A Agência Pública divulgou nesta sexta-feira (27) nota em que aponta uma mentira da operação Lava Jato para deixar de aterder à determinação, reiterada, do ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF). 

Para não disponibilizar à defesa do ex-presidente Lula toda a documentação referente aos acordos de leniência da Odebrecht, incluindo comunicações com autoridades dos Estados Unidos e da Suíça, procuradores da Lava Jato afirmaram que “não foi produzida nenhuma documentação relativa a comunicações com autoridades estrangeiras para tratar do acordo de leniência” da Odebrecht.

No entanto, a Pública aponta, por meio de várias reportagens publicadas no âmbito da Vaza Jato, diversos momentos em que a Lava Jato e autoridades do Departamento de Justiça Americano (DOJ) e do FBI trocaram informações e estratégias sobre o acordo da Odebrecht. 
 
"Se todo mundo sabe que a Lava Jato negociou com procuradores americanos e o FBI, por que a Força-Tarefa nega? Só há duas respostas – e ambas podem incorrer em crime, partindo de funcionários públicos. Ou os procuradores estão escondendo os registros, e descumprindo a determinação da mais alta Corte, ou eles destruíram todos os documentos relevantes de uma investigação em benefício próprio", diz a nota, assinada pela co-diretora da Pública, Natália Viana. 

Leia a nota na íntegra:

A Lava Jato mentiu para o STF – e nós podemos provar


Se o fato passou despercebido ao leitor, respire fundo. A decisão proferida na última terça-feira pelo ministro do STF Ricardo Lewandovski a respeito de um pedido da defesa de Lula à Lava Jato traz o mesmo tom de indignação que sentirá. 

“Não deixa de causar espécie (...) o ostensivo descumprimento de determinações claras e diretas emanadas da mais alta Corte de Justiça do País, por parte de autoridades que ocupam tais cargos em instâncias inferiores”. 

Por que o Ministro está tão exasperado? Porque mais uma vez a Lava Jato se recusou a entregar comunicações mantidas com autoridades americanas, embora diversos juízes tenham ordenado isso. Desta vez, ao descumprir decisão do próprio Lewandowski, os procuradores de Curitiba chegaram ao cúmulo de escrever que “não foi produzida nenhuma documentação relativa a comunicações com autoridades estrangeiras para tratar do acordo de leniência” da Odebrecht. 


Ora, nós da Agência Pública, que é parceira do site The Intercept Brasil na análise dos diálogos vazados, sabemos que houve, e muita, comunicação com os americanos. No dia 13 de outubro de 2015, por exemplo, o procurador Orlando Martello enviou um email para Patrick Stokes, então chefe da divisão que cuidava de corrupção internacional no Departamento de Justiça Americano (DOJ). Ele explicava que o STF não admitiria o interrogatório de delatores por agentes americanos em nosso território, mas sugeria caminhos para contornar isso – seja levando-os para os Estados Unidos, fazendo a entrevista online ou fazendo um “teatrinho” no qual os procuradores brasileiros poderiam abrir a sessão e depois passar para os americanos fazerem perguntas. “Eu pessoalmente não acho que esta é a melhor opção porque haverá alguns advogados, como os da Odebrecht, que vão ficar sabendo deste procedimento (advogados falam uns com os outros, especialmente neste caso!) e vão reclamar”, escreveu Martello, em inglês. 

A troca com os americanos também era discutida com frequência no chat de sugestivo nome “Chat Acordo ODE”.  Uma delas foi uma correspondência por email iniciada em 8 de setembro de 2016 pelo adido do FBI na embaixada americana David Williams ao procurador Paulo Roberto Galvão, oferecendo ajuda para quebrar a criptografia do sistema de propinas da Odebrecth, MyWebDay. “Boa tarde Paulo, e a todos. Se não me engano o assunto de baixo é o mesmo que o Carlos Bruno explicou para mim recentemente na despedida do Adido Frank Dick na embaixada do Reino Unido”, escreveu, cordial e em português, o agente americano. A discussão por email se seguiria por dias. 

Se todo mundo sabe que a Lava Jato negociou com procuradores americanos e o FBI, por que a Força-Tarefa nega? Só há duas respostas – e ambas podem incorrer em crime, partindo de funcionários públicos. Ou os procuradores estão escondendo os registros, e descumprindo a determinação da mais alta Corte, ou eles destruíram todos os documentos relevantes de uma investigação em benefício próprio.  

Lewandowski escreve, e com razão, que o ato é mais grave “porque coloca em risco as próprias bases sobre as quais se assenta o Estado Democrático de Direito”. O ministro determinou, agora, que a Corregedoria-Geral do MPF verifique se de fato não existem documentos sobre as comunicações, o que pode demonstrar, para os advogados de Lula, que a colaboração foi “informal”, e portanto, ilegal.

Natalia Viana, codiretora da Agência Pública