Uma empresa de saúde de Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), está no centro da fraude bilionária que levou à prisão do empresário Daniel Vorcaro, dono do Banco Master. Segundo relatório da Polícia Federal (PF) a que O Fator teve acesso, a Clínica Mais Médicos emitiu R$ 361 milhões em notas comerciais entre 2021 e abril de 2025 para inflar artificialmente o patrimônio do banco.​

O único comprador das notas foi um fundo de investimento cujo único cotista é o próprio Banco Master. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) constatou que a clínica emitia valores “significativamente superiores à sua própria receita bruta”.​

A empresa tem sede no bairro Eldorado, em Contagem e é presidida por Valdenice Pantaleo de Souza, que o Ministério Público Federal (MPF) suspeita atuar como “laranja” de Vorcaro. Valdenice também comanda o Hospital São José, que emitiu R$ 213,9 milhões em notas seguindo o mesmo padrão.​

“Esse conjunto de elementos, segundo o MPF, reforça a suspeita de que Valdenice teria sido utilizada pelo esquema para artificialmente inflar o patrimônio do Banco Master. Nesse sentido, é possível extrair do caso em exame que determinados emissores, supostamente, vinham emitindo notas comerciais em valores significativamente superiores à sua própria receita bruta, prática que pode mascarar a real condição econômico-financeira da instituição. Assim, essa distorção contábil compromete a adequada precificação dos títulos emitidos, podendo induzir investidores em erro quanto ao risco efetivo dessas operações”, diz trecho da decisão do juiz Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara Federal de Brasília.

A CVM abriu processo administrativo contra a empresa de saúde e apresentou representação criminal ao MPF em junho.​

Vorcaro foi preso pela Polícia Federal quando tentava deixar o Brasil na noite de segunda-feira (17), pelo Aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. A investigação aponta o empresário como “principal beneficiário” de um esquema que movimentou R$ 16,7 bilhões entre julho de 2024 e outubro de 2025.​

Diretor criou associações falsas

Também preso na operação, o diretor do Banco Master Augusto Ferreira Lima teria, segundo a PF, criado duas associações de servidores do Estado da Bahia que foram usadas para simular a origem de R$ 6,7 bilhões em créditos consignados.​

A Asteba (Associação dos Servidores e Empregados Públicos do Estado da Bahia) e a Asseba (Associação dos Servidores Estaduais da Bahia) não tinham movimentação financeira compatível com os valores declarados.​

A Secretaria de Administração da Bahia confirmou que os descontos nos contracheques eram apenas de mensalidades de baixo valor, incompatíveis com R$ 6,7 bilhões em empréstimos.​

Rombo de R$ 12 bilhões

O Banco Master enfrentava um rombo de R$ 12,2 bilhões. Para cobrir o déficit, o grupo criou a empresa Tirreno para simular créditos consignados inexistentes. Esses créditos fictícios foram revendidos ao Banco de Brasília (BRB), que pagou R$ 12 bilhões pela carteira.​

O Banco Central identificou fluxo financeiro atípico de R$ 12,2 bilhões nos primeiros meses de 2025.​

A Justiça Federal determinou o bloqueio de R$ 12,2 bilhões em bens, quebra de sigilo bancário e fiscal dos investigados, e apreensão dos passaportes de Vorcaro e Lima.​

Os dois respondem por gestão fraudulenta de instituição financeira, prestação de informações falsas ao Banco Central, emissão de documentos falsos e organização criminosa.​

Histórico de fraudes

A CVM mantém processos administrativos contra empresas de Vorcaro desde 2020, envolvendo fundos imobiliários como Brazil Reality, a empresa Centara e o Fundo Imobiliário São Domingos.​

A investigação começou em 2024, quando o Banco Central identificou irregularidades e comunicou o MPF. Segundo Andrei Rodrigues, diretor-geral da Polícia Federal, a fraude chegou a R$ 12 bilhões.

Vorcaro construiu imagem de outsider do mercado financeiro. Instalou o Master na Faria Lima, em São Paulo, e investiu em marketing, incluindo campanhas com a atriz Ísis Valverde em 2021.

A defesa informou que ele está disposto a “cooperar com as autoridades”.

O processo tramita sob segredo de justiça na 10ª Vara Federal Criminal do Distrito Federal.