O vazio deixado pelo desaparecimento repentino da mãe – a idosa Maria das Graças Maciel, 64, que não é vista desde que saiu de casa, no bairro Santa Terezinha, na região da Pampulha, na capital, em fevereiro deste ano – adoeceu a professora Jacqueline das Graças Maciel, 44. A busca por pistas, a peregrinação por 30 hospitais e ao menos quatro visitas ao Instituto Médico-Legal (IML) esgotaram as forças da educadora, que precisou se afastar do trabalho e hoje vive à base de calmantes. “A falta de pistas só causa aflição”, diz, em tom de desespero.
O drama de Jacqueline é semelhante ao de milhares de famílias em todos os cantos do país. Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública revelam que, só no ano passado, foram registrados 82.092 desaparecimentos no território nacional. Em Minas, somente entre os meses de janeiro e julho deste ano, foram ao menos 5.001, o que dá uma média de quase um desaparecimento por hora, conforme dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp). Só na capital, a Polícia Civil já investigou, neste ano, 537 sumiços.
Na comparação com o mesmo período de 2018, o número de desaparecidos em Minas sofreu leve queda, de 2,8%. A sutil redução de casos, no entanto, não causa qualquer impacto na dor de quem sofre com a ausência de um ente querido. Entre os relatos de quem procura por alguém, uma das angústias em comum é a falta de retorno das autoridades depois que o boletim de ocorrência é registrado. Por isso, muitos assumem para si a missão de investigar.
Entre trotes e pistas que não levaram a lugar algum, Jacqueline percorreu várias cidades, visitou lugares em que a mãe foi supostamente vista e enfrentou o drama de reconhecer corpos no IML, com medo de que um deles fosse o de Maria das Graças. Ao mesmo tempo, para a professora, a falta de vestígios pode ser tão dolorida quanto a confirmação da morte. “A incerteza é pior”, considera.
A Polícia Civil informou que as investigações sobre o desaparecimento da idosa estão avançadas. Segundo a corporação, informações que ajudem a identificar o paradeiro dela podem ser dadas por meio do telefone 0800 282 8197.
No município de Naque, no Vale do Aço, outra família aguarda informações sobre o paradeiro de uma parente, a aposentada Nelsina Gregório da Silva, 82, que sofre de Alzheimer. No dia 2 de fevereiro deste ano, o filho e a nora da idosa foram até a casa dela, cuidaram da alimentação e a colocaram para dormir ao lado do marido, que tem a mesma doença. Na manhã do dia seguinte, a família foi surpreendida pela notícia do desaparecimento.
“Como os dois têm Alzheimer, a família está sempre por perto. Eles têm uma cuidadora durante o dia, mas à noite não aceitavam que ninguém dormisse com eles. Como eles insistiam, nós respeitamos”, contou a técnica de enfermagem Beatriz Gonçalves Salomão, 38, nora de Nelsina.
Com o desaparecimento da idosa, a família tenta consolar o marido dela, que tem vivido triste com a ausência da companheira de quase 30 anos. “A gente fica de pés e mãos atados. Queremos saber onde ela está, mas não nos dão uma pista”, desabafa. Em nota, a Polícia Civil informou que um inquérito foi instaurado e que os investigadores estão empenhados em dar uma resposta à família.
“Desafio é achar as pessoas com vida”
Embora Minas registre uma média de quase um desaparecimento por hora em todo o Estado, Belo Horizonte é a única cidade mineira que conta com uma unidade da Polícia Civil especializada em solucionar esse tipo de caso. Chefe da Divisão de Referência da Pessoa Desaparecida, a delegada Maria Alice Faria explica que os investigadores enfrentam uma corrida contra o tempo para localizar quem some. “Nosso desafio diário é localizar as pessoas com vida, com a integridade física e mental preservada”, afirma a delegada.
Maria Alice explica que outra dificuldade é lidar com a subnotificação de pessoas localizadas. “Cerca de 95% das pessoas que têm o desaparecimento registrado em boletim de ocorrência voltam para casa ou são encontradas, mas a família não notifica as autoridades. Por isso, o número de registros não necessariamente representa a quantidade de pessoas ainda desaparecidas”, esclarece.
Segundo a Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública (Sejusp), a maioria dos desaparecidos tem entre 0 e 18 anos e é do gênero masculino. Em muitos casos, adolescentes desaparecem por vontade própria, “em razão da rebeldia inerente à própria idade”. No caso dos idosos, segundo ela, muitas vezes o sumiço tem origem em doenças psiquiátricas. A delegada alerta que as famílias devem procurar a polícia assim que notarem uma quebra na rotina de um parente ou amigo.
Localizados
Diferença. Nos sete primeiros meses de 2019, enquanto 5.001 pessoas sumiram, 3.505 foram encontradas em Minas. Já na capital, foram 537 desaparecimentos e 514 casos solucionados.