Dori Caymmi, Edu Lobo e Marcos Valle se unem em disco em que se debruçam sobre o repertório uns dos outros
Nos idos da década de 60, a música imperava nas resenhas dos amigos Marcos Valle, Dori Caymmi e Edu Lobo, todos eles cariocas e nascidos em 1943. Na prática, a união desses cantores e compositores prometia ser muito mais do que um passatempo.
Enquanto o primeiro embalava um ritmo no piano, os outros dois construíam suas melodias por meio de violões. Pronto! Estava formado um trio que tinha tudo para voar alto. Só que o time foi desfeito, sem nem ao menos gravar um disco. Cada um seguiu seu caminho, embora ainda colaborassem com projetos uns dos outros. Foram precisos cerca de 55 anos para nascer um registro com a assinatura dos três. Só que, ao mesmo tempo, o disco “Edu Dori & Marcos”, um trabalho de releituras de suas respectivas carreiras lançado recentemente, não soa como um trabalho em equipe.
“Somos três velhos bem complicados”, brinca Caymmi. “Estamos chegando aos 75 anos. Então, para chegar a um consenso, optamos por três compartimentos diferentes. Resolvemos que cada um daria sua própria versão da música dos outros. Então gravei e interpretei duas canções do Edu e duas do Marcos; o Edu gravou duas minhas e duas do Marcos; e o Marcos, duas do Edu e duas minhas”, relata.
Não houve pitaco nas escolhas das faixas. “Cada um escolheu as que bem entendesse. Eles tinham que se acostumar com o modo como enxergo a música deles, e eu tinha que me acostumar com a forma como eles veem a minha. A intenção do disco era essa, deixar que as pessoas tivessem total liberdade. É bacana ouvir o Edu e o Marcos cantarem coisas minhas”, diz Caymmi.
Porém, mesmo que os três sejam “bem complicados”, ainda há esperança de que um disco em conjunto venha ao mundo. “Acho que sim. Tenho fé de que ainda possa acontecer”, enfatiza Caymmi, que projeta também apresentações ao vivo de promoção do trabalho atual.
“É difícil botar todos esses músicos (presentes no disco) no palco. Mas vamos ver o que podemos fazer. São pessoas muito queridas, amigos muito antigos, que prezo muito e que tiveram a liberdade de fazer o que queriam. É uma turma que está aí, muito ligada um no outro, e chegando na quarta idade (risos)”, completa.
E, se tudo der certo, Belo Horizonte estará na rota do trio. “Tenho uma parte no meu coração em Minas Gerais. Minha mãe era mineira (de Pequeri, Zona da Mata), estudei em Cataguases... Fatalmente estaremos em algum lugar aí. Acho que vale a pena fazer algo num teatro como o Palácio das Artes”, diz o filho de Dorival e Stella Maris e irmão de Nana e Danilo.
Álbum que reúne trio já nasce histórico
Nenhuma das 12 faixas presentes em “Edu, Dori & Marcos” trazem os três juntos. Mas isso não é capaz de manchar uma obra que já nasce histórica. Primeiro, por ser uma espécie de legado de um trio, que, separado, marcou a “segunda geração (ou “dentição”) da bossa nova”, a partir dos anos 60. Segundo, pelo respeito mútuo de cada um deles pela obra do outro. E ainda pela qualidade sonora e pelas surpresas. As interpretações de Dori “Bloco do Eu Sozinho”, de Valle, e de Edu para “Velho Piano”, de Dori, vão deleitar os fãs. E mesmo quem ainda não conheça absolutamente nada da trajetória deles, conferir Valle dando voz a “Canto Triste”, de Edu Lobo e Vinicius de Moraes, sexta faixa do álbum, pode ser o primeiro passo para eliminar esse “sacrilégio”. Que venham os shows ao vivo desse trio de ouro.