PANDEMIA


Com a pandemia, o movimento do setor aéreo caiu 90%. Com a disparada do dólar, as despesas subiram 50%. Com tanta turbulência, a estabilidade dos empregos foi sacudida. Depois de três meses de acordos com suspensão temporária de contratos e licenças não remuneradas, as companhias aéreas não conseguiram mais evitar as demissões. Só na manhã desta quinta-feira (2), a Azul desligou pelo menos 50 pessoas no Aeroporto Internacional de Belo Horizonte, conhecido como Confins.


A empresa não confirmou o número de cortes, mas, segundo funcionários ouvidos pela reportagem, o total se aproxima de cem e incluem diversos setores como check-in, administrativo, mecânicos, manutenção e limpeza. Em grupos que variavam de dez a 15 pessoas, os funcionários entravam em uma sala no segundo andar do aeroporto, onde eram comunicados. De lá, saíam direto para o exame médico demissional, no andar debaixo. As reportagem acompanhou a movimentação das 7h às 11h30. 

As reuniões aconteciam de hora em hora, para evitar aglomerações. Já o choro, não foi possível evitar, nem abraços entre os colegas que se consolavam nos corredores do aeroporto. “Nessa hora a gente até esquece o protocolo e abraça. A gente sabia que isso poderia acontecer, pois o movimento caiu demais. Mesmo assim, a gente tinha alguma esperança. É tudo muito triste”, conta uma funcionária que trabalhou no check-in durante sete anos e pediu para não ser identificada.

Entre lágrimas, outra funcionária desligada nesta quinta-feira disse que, apesar da situação complicada das companhias, ainda tinha expectativa. “Fiquei com o contrato suspenso, por meio da Medida Provisória, durante dois meses. Voltei a trabalhar no dia 1º de julho e me chamaram para um reunião no dia 2. Achei que teria estabilidade de dois meses, mas, quando me ligaram, eu já imaginei que seria demitida”, conta ela, que também pediu para não ser identifica.

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Em pequenos grupos, funcionários recebiam a notícia da demissão e já desciam para fazer o exame demissional em Confins

/Foto: Cristiane Mattos - O TEMPO

 

Ela, que há um ano trabalhava como auxiliar administrativo na Azul, disse que, por mais que todos esperassem ajustes, ainda havia esperança de que um acordo fosse proposto. “No início, a empresa chegou a propor uma licença não remunerada, sem salário, mas com vínculo e benefícios. Eu pensei que eles iriam estender o prazo para adesão a essa proposta, mas não foi possível”, relata.

De acordo com o diretor do Sindicato dos Aeroviários de Minas Gerais, Valter Aguiar, apesar de MP do governo garantir estabilidade, não obriga a empresa a ficar com o funcionário. “A obrigação é de pagar o equivalente a dois meses. E parece que é o que a Azul decidiu fazer”, explica.

Aguiar estima que, juntas, Latam e a Azul devam demitir até 40% dos funcionários. Em meados de junho, as duas empresas anunciaram um acordo de codeshare, para compartilhar a malha aérea como estratégia de enfrentar a queda da demanda durante a pandemia. Segundo fontes do setor, é natural que, com a junção, a quantidade de passageiros em terra seja reduzida.

“No início, além da suspensão de contrato pela MP, as empresas fizeram acordos como licença não remunerada, que suspendia o salário, mas mantinha o vínculo. Nós acreditávamos que essa era uma boa solução, considerando que tudo isso vai passar”, comenta Aguiar. Segundo ele, para as empresas que prestam serviços às áreas, a previsão de cortes é ainda pior. “Estimamos queda de 40% nos empregos das companhias, e de 50% nas prestadoras”, lamenta Aguiar.

A Azul foi procurada e, assim que enviar as justificativas das demissões, a matéria será atualizada. A reportagem também aguarda reposta da Latam.

Na Gol, a situação é diferente. A companhia, que está operando com apenas 30% da capacidade (250 voos diários), ainda não fez demissões. Com corte de gastos, a empresa fechou um acordo para manter empregos e preservar o caixa pelos próximos 18 meses. A medida abrange 926 comandantes, 964 copilotos e 3.262 comissários de bordo.

Retomada vai demorar

De janeiro a maio, a demanda caiu 90,97% par voos domésticos e 96,8% para os voos internacionais, segundo último balanço consolidado da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear). “Agora, Para se ter uma ideia, antes da pandemia, em dezembro, por exemplo, a média de voos diários era de 2.700. Em abril, nosso pior momento, chegou a cair para 163”, afirma o presidente da Abear, Eduardo Sanovicz.

Depois de operar com menos de 10% da capacidade em abril, a situação melhorou um pouco, mas ainda está longe da recuperação. “Em julho, estamos na casa dos 30%. Acredito que a retomada será lenta e, neste ano, devemos chegar a 60% nos voos domésticos. Para o mercado internacional, existem estudos que indicam que essa recuperação possa demorar três anos”, explica Sanovicz.

O presidente da Abear ressalta que essa recuperação depende de fatores externos. “O turismo de negócios, depende da atividade econômica se aquecer, para que aconteçam eventos. O turismo de lazer depende da segurança do consumidor em relação ao trabalho e à saúde. Nesse momento, a única coisa que podemos fazer e estamos fazendo, é intensificar as medidas para aumentar a segurança dos passageiros”, destaca Sanovicz.

Movimento em Confins cai 90%

Só no aeroporto de Confins, o movimento de passageiros foi reduzido a menos de 5%, em abril, quando a circulação de pessoas por dia caiu de 30 mil para 1.000, e o número médio de voos diários caiu de 300 para 15.

 Por meio de nota, a BH Airport, que afirma que o setor ganhou fôlego. “Foram cerca de 885 voos domésticos, um aumento de 57% em relação a maio. Com esse resultado, o aeroporto voltou a ter 10% das operações que tinha no período anterior à chegada da Covid-19. A movimentação de passageiros pelo terminal alcançou cerca de 65 mil pessoas em junho”, ressalta a concessionária que administra o aeroporto.

 A BH Airport ainda não demitiu e tem recorrido a medidas disponibilizadas pela legislação, como redução de jornada, redução de salário e suspensão de contratos. A confirmou um acordo com o Sindicato Nacional dos Empregados de Empresas Administradoras de Aeroportos (Sina) com o objetivo de manter os empregos de minimizar impactos nos salários dos colaboradores.  No dia 1º de junho, a BH Airport adotou a suspensão temporária de contrato por dois meses, para 60 colaboradores que recebem salário até R$ 3.000.