Grupo traz inéditas, mas também algumas releituras

São 41 anos de carreira, 13 discos e a sonoridade continua única e inconfundível. “As pessoas ouvem e reconhecem de imediato. E é difícil você construir e manter isso. Dá trabalho. É muito ensaio, dedicação. É como se fosse uma marca”, comenta o músico Lourenço Baeta, integrante de um dos grupos vocais mais talentosos do país, o Boca Livre. Em atividade desde 1978 e após um hiato de seis anos, o quarteto acaba de lançar um disco de forma independente, Viola de bem querer (escrito assim mesmo, em forma que contraria a reforma ortográfica). 

A turnê do projeto começou no último fim de semana, no Rio de Janeiro, cidade base dos artistas. Além de Lourenço (voz, violão e flauta), o quarteto é formado por David Tygel (voz e viola de 10), Maurício Maestro (voz e baixo) e Zé Renato (voz e violão). Apesar da origem carioca – o único que não é nascido na Cidade Maravilhosa é o capixaba Zé Renato –, muita gente identifica a banda com Minas Gerais. “Até a gente acha que é mineiro”, brinca Lourenço, que tem familiares no estado, como a avó, de Santa Luzia.

Ele credita essa ligação forte ao fato de terem sempre gravado ao longo da carreira muitos compositores daqui. Milton Nascimento, Tavinho Moura, Fernando Brant, Toninho Horta – aliás, a primeira gravação de Diana (parceria de Brant com Toninho) é do grupo. “E nesse disco também não poderiam faltar os mineiros, por isso gravamos Amor de índio (do montes-clarense Beto Guedes e do niteroiense com alma mineira Ronaldo Bastos). São artistas que fazem parte da nossa formação”, pontua.

A faixa é uma das nove do álbum, que traz outras releituras de clássicos como Um violeiro toca (Almir Sater e Renato Teixeira) e Vida da minha vida (Moacyr Luz e Sereno). Mas a maior é de canções inéditas, como Um paraíso sem lugar (Geraldo Azevedo e Fausto Nilo), e a que dá nome ao projeto, Viola de bem querer, composta por Breno Ruiz e Paulo Cesar Pinheiro. A composição traz belos versos, como “Na viola eu carrego o mar/Do meu bem querer/Na viola eu engano a dor/Pra ninguém sofrer”. “O Zé Renato nos mostrou essa música e de cara gostamos muito. Ela traz uma sonoridade que nos acompanha desde o início. Essa coisa das vozes, dos violões e, principalmente, da viola que é um instrumento que sempre esteve presente na nossa obra”, analisa.

Há também composições autorais, a exemplo da que abre o disco, Santa Marina – criada a quatro mãos pelo próprio Lourenço Baeta e Cacaso –, Noite (Zé Renato e Joyce), Eternidade (Maurício Maestro) e O paciente (David Tygel) que, mesmo sem letra, consegue ser um dos destaques do disco, ao trazer um casamento perfeito entre os arranjos vocais e instrumentais. Lourenço diz que esse intervalo sem lançamentos – o último foi Amizade (2013) – era necessário, e que nesse período os músicos se dedicaram a outros projetos, mas também ao próprio Boca Livre. “Não paramos com o grupo. Tem gente que acha que só porque não está na grande mídia é porque acabou, ou está sem fazer nada. O Boca Livre é igual Grapette: existe, mas é difícil de achar”, diverte-se, lembrando marca tradicional de refrigerante que foi sensação nos anos 1960 e 1970.