GRATUIDADE

Com o objetivo de convencer o prefeito Álvaro Damião (União Brasil), a classe artística está defendendo o Projeto de Lei que visa garantir a gratuidade no transporte público de Belo Horizonte, que pode se tornar a primeira capital do Brasil a ter tarifa zero nos ônibus. Por meio do mote "BH quer busão 0800", a mobilização ganhou notoriedade durante o Festival Sensacional, que ocorreu na sexta-feira (27 de junho) e no sábado (28) e contou com a presença de grandes nomes da música como Caetano Veloso, Zeca Pagodinho, Iza, BaianaSystem e Marina Sena. 

A proposta, que tramita na Câmara Municipal de Belo Horizonte, já possui o apoio de 22 entre 41 vereadores. Durante o festival, um bandeirão com o tema da campanha foi exibido pelo público e vídeos de artistas pedindo a gratuidade do transporte na capital mineira foram reproduzidos, como o da vocalista da banda Pato Fu, Fernanda Takai.

Ela afirmou que a tarifa zero para os ônibus de Belo Horizonte deveria ser vista, além de um direito, como um gerador de mais atividades no consumo, na cultura e nos acessos da cidade. "Busão 0800 combina com Belo Horizonte, combina com os moradores, com os turistas, com o jeito de fazermos todos se sentirem parte de uma metrópole que quer ser frequentada por todos. Já imaginou a gente poder andar pela cidade para trabalhar, estudar e se divertir sem pagar a tarifa nos ônibus? ”, afirmou Takai. 

Na semana passada, outros eventos culturais em BH levaram para os palcos a demanda popular por um sistema de transporte gratuito na cidade, como a Batalha de Rap 'Faroeste', que acontece às quartas-feiras na região do Barreiro e o 'Arraiá do Lá da Favelinha', no Aglomerado da Serra.

Especialista destaca apoio dos artistas e aponta benefícios para a economia de BH

O urbanista Roberto Andrés, professor da UFMG e estudioso das políticas de gratuidade no transporte coletivo, destacou a mobilização da classe artística no apoio à tarifa zero e apontou benefícios para a população . "Os artistas tem uma percepção do que a cidade precisa, tendo uma visão de futuro. A população pode chegar com mais facilidade às regiões onde tem shows e eventos culturais. Em questão de mobilidade, ficaria mais fácil para as pessoas se deslocarem. O público até se entusiasmou quando reproduziram os vídeos durante o festival", enfatizou Andrés.

O especialista também ressaltou que BH pode obter ganhos econômicos com a adesão ao projeto de gratuidade. “Experiências em outras cidades brasileiras mostram que há ganhos com o aumento da mobilidade, aquecimento do comércio e crescimento na arrecadação de tributos. Com a tarifa zero, as pessoas podem utilizar o transporte público, fator que reduziria o tráfego de carros e desafogaria o trânsito”, destacou.

Entraves e benefícios: como os parlamentares enxergam a tarifa zero em BH

O entrave principal sobre a gratuidade no transporte público de Belo Horizonte está relacionado à definição de quem será o responsável por bancar o funcionamento do sistema. O custo anual do transporte por ônibus na capital mineira é de R$ 1,8 bilhão, segundo dados da administração municipal.

Desse total, a prefeitura arca com cerca de R$ 700 milhões, distribuídos em forma de subsídio às concessionárias. O restante é pago com o recolhimento de passagens, estabelecidas em R$ 5,75 nas linhas convencionais. Apenas alguns perfis de usuários, como idosos e estudantes, não pagam passagem. Críticos do modelo atual, porém, apontam que o valor cobrado não corresponde à qualidade do serviço. 

“O transporte coletivo em BH está em colapso. Não podemos continuar gastando tanto recurso público e, ao mesmo tempo, exigir que a população pague caro por um serviço precário”, afirma a vereadora Iza Lourença (PSOL), coautora do texto que propõe a gratuidade.

Para viabilizar a proposta, os autores sugerem a criação da Taxa de Transporte Público (TTP), a ser paga por empresas instaladas em BH que tenham mais de dez funcionários. A ideia é que a contribuição custeie o sistema, em substituição ao gasto com o vale-transporte.

“Os proprietários de pequenos negócios podem ficar tranquilos, pois quem tem menos de dez funcionários irá economizar, uma vez que não haverá a necessidade de pagar vale-transporte com um sistema de transporte gratuito. Com uma sugestão de valor de TTP referente a R$ 168,82 por empregado, quem tem mais de dez funcionários pagará apenas R$ 5,63 por dia, que é menor que o gasto com vale", argumentam os parlamentares na justificativa do projeto. 

Contudo, pareceres dos vereadores Fernanda Pereira Altoé (Novo) e Lucas Ganem (Podemos), relatores do projeto na comissão de Legislação e Justiça e na de Mobilidade Urbana, respectivamente, consideraram a taxa ilegal. Diante disso, um substitutivo foi elaborado, transferindo a responsabilidade integral de financiamento à prefeitura. Apesar da avaliação, a vereadora Iza acredita que será possível avançar com a proposta. “Nossa expectativa é construir um substitutivo de consenso, inclusive com participação da prefeitura”, diz a parlamentar. 

Prefeitura alega falta de recursos

Se por um lado os relatores do projeto que cria a tarifa zero propõem que a gratuidade seja integralmente custeada pela prefeitura, por outro a administração municipal avalia que não há espaço fiscal para implantar o benefício a todos os usuários neste momento.

O temor, segundo Gustavo Fonseca, diretor de Planejamento e Economia dos Transportes da prefeitura, é que a tarifa zero estimule o aumento da demanda e eleve ainda mais o custo do sistema, exigindo um acréscimo de até R$ 1,2 bilhão ao Orçamento. “Não sabemos o impacto real, pois mais viagens demandariam mais motoristas e veículos. Mas, hoje, não há margem para ampliar o investimento”, diz.

O valor adicional estimado por Fonseca representaria 5,9% das receitas previstas para BH em 2026 – montante equivalente a todo o Orçamento para ações de urbanismo no município. A cifra só é superada pelos recursos reservados para saúde (R$ 7,4 bilhões) e educação (R$ 3,9 bilhões).

O que prevê o PL do 'busão 0800'?

O projeto propõe a instituição da Tarifa Zero no transporte público de Belo Horizonte, com um novo modelo de financiamento baseado em:

Taxa paga apenas por empresas com mais de nove funcionários;
Receitas de publicidade no transporte público;
Multas aplicadas às concessionárias;

Subsídio municipal para garantir a qualidade e expansão do serviço.