(FOLHAPRESS) - O prefeito paulistano Ricardo Nunes (MDB), que articula apoios para tentar se reeleger em 2024, enfrenta críticas de alas do PSDB pelo distanciamento do estilo de Bruno Covas (PSDB) e acenos ao bolsonarismo.

Nunes assumiu após Covas, eleito como cabeça da chapa, morrer de câncer em 2021. O partido do ex-prefeito se divide entre embarcar na candidatura de Nunes desde já ou considerar alternativas.

Parte do incômodo se deve aos acenos de Nunes ao grupo bolsonarista, o que contraria a postura de Covas, que sempre se opôs ao autoritarismo do ex-presidente e tinha uma posição mais progressista.

Neste momento, Nunes tenta amarrar o apoio do PL de Jair Bolsonaro à sua reeleição, mas o partido considera lançar o bolsonarista Ricardo Salles (PL).

No ano passado, o prefeito declarou apoio a Tarcísio de Freitas (Republicanos) sem explicitar o mesmo em relação a Bolsonaro, mas se opôs à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no segundo turno.

Além de ter perdido espaço político, o entorno de Covas hoje crítico a Nunes considera que o sucessor demonstra baixo comprometimento com bandeiras do tucano, como o respeito incondicional à democracia, e que segue em direção diferente da do ex-prefeito.

Nunes tem feito trocas que alimentam as desconfianças de mudança de caminho. Duda Lima, marqueteiro que fez a campanha de TV de Bolsonaro em 2022, deverá comandar a campanha do prefeito no lugar de Felipe Soutello, que fez a campanha de Covas.

O bolsonarista José Trabulho, homem de confiança do ex-ministro Ciro Nogueira (PP-PI), foi nomeado para trabalhar como chefe de gabinete da Secretaria de Comunicação da prefeitura.

Da turma fiel a Covas, ainda permanecem na prefeitura Fernando Padula (Educação), Ricardo Torres (Fazenda) e Gustavo Garcia Pires (SPTuris), entre outros, ainda que tenha havido mudanças de postos.

Outros, como Orlando Faria (ex-secretário da Habitação) e Alê Youssef (ex-secretário da Cultura), deixaram seus cargos, assim como diversos subprefeitos e chefes de empresas públicas.

Para Faria, Nunes vem se afastando da linha adotada por Covas, tanto pela mudança de nomes quanto de programa -recentemente, foi feita uma mudança no plano de metas, em que, por exemplo, promessas de implantar corredores e terminais de ônibus foram substituídas para apenas "viabilizar".

"Eu acho que ele saiu um pouco da linha que o Bruno vinha colocando, um pouco mais progressista do ponto de vista ideológico", diz Faria, que era amigo de Covas e hoje faz parte do grupo aliado a Eduardo Leite, presidente nacional do PSDB.

O emedebista é descrito por covistas como alguém sem visão de longo prazo para a cidade, pouco aberto a incorporar pautas progressistas por receio de desagradar ao eleitorado conservador e com menos capacidade de diálogo com forças de oposição.

Entre os pontos que incomodam o grupo estão a política para a população de rua e a dispersão violenta de usuários de drogas pelo centro de São Paulo.

No Twitter, Alê Youssef fez crítica contundente a Nunes. "A crise do centro de SP é humanitária, pois seres humanos não são tratados com dignidade; de segurança pública, pois existe ocupação territorial pelo crime; e estrutural, pois seus espaços públicos e privados estão detonados, sem manutenção. Não existe gestão. Não existe projeto", escreveu.

Por outro lado, Nunes mantém o apoio do diretório municipal do PSDB e da bancada de vereadores tucana, que ocupa a secretaria de Assistência e Desenvolvimento Social com a indicação de Carlos Bezerra Júnior para o posto.

"Hoje nosso compromisso é com Ricardo Nunes, porque ele é o grande bastião do legado de Bruno Covas", afirma o presidente do PSDB na capital paulista, Fernando Alfredo. "E todo apoio a uma candidatura de centro é bem-vindo", completa.

Os aliados tucanos do prefeito minimizam as críticas a Nunes, afirmando que elas se restringem àqueles que perderam seus cargos. Na visão desse grupo, Nunes tem preservado os compromissos firmados com Covas, manteve os espaços do PSDB na administração e não promoveu viradas ideológicas.

Auxiliares de Nunes dizem ainda que a relação do mandatário com o grupo de secretários ligado à Covas é boa, mas ponderam que o prefeito sente sua autonomia tolhida por ter sido eleito na condição de vice -ou seja, não está à frente de um projeto que seja seu.

A possibilidade de apoio do PSDB a Nunes passa, no entanto, pela discussão do candidato a vice-prefeito na chapa -posição que os tucanos querem ocupar argumentando que o gesto demonstraria respeito e gratidão a Covas.

Os tucanos levam em conta ainda, ao defenderem o alinhamento ao prefeito, a falta de opções entre seus quadros para a candidatura própria. Consideram também que, com Salles de um lado e Guilherme Boulos (PSOL) de outro, a candidatura de Nunes deve representar o campo de centro.

O ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB) esteve com Nunes e lhe sinalizou apoio, apesar de ser aventado como um possível candidato tucano à prefeitura. Parte do tucanato nem avalia essa hipótese, por considerar que a saída de Rodrigo do partido é questão de tempo.

Questionado pela reportagem sobre o apoio à reeleição de Nunes, o presidente do PSDB paulista, Marco Vinholi, afirmou que a questão ainda será discutida internamente, inclusive dentro da federação com o Cidadania.

"Minha posição é de que vamos, de maneira coerente com nossa história e com o campo político que atuamos, construir nosso caminho através da democracia partidária, no sentido de fortalecer o centro democrático brasileiro."

Já a abordagem do diretório nacional, chefiado por Leite, é a de aguardar -sobretudo porque haverá eleições para os comandos do partido em nível municipal e estadual até o fim do ano e, portanto, a discussão sobre a eleição de 2024 pode ser feita com outra cúpula.

O PSDB definiu que, em cidades com mais de 200 mil habitantes, o diretório nacional é que terá a última palavra em relação à posição do partido na eleição municipal. No caso de São Paulo, os tucanos consideram primordial que a legenda, que é oposição a Lula, ajude a evitar uma vitória de Boulos.

Políticos que acompanham as conversas dizem nos bastidores que Orlando Faria tem o aval de Leite para encontrar saídas na capital paulista que ajudem no reposicionamento de imagem do partido. E que esses caminhos dificilmente passarão por uma aliança com Nunes.

À reportagem Faria defendeu que o partido tenha candidato próprio. "O PSDB tem uma nova direção nacional que pretende apresentar para o Brasil um projeto de país. Esse projeto de país passa pelas eleições municipais e não faz sentido o PSDB não ter uma candidatura própria nas capitais, principalmente em São Paulo."

Membros da executiva nacional também afirmam que para o projeto presidencial de Leite seria interessante ter um candidato nas principais cidades, mas cada caso vai ser analisado dentro da realidade local.

A ala tucana que resiste à ideia de manter o apoio a Nunes trabalha com alternativas, como uma composição com a deputada federal Tabata Amaral (PSB).