bloqueio em outras nações é de competência do Judiciário de cada país. “Trata-se de uma questão de jurisdição. O Facebook cumpriu com a decisão no que tange à suspensão do acesso aos perfis a partir do Brasil, contudo, o bloqueio da visualização das páginas e perfis está restrita a IPs brasileiros, sendo inviável, no aspecto legal, que o Facebook faça o bloqueio em nível global, pois poderia infringir legislações e direitos estrangeiros e, consequentemente, sua jurisdição”, argumentou.

Karlos Gomes, especialista em processo civil, disse que a determinação não surte efeito, e a empresa não deve ser multada ou sofrer sanções, “uma vez que uma decisão de tribunal brasileiro, para ter eficácia em território estrangeiro, deve ser homologada nos termos legais estipulados pelo país destinatário da decisão”. “O descumprimento da ordem em relação ao bloqueio de contas no exterior não gera, a meu ver, nenhuma sanção às empresas, pois as mesmas cumpriram a decisão de bloquear as contas hospedadas no Brasil”, destacou.

“Desproporcional”


O Twitter explicou que bloqueou as contas para atender à ordem judicial. “Embora não caiba ao Twitter defender a legalidade do conteúdo postado ou a conduta das pessoas impactadas pela referida ordem, a empresa considera a determinação desproporcional sob a ótica do regime de liberdade de expressão vigente no Brasil e, por isso, vai recorrer da decisão de bloqueio, disse, em nota na quinta-feira.

Discursos de ódio


O bloqueio temporário foi determinado por Alexandre de Moraes sob a justificativa de “interromper discursos criminosos de ódio”. A decisão ocorreu em maio, quando apoiadores do governo se tornaram alvo de buscas em operação da Polícia Federal. As plataformas, no entanto, demoraram dois meses para cumprir a ordem. E só o fizeram por meio de intimação, no último dia 24, após reportagem do Correio mostrar que os perfis seguiam no ar. A determinação, porém, acabou sendo acatada apenas parcialmente: os bloqueios ficaram restritos ao território nacional, o que levou o ministro a cobrar novamente providências das empresas.